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A vida como ela é

Surgida a partir de uma notícia de jornal, cuja manchete dizia que uma mulher do interior havia destrinchado o marido, a peça "Carne de Segunda" chega embalada por mãos femininas. O espetáculo com texto de Marina Monteiro e direção de Natasha Corbelino sobe ao palco do Teatro Ruth de Souza, sob interpretação de Tatjana Vereza.

É a história de uma moradora de uma cidade pequena que decide ser açougueira, algo incomum para mulheres. Num lugar onde todos sabem da vida de todos, não é segredo que ela vive fugindo do marido por conta da violência doméstica. Ao longo da peça, a plateia descobre a trajetória dessa açougueira, que usou seu instrumento de trabalho para destrinchar seu algoz.

"Da notícia, me chamou a atenção o fato de que todos os vizinhos relataram que o marido a perseguia em volta da casa com um machado e ninguém fazia nada, mas para condená-la estavam todos a postos. Fiquei com isso na cabeça e os elementos do texto foram chegando. Um misto de tragédia com grupo do WhatsApp, fofoca de vizinho com coro grego. Os tempos se misturando", conta Marina.

"Curioso é que não salvei a matéria e nunca mais consegui encontrá-la. Não sei mais se foi delírio, mas foi daí o início. Acho que essa questão da sutileza e delicadeza misturadas com a força vêm muito no trabalho com a linguagem, buscando uma dramaturgia que ofereça ambiguidade, abertura, espaço para a atriz, pra diretora, pro público", reforça.

Construído sob uma narrativa de muitas vozes que observam a vida da personagem, o espetáculo levanta questões necessárias, como a de atravessar um sistema que de antemão não consegue garantir para as mulheres as mesmas premissas que para os homens; como forjar novas profissões para todas; ou como furar a bolha conservadora que, geração após geração, direciona as mulheres para os mesmos futuros.

"A peça mostra uma mulher que toma as rédeas da própria vida apesar de tudo que falam sobre ela: que é bruta, violenta, safada, gorda, feia, louca... Pensa aí, quais são as maneiras de silenciar uma mulher potente? Apesar de um solo, não estou sozinha. Existem muitas e milhares de mulheres que precisam pautar as suas vidas. Espero que o público entenda que quanto mais se fala, se mostra e se atua contra a violência doméstica e de gênero, mais mulheres serão protegidas e livres para construir suas trajetórias de vida, inventar e sonhar seus próprios futuros. Trazendo essas questões para a cena contemporânea, criamos um motor potente para a desconstrução dessa estrutura machista e patriarcal que nos impõe tanta opressão e silenciamento", pondera Tatjana.

SERVIÇO

CARNE DE SEGUNDA

Teatro Ruth de Souza - Parque das Ruínas (Rua Murtinho Nobre 169 - Santa Teresa)

Até 28/8, sextas e sábados (19h) e domingos (18h)

Grátis, com senhas distribuídas 1h antes de cada sessão

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