Atemporalidade confirmada

Neste 10 de dezembro, aniversário de Cássia Eller, uma de suas poucas composições ganha versão collab reunindo a cantora, Chico Chico, Zélia Duncan e Juiana Linhares

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Nesta nova versão da autoral 'Eles', a voz de Cássia Eller ganha a companhia de seu filho, da amiga Zélia Duncan e da jovem Juliana Linhares

Quando um jornalista lhe perguntou se sua música falava a língua de uma geração, Cássia Eller respondeu: "Acho que sim. Mas não tenho certeza. Apesar de que as coisas precisam de um tempo longe para sabermos o que estava realmente perto da gente...". O tempo de fato passou e hoje não há dúvidas. A obra de Cássia representou não apenas os jovens de sua época, como vem se revelando nas gerações seguintes. É o que mostra a música "Eles", uma das poucas escritas pela artista em sua carreira, que acaba de ganhar uma versão especial e contemporânea produzida por Rodrigo Garcia: Uma collab entre Cássia Eller, seu filho Chico Chico, a jovem cantora Juliana Linhares e sua amiga Zélia Duncan. O single e clipe de "Eles" chegam às plataformas de streaming neste 10 de dezembro, data de aniversário da cantora, via Universal Music.

O encontro a quatro vozes em "Eles" envolve o chamado de liberdade que a letra evoca: "Os meninos e as meninas / Os meninos e os meninos / As meninas e as meninas / Eles só querem é gozar / E que os deixem a sós (...) / Eles só querem é amar / E que os deixem em paz". Mais atual, impossível.

Lançada originalmente no álbum "O Marginal", em 1992, a música foi composta em parceria com o poeta Luiz Pinheiro e Tavinho Fialho, baixista de sua banda e pai de Chico Chico. A combinação de vozes de Cássia, Chico, Zélia e Juliana evoca e libera os sentidos, a liberdade e o prazer, sem perder a ternura.

"É uma letra que tem tudo a ver com o contexto atual, do que vem sendo discutido sobre a igualdade de gêneros. E nessa música Cássia já falava disso de uma forma muito poética, muito suave, de um jeito minimalista e ao mesmo tempo forte, passando uma mensagem importantíssima", diz Rodrigo Garcia.

O músico e produtor já vinha com a ideia de gravar duetos de composições da cantora com artistas amigos, começando com a Zélia Duncan, e viu nesta oportunidade o pontapé inicial. "Ao começar a trabalhar na canção, achei interessante incluir mais vozes e logo pensei na Juliana Linhares. Acreditamos que a Cássia iria gostar do seu trabalho. E também chamei o Chico, que nunca havia gravado algo com ela, e sendo uma música do pai e da mãe, ele topou", conta Garcia. "É uma canção pouco conhecida da Cássia. Tem um sabor muito grande de ineditismo", opina ele, que mesclou a voz da gravação original com takes alternativos que não entraram no disco.

A nova versão de "Eles" direciona os holofotes para a marcante linha de baixo de Tavinho Fialho. O rock'n'roll da gravação original abre espaço para a música latina, brasileira, com muito suingue um "naipe" de percussões que traz uma sonoridade moderna e alinhada com a artista e os novos intérpretes. "Nosso desejo era fazer um arranjo percussivo com o baixo genial do Tavinho conduzindo a canção. Pra mim, ele é o grande destaque. Ao invés de usar bateria, adicionamos percussões, como o pandeiro e beats de Marcos Suzano; as congas e tambores de candombe, um ritmo do Uruguai, de Álvaro Salas; o reco-reco de Durval Pereira, o triângulo de Thays Sodré e o cowbell de Alex Merlino", explica Rodrigo Garcia.

Ele próprio gravou algumas linhas de violão e adicionou a guitarra de Walter Villaça, grande parceiro da carreira de Cássia no instrumento. "Achamos o resultado bem legal e destacamos o Tavinho como se ele fosse também um artista da faixa, uma vez que ele criou uma linha de baixo incrível e é o compositor", completa.

O clipe de "Eles" traz uma emoção à parte, com imagens da gravação em estúdio e uma apresentação da cantora ao lado de Tavinho Fialho no Circo Voador. "O que busquei capturar neste vídeo é o encontro de vozes, olhares, risadas, abraços e afetos que brotam da obra de Cássia. Fiz imagens que buscaram uma estética mais íntima e próxima, para que quem assista sinta-se também ali, naquele momento", conta o diretor Rafael Saar., que ainda incluiu na edição imagens da letra manuscrita e ilustrações de Cássia presentes no encarte do álbum "O Marginal". O título "Eles" usado no grafismo do clipe foi adaptado pelo designer Emerson Ferreira a partir da letra da cantora. "Fazer este trabalho tem uma dimensão muito profunda na celebração desta artista única e tão presente. É uma canção que ainda hoje é muito transgressora, atual e necessária", opina Rafael.

Com seu jeito irreverente e tímido ao mesmo tempo e uma presença de palco conquistadora, Cássia Eller encantou meninos e meninas. A liberdade sempre foi sua maior luta e conquista. E a nova gravação reverbera e ecoa essa mensagem. "Acho que esse negócio de geração é muito engraçado (...). Nem sempre estamos no lugar certo, com a turma certa ou num tempo que tem a ver com nossas ideias. Não creio que todo mundo seja igual ou que determinada faixa-etária pense igualzinho. Ninguém é igual a ninguém. Graças a Deus. Geração é só um momento que a gente vive", disse ela, na mesma entrevista.

Na época, Cássia não refletia sobre seu legado, mas hoje os meninos e meninas agradecem a sua escrita, coragem e ousadia. Que venham novas versões para fazer o nosso mundo mais completo.