Na literatura, nos filmes, na TV, nas histórias em quadrinhos e nas artes cênicas estamos acostumados com relatos de heroísmo. Com as histórias de pessoas que se superam. mas que heroísmo é esse? Pertence a quem? Pessoas comuns, com que convivemos no dia-a-dia podem ter uma trajetória heróica? Prestes a completar dois anos de circulação por diversas cidades do estado do Rio, além de uma temporada de sucesso em São Paulo, o espetáculo ganhador em um dos mais importantes prêmios nacionais de teatro, o Prêmio Shell, "A Jornada de Um Herói", reestreia nesta quinta-feira (2), às 19h, no Teatro Léa Garcia.
Idealizado pela Cia Escola Fábrica de Atores, de Nova Iguaçu, a peça já ocupou diversos palcos para além da Baixa Fluminense, seja em diferentes bairros do Rio ou outras cidades, chegando até mesmo a alcançar outros estados, como São Paulo e Minas Gerais.
O diretor do espetáculo, Alexandre O. Gomes, comemora este feito. "Isso é motivo de muita satisfação porque estamos conseguindo levar a história de José para muitos lugares. Para nós, isso é símbolo de representatividade territorial, pois somos periféricos, da Baixada Fluminense, e poder ocupar esses espaços é uma forma de política afirmativa", ressalta.
Rompendo a famosa estratégia narrativa chamada "jornada do herói", majoritariamente centrada em histórias que glorificam homens brancos e ricos, "A Jornada de um Herói" traz para o centro do palco o protagonismo de um homem negro, pobre, periférico e analfabeto, chamado José, que enfrenta diversas batalhas cotidianas, refletindo a realidade de muitos brasileiros que se vêem à margem da sociedade e levantando a seguinte questão: "Quem são os verdadeiros heróis?".
Após ser demitido de uma fábrica de carvão ao questionar a diminuição do seu tempo de almoço, que passa de dez para cinco minutos, José vai atrás do seu FGTS, como única opção de sustento de sua família. Tal como os heróis de Homero, José enfrenta monstros e diversos outros perigos ressignificados nas dificuldades cotidianas de um homem negro, pobre, semianalfabeto e desempregado, marcando uma verdadeira epopéia urbana em que os percalços de um ônibus cheio, uma fila quilométrica e um gerente de banco esnobe, escancaram na resistência de José, o seu heroísmo.
Através do solo narrativo, o espetáculo convida o público a refletir sobre questões urgentes da sociedade contemporânea, como o racismo estrutural, relações de trabalho abusivas e desigualdades sociais.
"A Jornada de um Herói" já conquistou o 33° Prêmio Shell na categoria "Iluminação", ganhou o 1° festival de Saquarema, o 3° FESTFILM e o 8° festival de Passos, além de ter sido indicado na categoria jovens talentos pela APTR. "Todos esses prêmios refletem nosso trabalho árduo de pesquisa e a nossa dedicação", destaca o diretor.
Com uma linguagem popular e utilizando uma abordagem cômica, "A Jornada de Um Herói" torna o debate mais acessível, já acumulando mais de 2 mil espectadores que, sem dúvidas, ao término do espetáculo, saem com os olhos mais abertos sobre as injustiças presentes na sociedade. "Nada é tão inclusivo como uma boa comédia, porque o riso atrai as pessoas, desarma a todos e provoca a reflexão. É uma comédia política, que busca através deste gênero se comunicar com todas as classes sociais, principalmente as menos favorecidas", ressalta Alexandre O. Gomes.
A Escola Fábrica dos Atores oferece aulas de teatro para a comunidade a preços populares, sobrevivendo a partir de doações e editais, sem nenhum patrocínio. Apesar das dificuldades e limitações enfrentadas diariamente, a companhia segue firme, dedicando-se a trazer novas perspectivas aos jovens da comunidade, além de já ter formado diversos artistas que hoje colhem os bons frutos da arte. Esse também é um exemplo de heroísmo.
SERVIÇO
A JORNADA DE UM HERÓI
Teatro Léa Garcia - antigo Teatro dos Correios (Rua Visconde de Itaboraí 20, Centro)
De 2/5 a 1/6, de quinta a sábado (19h)
Ingressos: R$ 40 e R$20 (meia)