Por: Flávia G. Pinho (Folhapress)

Os bastidores de um mimo saboroso

Lula e Macron exibem a cesta com as amostras de queijos premium brasileiros e outras delícias | Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República

Foi uma correria. Na quarta-feira pela manhã, um funcionário do Ministério das Relações Exteriores telefonou esbaforido para a queijista Rosanna Tarcitano, que mora em Brasília. A pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ele precisava organizar uma cesta de produtos brasileiros, com destaque para queijos nacionais, para que fossem dados de presente ao presidente francês, Emmanuel Macron. O problema era o prazo: o regalo deveria ser entregue na manhã seguinte.

Com uma década de experiência no ramo e uma das fundadoras da Associação de Queijistas do Brasil, a ComerQueijo, Tarcitano não se apertou. Acionou uma colega do Distrito Federal, Sandra Moser, e pediu socorro. "Como ela vende queijos em feiras, costuma ter algum estoque", conta.

A produção do presente ainda passou por uma negociação digna de diplomatas. A expectativa do Itamaraty era juntar apenas queijos mineiros na caixa, mas Tarcitano foi contra. "Sugeri uma diversidade maior de sabores, porque várias regiões do Brasil têm queijos maravilhosos e premiados", diz. O argumento colou.

Da lista inicial, com dez queijos, já ficaram de fora os produtos que demandavam refrigeração - era impossível saber como o presente chegaria às mãos de Macron, e se o presidente francês provaria os queijos aqui mesmo, em solo brasileiro, ou se os levaria para casa.

Outra demanda do Itamaraty ajudou a reduzir a lista: que os queijos tivessem conquistado medalhas no Le Mondial du Fromage et des Produits Laitiers, uma das mais importantes competições internacionais, realizada na França.

A ideia era que o presente funcionasse como uma divertida provocação a Macron.

Daqueles dez queijos da primeira seleção, quatro se enquadravam. Mas Tarcitano apelou para a diplomacia mais uma vez e convenceu o funcionário do ministério a incluir outros dois produtos que, na sua opinião, retratavam melhor a diversidade queijeira do país. Bingo de novo.

"Às 14 horas, a lista já estava fechada e aprovada e começamos a formar o presente. Como alguns queijos são enormes, optamos por entregar frações embaladas. Às 17h, o presente estava pronto, para ser entregue na manhã seguinte", lembra a queijista.

A caixa de papelão dada a Macron, com serragem no fundo, não continha apenas queijos. Entraram no kit um pacote de café e o espumante 130 Brut Blanc de Blanc, produzido com uvas Chardonnay de safras especiais pela gaúcha Casa Valduga.

Na véspera do feriado de Sexta-Feira Santa, a foto dos dois presidentes, sorridentes com o presente nas mãos, circulou rapidamente nas redes sociais e portais de notícias.

Se o gesto vai se refletir em aumento de vendas, é cedo para saber. Mas o queijeiro Bento Mineiro, produtor paulista do queijo Pardinho, está otimista. "Não há dúvida da relevância do gesto. Esse trabalho de relações públicas pode, sim, ter efeito comercial."

Proprietário da loja Galeria do Queijo, na zona sul de São Paulo, o comerciante Falco Bonfadini não chegou a notar um aumento imediato na procura pelos queijos do presidente. Mas se incomodou com o debate político que tomou conta de seu perfil do Instagram.

"Fiz um post para celebrar a visibilidade dos queijos nacionais, nada a ver com política, mas começaram a brigar no meu post", lamenta.

Todos os queijos que Macron ganhou de presente estão à venda em lojas especializadas e podem ser adquiridos diretamente dos produtores.

 

As delícias dadas ao líder francês

CUESTA - Uma das mais premiadas queijarias paulistas, a Pardinho Artesanal elabora o Cuesta em antigos tachos de cobre, usando leite cru de vacas criadas a pasto na Fazenda Sant'Anna, em Pardinho (SP). Ao longo de oito meses de maturação em caves subterrâneas, a casca incorpora fungos que conferem coloração acinzentada e notas amendoadas. Onde encontrar - Galeria do Queijo (wwww.galeriadoqueijo.com.br)

GOA MODERADO - Em Aiuruoca (MG), o médico Guilherme Maciel produz o Mantiqueira de Minas com leite cru do próprio rebanho. A massa é semicozida e passa por salmoura, processo similar ao do parmesão italiano. O rótulo Moderado cura por 120 dias. Visitantes podem conhecer a Fazenda da Lage, acompanhar a produção e participar de degustações. Onde encontrar: Instagram @ourodasgerais.

LUA CHEIA - Airton Gianesi, proprietário do laticínio Serra das Antas, de Bueno Brandão (MG), se inspirou no Camembert para elaborar a receita à base de leite cru de vaca e creme de leite, mas adiciona carvão vegetal à casca. O queijo matura três semanas em câmara fria. Onde encontrar: www.serradasantas.com.br.

MARANATA BRONZE - O casal Henrique e Paula Laim, de Virgínia (MG), produz o queijo Mantiqueira de Minas à base de leite cru de vaca, de rebanho próprio - o Bronze matura por 100 dias. O Rancho Maranata recebe visitas e organiza programas de vivências, com hospedagem. Onde encontrar: www.ranchomaranata.com.br.

QUEIJO DO MARAJÓ FAZENDA SÃO VICTOR - Em Salvaterra, Arquipélago do Marajó (PA), Cecilia e Marcus Pinheiro produzem o queijo creme tradicional da ilha, à base de leite cru e creme de leite de búfala, saber que herdaram de seus antepassados. Cremoso, de sabor amanteigado, esses queijos obtiveram o reconhecimento da Indicação Geográfica (IG) em 2021. Onde encontrar: www.oqueijolatra.com.br.

SERJÃO CANASTRA 20 DIAS - Em Piumhi (MG), no coração da Serra da Canastra, Sérgio de Paula Alves produz os queijos tradicionais da região, à base de leite cru de vaca. O mofo branco da casca, que prolifera naturalmente, ao longo de 20 dias, na cave de maturação, dá identidade ao produto. Onde encontrar: www.queijodoserjao.com.br/.

 

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