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Paulo-Roberto Andel: Jazz na beira da Baía

Saímos do trabalho às cinco da tarde, deixamos a Praça Tiradentes e fomos até o Largo da Carioca, um percurso de 400 metros. Seguimos torcendo para que os bares cheios de cerveja e gentes ocupem a veterana rua cariocas hoje abarrotada de portas fechadas. No Largo fomos direto na Banca do Vavá, o velho Olivar, livreiro politizado e consciente que há anos roda milhares de livros na porta da Estação Carioca. Livros, livros e CDs. Muitos clientes, claro, e também gente no vaivém que não está nem aí pra isso.

Eu estava com fome. Eu sempre tenho fome. Sou gordo porque não posso mais praticar os esportes que gosto, mas também porque adoro comer. Muitas vezes fiquei sem saber se conseguiria almoçar ou jantar, por isso valorizo cada prato de comida. Então fomos ao Gaúcho, esquina de São José com Rodrigo Silva, desde 1935 na labuta. Tudo lá é gostoso. Pedi o pão com linguiça e molho, legítimo cachorro quente. Antes, eu e Jocemar pedimos dois bolinhos de carne. Bar cheio, todo mundo fica em pé, cotovelos se tocam, parece outro Brasil. Um barato é que hoje há grupos de mulheres em pé no botequim, e aí percebo como o machismo prevalecia nos bares da minha juventude.

Fomos embora para o jazz, mas somente duas quadras depois Jocemar percebeu que havia esquecido o celular no balcão. Senhor! Saiu correndo, encontrou o aparelho, voltou feliz da vida e comemoramos, porque o telefone hoje é praticamente a nossa loja virtual - isso, claro, sem contar os dois barões de prejuízo caso não tivesse achado.

Um barato da Praça XV: skate. A rapaziada voando sobre as rodinhas. Sempre quis ter um quando era garoto, mas o preço era caro, então continuei pela praia jogando bola. Gosto das manobras, dos riscos, é um esporte com ousadia. E ainda tem um super skate instalado ali. Pena que o grande movimento de gente dos anos 1980 e 1990 não existe mais. A Praça ficou muito mais bonita, mas se esvaziou. Em trinta ou quarenta anos as coisas mudam muito.

Aos pés da Baía de Guanabara, acontece o Jazz nas Quartas, dois sets a partir das sete da noite. O Guga Pelliciotti, excelente baterista com larga rodagem jazzy (Pedra do Sal, Cinelândia). Conheci o Vitor pequenininho e hoje ele é um senhor guitarrista. Por fim, o baixo elegante e preciso de Fábio Brasil. Jazz de respeito, alternando standarts com temas brasileiros da bossa e da MPB, de "Feira de Mangaio" a "A night in Tunisia". Ou seja, tudo que bons ouvidos musicais precisam, com entrada franca e lanches baratos - não deixem de ir.

Quase oito da noite. Baixo, bateria e guitarra vão duelando maravilhosamente. O jazz é bom. O jazz liberta. Uma garota escuta o show e escreve num caderno - ou seria uma agenda? Um casal namora harmoniosamente enquanto espia a apresentação. Alegre, Jocemar comemorava merecidamente a salvação do celular. Não tenho nada para comemorar, mas posso dizer que tive uma noite de paz - me senti até gente, como não fazia há tempos. Venham à Praça XV ver e ouvir jazz nas quartas, a vida fica melhor.