Por: Affonso Nunes

A vontade de fazer sentir o personagem que somos nós

Em 'A Lira do Povo', Ayrton Montarroyos reúne canções emblemáticas de todas as identidades brasileiras em três suítes num espetáculo que chega agora como disco | Foto: Divulgação

Um dos intérpretes mais talentosos da nova geração, o pernambucano Ayrton Montarroyos apresenta seu novo álbum, o ousado "A Lira do Povo", no qual explora a cultura do homem brasileiro, sua relação com o sertão, a cidade e o mar. O folclore, a oralidade e as histórias de pescador são elementos importantes deste trabalho que reafirma o talento deste cantor de 28 anos que esbanja maturidada a cada canção.

Divido em três suítes - Mítica, Lírica e Épica -, "A Lira do Povo" agrupa 19 canções que tratam exatamente dessa amplitude brasileira desejada pelo artista. "A Lira nasce da vontade de fazer sentir o personagem que somos nós, utilizando dos recursos estéticos que dispomos: som, luz, o teatro, cheiros e sentidos. Sendo a canção popular brasileira, de João Pernambuco a Kiko Dinucci, o principal material utilizado. Não poderia ser outra música, de outro país ou povo, pois queremos evocar uma história de um homem brasileiro, que pode acidentalmente ser real, mas que por nós, artistas, foi inventado. Inventado como qualquer folclore, qualquer mito", destaca Ayrton.

E que era pra ser uma apresentação de músicas interioranas, criou asas e transformou-se num apanhado de signos, numa festa, numa dança do povo, num suspiro, num grito também. "Foi sabendo dessas coisas que o meu amigo Hermínio Bello de Carvalho, compositor dos grandes, batizou essa apresentação e tudo o que nasce dela, com título semelhante a um que já havia usado em seus trabalhos, que são sempre grandes estudos sobre o Brasil. O que me fez gostar ainda mais do título", acrescenta.

A ideia de viver uma história no disco através do trígono sertão - mar - cidade era uma ideia frequente do cantor. "Uma frase de João Cabral de Mello Neto me atiçou lá atrás: 'ambidestro do seco e do úmido, como em geral os recifenses'. Essa imagem do povo que teve que sair do sertão para viver no litoral, fundando uma capital que tem tamanho de metrópole e jeito de interior me tomou desde então. Nos meus escritos, há quase cinco anos, venho, sem saber, elaborando as direções e caminhos para a condução deste projeto, elegendo canções e parceiros possíveis de dividir esse sonho", conta.

Ayrton Montarroyos começou cedo, aos 11 anos, cantando em saraus e rodas de choro em Recife. Aos 18, fez suas primeiras gravações em importantes discos de música brasileira. Um deles, inclusive, indicado ao Grammy Latino em 2013. Aos 20 anos, tornou-se vice-campeão do The Voice Brasil, da TV Globo, interpretando canções elementares da música brasileira, como "Carinhoso" (Pixinguinha/João de Barro). E aos 22, lançou o seu primeiro álbum "Ayrton Montarroyos" (2017 - Independente), um trabalho bem recebido pela crítica.

Em 2019, Ayrton lançou pela gravadora Kuarup, o seu segundo álbum: "Um Mergulho no Nada", que ao contrário do seu disco de estreia, dispunha, para além da voz, de um único instrumento. Edmilson Capelupi, violonista brasileiro conhecido por ter acompanhado Dominguinhos, Rolando Boldrin, Beth Carvalho, Nana Caymmi, Ademilde Fonseca e Noite Ilustrada.

Em 2020, longe dos palcos por conta da pandemia, Ayrton criou uma série de pesquisa de música brasileira, em estúdio de gravação, que era transmitida para mais de 2 mil pessoas semanalmente, ao vivo. Foram mais de 20 programas cantando e contando histórias da MPB, que depois tiveram seus áudios distribuídos pelas gravadoras Biscoito Fino e Kuarup.