CRÍTICA - LIVROS: Em agosto, nós lemos

Por Olga de Mello | Especial para o Correio da Manhã

García Márquez, o pai do realismo fantástico, se exerce prosa mais contemporânea em 'Em agosto nos vemos'

Ao ler o último parágrafo de "Em agosto nos vemos" (Record, R$ 59,90), a novela publicada no último mês de março, dez anos após a morte de Gabriel García Márquez, a sensação é de que algo ficou faltando na história. O livro fecha a trilogia sobre o amor, que inclui os romances "Do amor e outros demônios", de 1994 e "Memória de minhas putas tristes", de 2004. Cada volume dessa trilogia teria um intervalo de dez anos entre seus lançamentos.

Segundo os filhos de Garcia Márquez, ele havia decidido não mexer mais no texto de "Em agosto" e desistido de publicá-lo, deixando, no entanto, seus originais intactos, o que não aconteceu com outras narrativas, destruídas depois de rejeitadas pelo autor. A família decidiu lançar a versão encontrada do livro, que se difere de boa parte de sua obra ficcional pela ambientação contemporânea e por ter uma mulher como protagonista. Ela é Ana Magdalena Bach, casada com um maestro - uma referência clara à segunda mulher do compositor Johann Sebastian Bach -, mãe de um casal de filhos, que todos os anos viaja, em agosto, até uma ilha para visitar o túmulo da mãe.

Leitora voraz, abandonou os estudos de literatura para se casar quase adolescente e virgem. Aos 46 anos, ela deixa a leitura de "Drácula" para ter sua primeira aventura sexual com um desconhecido, durante a viagem à ilha. O envolvimento sem consequências se torna parte dessa viagem solitária de poucos dias à ilha, transformada de lugarejo de pescadores em complexo hoteleiro para deleite dos turistas que descansam da agitação da metrópole.

Para Ana Magdalena, as conversas ao pé do túmulo da mãe já não são mais o motivo das incursões à ilha, mas sim a conquista dos desconhecidos, que também estão no local de passagem e a tomam por prostituta ou mulher amargurada com uma vida sem graça. É na ilha que ela troca o escapismo literário pela aventura vivida e reflete sobre seu casamento, as escapadelas confessadas do marido, com quem sempre manteve uma relação de cumplicidade divertida.

A sensação de que o livro não estava concluído é clara. Os personagens secundários são citados, mas não desenvolvidos, alguns com uma riqueza interior e comicidade claras, como a filha de Ana Magdalena, uma jovem dedicada a namoros intensos, que pretende entrar para um convento de freiras reclusas. Inacabado ou desprezado, "Em agosto nos vemos" é uma oportunidade para voltar a Gabo, um grande contador de histórias, que melhor soube explorar o misticismo latino-americano com um olhar jornalístico e cinematográfico, faz da leitura bem mais do que divertimento.

Um olhar sobre Paris

E como este agosto tem Jogos Olímpicos em Paris, vale a pena conhecer a experiência de viver na Cidade-Luz durante três meses, sonho acalentado por tantos escritores há um século. Em 2013, a jornalista Tania Carvalho resolveu comemorar seus 60 anos tornando-se moradora da cidade e mantendo um blog, relatando sua rotina e as descobertas.

De volta ao Brasil, reuniu reúne crônicas escolhidas sobre seu cotidiano parisiense em "100 dias em Paris" (Imã Editorial, R$ 48,90), trazendo dicas essenciais para uma sobrevivência longa fora de Pindorama, como onde encontrar um bom cabeleireiro.