O Flautista do vinhedo

Vinícola biodinâmica do Oregon (EUA) testa robô para fazer o controle de pragas em suas plantações

Por Affonso Nunes

O enólogo Mark Huff (de barba), da vinícola Stag Hallow, no Oregon (EUA), é adepto da viticultura biodinâmica (sem uso de pesticidas para controlar pragas) e aposta no uso do Flautista, um robô que simula os sons de cigarras para espantá-las do vinhedo

Um pouco de contexto antes de mais nada: "Pied Piper of Hamelin" é o nome em inglês da fábula alemã do século 13 que nós conhecemos como 'O Flautista de Hamelin'. Para quem está desatualizado com as estórias infantis, essa é aquela na qual um flautista consegue, com sua música, livrar a cidade alemã de Hamelin de uma praga de ratos. Os animais seguem o som e saem do vilarejo.

Pied Piper é o flautista, e essa estória (escrita em versos por Robert Browning) hoje circula pelos vinhedos do estado de Oregon (EUA) no formato de um robô, pendurado sobre o parreiral, que simula os sons de insetos, afastando as pragas da plantação.

Diminuir a utilização de pesticidas é uma preocupação em qualquer cultivo e muita tecnologia (além de métodos naturais) vem sendo empregada com esse objetivo. O Pied Piper é uma combinação de ambos. Os insetos se utilizam de vibrações para se comunicar, além de sinais químicos com feronômios. Rex Cocroft, que estuda a comunicação entre os insetos na Universidade do Missouri (EUA) afirma que os insetos têm uma experiência mais forte com as vibrações do que nós temos com os sons.

Assim, o robô - batizado de Flautista - têm gravado em sua memória os sons de insetos que podem causar danos nas videiras, no caso dos primeiros testes são as cigarras, de uma espécie que pode ser portadora de um virus que causa dano à planta. Quando o robô detecta o som, ele emite uma vibração em resposta e o inseto 'acredita' que encontrou um parceiro(a) e se aproxima da máquina.

O robô então, fotografa o inseto e envia para a central da empresa que pode agir para retirar o inseto ou para emitir outro som que atrasará o ciclo reprodutivo do animal, evitando a propagação dos ovos e a fertilização.

A Stag Hollow, uma vinícola do Oregon que pratica agricultura sustentável e biodinâmica, é uma das primeiras propriedades a testar o Flautista Piper em seus vinhedos, esperando que o modelo de interrupção do acasalamento vibratório (VMD) usado no design do robô os ajude a combater as cigarras sem o uso de pesticidas ou outras medias ecologicamente prejudiciais.

Esses insetos espalham o vírus da mancha vermelha da videira, que pode prejudicar os vinhedos, reduzindo a capacidade das videiras de realizar a fotossíntese. Como explicou o professor de entomologia da OSU, Dr. Vaughn Walton, seu objetivo é encontrar uma maneira ecologicamente correta de combater as cigarras. Os pequenos insetos se comunicam e encontram parceiros por meio de vibrações. O robô foi projetado para ouvir as vibrações e, em seguida, enviar as suas próprias em troca, efetivamente atrapalhando a conversa e tornando difícil para os cigarras machos encontrarem as fêmeas.

Os entomologistas da universidade estão 'treinando' o Flautista para reconhecer as vibrações de outros insetos e reagir a eles. O robô terá aplicações em outras culturas além da uva também.

Para Mark Huff, proprietário e enólogo de Stag Hollow, o dispositivo é uma adição interessante aos seus vinhedos, mesmo que ainda esteja em fase de teste. "Tenho trabalhado com Vaughn há vários anos nesta tecnologia e identificando problemas relacionados à doença transmitida por esses insetos", conta. "Essa tecnologia é muito promissora, apresentando ótimas soluções alternativas aos pesticidas, e é disso que se trata."

O projeto do Flautista pode ser uma das primeiras incursões no uso de dispositivos VMD para a agricultura nos Estados Unidos, mas a equipe da OSU credita sua ideia à pesquisa do Dr. Rachele Nieri e do Dr. Valerio Mazzoni, entomologistas italianos da Fundação Edmund Mach (FEM), um instituto de pesquisa vitivinícola em Trentino, Itália.

Nieri e Mazzoni lideram um estudo de cinco anos sobre VMD nos vinhedos de Edmund Mach, especialmente projetados para pesquisas em viticultura orgânica. As conclusões do estudo FEM, publicadas pela primeira vez em 2019 e atualizadas em julho de 2023 com resultados de cinco anos de observação, mostraram evidências da eficácia do VMD como um método seguro e não invasivo para reduzir a população de cigarras nas vinhas.

Antes do trabalho, os cientistas tentaram usar feromônios para confundir e atrapalhar o acasalamento. "Este estudo apresenta a primeira avaliação de longo prazo do uso de vibrações como técnica de interrupção do acasalamento em um vinhedo comercial. As descobertas contribuirão para o desenvolvimento de práticas inovadoras e sustentáveis de gestão de pragas", escreve a equipe de pesquisa em sua publicação da conferência de 2023, Vibrational Mating Disruption Against Insect Pests: Five Years of Experimentation in the Vineyard.