Em 50 anos de carreira, marcados por cerca de 30 peças e umas 50 traduções para os palcos, Flávio Marinho flertou com o sucesso numerosas vezes, estabelecendo-se como grife nas artes cênicas. Seu primeiro texto original, "Splish, Splash", idealizado para Claudia Raia, em 1988, foi daqueles eventos teatrais de lotar casas de espetáculos e atrair os olhares da indústria do entretenimento. Mais tarde, ele levou a comédia de costumes às raias da excelência em "Abalou Bangu" ao mesmo tempo em que transformou os feitos de Cauby Peixoto num musical - com Diogo Vilela - que rasgou corações.
Às vésperas do lançamento de um livro no qual revisita sua relação com a imprensa, como crítico teatral e repórter de cultura, Marinho emplaca um fenômeno - que para muitos é "A" peça de 2024 até agora - apoiado no talento do titã Othon Bastos: "Não Me Entrego, Não!". Vista por cerca de 8 mil pagantes desde sua estreia, em junho, essa colcha de recordações do eterno Corisco de "Deus e o Diabo Na Terra Do Sol" (1964) passa em revista sonhos, saudades e consagrações de um mito da arte de atuar, o que vem comovendo multidões. As sessões lotam a cada apresentação no Teatro Vanucci, que estendeu a temporada até setembro. Paralelamente, sua dramaturgia corre o país com encenações de sua criação anterior, "Judy: O Arco-íris É Aqui", com Luciana Braga.
Cada uma dessas peças esbanja um domínio pleno das cartilhas do teatro ao mesmo tempo em que se besuntam nas referências cinéfilas que seu criador amealhou ao longo da vida - serão 70 anos em 2025. Fã de carteirinha de Robert Mulligan (1925-2008), com quem chorou vendo "O Sol É Para Todos", Marinho é um apaixonado por cinema que aprendeu a dominar o ofício da escrita de roteiros - com o qual brilhou por décadas a fio, na TV Globo - devorando clássicos de Hollywood e pérolas europeias, antes e depois da Nouvelle Vague. De Claude Sautet a Ettore Scola, viu de tudo nas salas de exibição de Copacabana. Mas foi nos palcos que ele mais e melhor usou as lições de dramaturgia (e de humanismo) recebidas de Éric Rohmer, Luchino Visconti, Carlos Manga (pois sempre amou chanchadas) e de Vincente Minnelli, o "culpado" por um de seus filmes favoritos: "Assim Estava Escrito" (1952).
Ecos desses clássicos e desses cults se fizeram notar nas peças que escreveu e dirigiu, como "Os 7 Brotinhos", "Perfume de Madonna" e, neste momento, a imperdível "Não Me Entrego, Não!".
Na entrevista a seguir, ele analisa o êxito que vem conquistando e fala dos novos projetos.
Já se esperava excelência de "Não Me Entrego, Não", mas foi surpresa o fenômeno que a peça se tornou. O que você mais vem aprendendo com Othon Bastos nessa caminhada, desde a estreia, apresentação após apresentação?
Flávio Marinho: Foi a maior surpresa. Acreditava no sucesso da peça. Mas não imaginava que ela viraria um fenômeno. Com o Othon, estou aprendendo, mais do que nunca, a manter o frescor do espetáculo. Como contar sempre a mesma história como se fosse a primeira vez.
Qual era a imagem que Othon Bastos tinha em seu imaginário antes da realização do espetáculo e o que ele simboliza?
Othon pensava em fazer um colcha de suas citações preferidas. Fiquei com medo que ficasse com cara de palestra e misturei flashes da vida dele às citações. Funcionou, pois me deu a dramaticidade necessária para chegar à teatralidade.
Há planos de o texto virar livro, como se deu com suas outras peças? Como fica a carreira nacional de 'Judy - O Arco-Íris É Aqui', sua peça anterior, nesse processo?
Sim. Há planos de virar livro e há também o projeto de fazer um documentário. "Judy - O Arco-íris É Aqui" andou viajando nos últimos tempos. Estamos pensando numa volta ao Rio para fechar a tampa. O público tem pedido muito.
Você tem um livro de memórias teatrais para sair do forno. Quando sai? Do que se trata essa publicação?
O livro deve sair no mês que vem e se chama "Flavio Marinho Em Letra De Imprensa". Basicamente, fala dos meus 14 anos como jornalista. Mas, além de reproduzir alguns dos meus artigos, também conta, um pouco, a história da imprensa carioca, a história do Brasil e a minha história pessoal. É muita história. É um livrão.