A maioridade em cena

Depois de passar por 26 estados e oito países, 'A Descoberta das Américas' faz curta temporada no Teatro Glauce Rocha

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Júlio Adrião encena o monólogo 'A Descoberta das Américas', do italiano Dario Fo, em cartaz há 18 anos e que volta este mês a um palco carioca

Um dos maiores sucessos da primeira década do século XXI, o solo narrativo "A Descoberta das Américas" rendeu o Prêmio Shell 2005 de melhor atuação a Julio Adrião e completa, em 2023, seu décimo oitavo ano de itinerância. E, mais uma vez, o espetáculo chega ao Rio para temporada até o dia 28, às quartas e quintas, sempre às 19h, no Teatro Glauce Rocha.

Ao longo dos anos, a montagem vem traçando um caminho amplo e diverso, se levarmos em conta os variados públicos e espaços cênicos que já percorreu. Pequenas cidades do interior, grandes centros cosmopolitas, circuitos universitários e temporadas em salas de teatro, além de diversos festivais no Brasil e no exterior, possibilitaram encontros com uma grande diversidade de público.

"Quando completamos 18 anos e atingimos a maioridade, passamos a ouvir que, se por um lado já temos 18 anos, por outro só temos 18 anos. Em todo caso, os 18 anos são um marco na vida de qualquer um. Já um espetáculo teatral completar 18 anos não é algo tão esperado, muito menos planejado, pois não basta uma decisão da produção se, antes disso, o espetáculo não tiver estabelecido uma identificação com o público que, de certo modo, se apropria da obra, como que exigindo essa continuidade", afirma Julio.

O espetáculo aposta na simplicidade, mas também na sofisticação, lançando mão apenas dos recursos cênicos indispensáveis, num registro de interpretação enérgico e dinâmico que estabelece uma comunicação direta e próxima ao público. Um ator só em cena, sem cenário, com figurino e iluminação reduzidos ao mínimo, atuando num estado essencial, de emergência. O protagonista, acossado por uma cruel economia da fome que o faz engenhoso, precisa sobreviver para narrar sua história. Para dar vida a todos os personagens - indígenas, espanhóis, cavalos, galinhas, peixinhos, Jesus e Madalena - ele estabelece um pacto de cumplicidade com os espectadores. Cria com eles um código gestual, mímico e sonoro que faz com que o público saiba o que acontecerá antes mesmo do personagem narrador. Cada detalhe provoca a lembrança do seguinte, como numa história contada de improviso e pela primeira vez.

"O espetáculo perpassou estes 18 anos conjurando risadas, escutando críticas, amadurecendo, se rearranjando e traduzindo (em espanhol inglês, italiano) para novas viagens e novos tempos. Somente agora, com a maioridade, sofreu inserções textuais coerentes às premissas - onde o ator-pessoa 'encontra' a plateia e a convoca compartilhar a responsabilidade do que está sendo contado, pois a história 'aconteceu' e 'tem testemunha'", finaliza Alessandra Vannucci, diretora e cotradutora da peça de Dario Fo.

O espetáculo solo narra, com uma atuação intensa e despojada, com rude ironia, uma outra versão da nossa história, que leva o público a uma inesperada reflexão sobre o período inicial da colonização do Novo Mundo. O texto de Dario Fo, inspirado em fatos reais narrados pelo navegador e cronista espanhol Alvar Nuñes Cabeza de Vaca, revisita de maneira irônica e crítica episódios ocorridos no século XVI no território que, posteriormente, veio a ser batizado de Flórida, embora essa história pudesse ter se passado aqui mesmo, em terras brasileiras.

SERVIÇO

A DESCOBERTA DAS AMÉRICAS

Teatro Glauce Rocha (Avenida Rio Branco, 179, Centro) | Até 28/9, às quartas e quintas (19h) | Ingressos: R$ 60 e R$ 30 (meia)