Terremotos, tsunamis, mudança climática, seca, tempestades, casas que são arrastadas, que desmontam como na história dos 3 porquinhos, mortes. Uma sucessão de pavores, de se pensar a morte ali na esquina. E a ameaça da bomba? Do tal botão vermelho que algum mandatário aciona e apaga o mundo? Ou a explosão nuclear? Essa destruição do que nos cerca é apenas uma metáfora daquilo que Sartre preconizou: o inferno são os outros.
O gênero pós-apocalípticas, que mistura o que se chamava de ficção científica, com uma trama que envolve os sentimentos humanos mais forte, nos confrontam com um mundo totalmente irreconhecível. Crianças que somos, circulando em algo que não sabemos. E dessa mistura de realidade, de sentimentos, que Lucy Kirkwood compôs As crianças.
A direção Rodrigo Portella é magnífica, porque a movimentação em cena mistura o embate, as dissimulações, o jogo do conhecimento e da surpresa. A trama em torno de um casal de cientistas nucleares aposentados que vivem numa casa à beira-mar, após um desastre numa usina, que procuram preservar uma aparência de normalidade. Dayse (Analu Prestes) e Robin (Mario Borges), vivem sós. Após uma ausência de quase quarenta anos, Rose (Stela Freitas), antiga colega de profissão e amiga, chega para trazer a humanidade.
"As brincadeiras" que remontam à infância, pirulitos, ecos de ouvir rock, são traduzidos em voz, gestos, corpo, pequenas expressões pelos três atores que funcionam em uma troca, como se cada um fosse capaz de ler o que o outro vai fazer. A frase que resume tudo o que estamos vendo é você não consegue crescer, não viva. Não viver, em "As Crianças", é vermos um espetáculo no qual a direção e a interpretação nos permite perceber que, mesmo vivendo é um porão, jamais escapamos de nossa essência.
SERVIÇO
AS CRIANÇAS
Teatro Poeira (Rua São João Batista, 104, Botafogo) | Até 25/2, às terças e quartas (20h) | Ingressos: R$ 70 e R$ 35 (meia)