Inclusões e explosões de Lima Barreto

Obra do escritor é celebrada em debate no CCBB e em livro na Festa Literária das Periferias

Por Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

Autor incompreendido em seu tempo, Lima Barreto traz a linguagem das ruas para a literatura brasileira e agora, no século 21, é reconhecido com uma voz inaugural das lutas identitárias

Eternizado como voz crítica dos processos nacionais de exclusão em livros como "Triste Fim de Policarpo Quaresma" (1911), Afonso Henriques de Lima Barreto (1881-1922) volta a mobilizar debates em diferentes frentes da literatura preocupadas na construção de novos olhares. Às 17h30 desta quarta-feira, a antropóloga e historiadora Lilia Schwarcz (recém-eleita imortal da Academia Brasileiras de Letras) e a ensaísta, crítica e professora da UFRJ Beatriz Resende vão debater a obra do escritor no Clube de Leitura do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB-RJ).

No sábado, a Festa Literária das Periferias (Flup) põe à venda o livro o livro "Quilombo do Lima" (ed. Malê), uma antologia de contos produzidos por 22 expoentes da prosa, negras e negros, inspirados na obra de Lima. São novas interpretações de seus escritos.

"Lima Barreto, no seu próprio contexto, definiu a literatura que ele fazia como uma literatura militante", explica Lilia, ao Correio da Manhã.

"O sentido que ele dava a esse conceito é que era uma literatura muito vinculada ao seu momento e aos problemas do seu contexto. Lima Barreto era um homem negro que vivia no subúrbio do carioca, tomava o trem da Central do Brasil todos os dias, e é fato que a questão racial aflora como uma espécie de nervo. Um nervo tenso, forte e pulsante da obra desse escritor. Nesse sentido, a obra dele vai sendo revisitada por conta de uma modernidade revivescida. Ela vai sendo revisitada por conta de questões que são estruturais da nossa sociedade".

Nesta tarde, no CCBB, Lilia e Beatriz prometem mobilizar o CCBB com uma análise sobre o livro "Contos Completos de Lima Barreto", concentrando-se nas narrativas curtas criadas pelo autor de "Recordações do escrivão Isaías Caminha (1909) e resgatadas por meio de pesquisa em edições originais, jornais e revistas da época, e mais dezenas de inéditos, retirados de seus manuscritos.

"Nas discussões identitárias de hoje, um romance que a mim encanta enormemente, que é o 'Clara dos Anjos', vem sendo relido de maneira muito proveitosa. É um romance que bate fundo principalmente nas jovens mulheres negras, que passaram a dar à leitura do Lima um novo viés", explica Beatriz Resende. "Só neste século estamos em condição de entender tudo o que era importante em Lima Barreto, uma voz inaugural que só agora é devidamente compreendida e encontra a repercussão devida. Há novas edições críticas de sua obra e, felizmente, novos leitores".

O colóquio de Lilia e Beatriz, mediado pela poeta, professora e produtora Suzana Vargas, promete um balanço do olhar moderno trazido por Lima para a prosa nacional. "Na biografia, que eu escrevi sobre ele ("Lima Barreto - Triste isionário") e nos textos que venho escrevendo, defendo a ideia de que é preciso pensar em modernismos no plural, em outros modernismos, e que Lima era muito moderno. Na linguagem das ruas que utilizava, nos temas que abordava, da maneira como abordava, na inclusão dos diálogos".