Por: Cláudia Chaves | Especial para o Correio da Manhã

A correta contramão

Gabriela Alkmin, Cleto Araújo (esq na frente), Marcelo Albuquerque e Luiz Buarque (de vermelho) | Foto: Gugga Almeida/Divulgação

Toda uma geração de apaixonados por teatro se formou ou começou a se formar na década de 60, com My Fair Lady e a soberba Bibi Ferreira , primeira e fascinante experiência, My Fair Lady . Depois disso vieram Música Divina Músicas,que era o título de Noviça Rebelde, Vencer na Vida sem fazer força, com Marília Pera e Hello Dolly. Com o golpe , ouve a retração do gênero, os grupos encenaram autores brasileiros e clássicos de todos os tipos.

Após o golpe houve a paralisação da importação de musicais. Chico Buarque encabeça um conjunto de peças brasileiras. A partir do final do século passado, essa força de nossa arte e cultura está presente nos belos trabalhos d' A Barca dos Corações Partidos, Gustavo Gasparani, João Fonseca, João Galvão, Flávio Marinho, Nelson Mota e Patricia Andrade. Esses artistas transformam a experiência do musical em verdadeiro teatro.

Agora, há essa pletora de musicais de entretenimento com a importação de musicais da Broadway, e nem sempre o mais relevante da meca dos teatros de todos os gêneros. Além disso, os melhores espetáculos, os mais sofisticados não conseguem ser reproduzidos. Os recursos de lá são gigantescos, há a tradição de todas as crianças e jovens fazerem musicais nas escolas, o que proporciona aos profissionais as múltiplas habilidades.

O festival Minitrama vem na contramão dessa tendência. Aspecto bastante saudável. O Brasil tem elementos musicais fortíssimos e o maior compositor do século XX é o brasileiro Tom Jobim. São musicais curtos, com dramaturgia, com interesse e com brasilidade, o que é fundamental. O musical autoral está relacionado à própria formação cultural do povo brasileiro, em que diversos saberes, crenças, costumes e tradições se unem na construção de histórias. Mas quais são os caminhos iniciais que os artistas devem tomar para a criação de um musical brasileiro?

Com a realização de mostras e oficinas, o festival Minitrama chega à sua segunda edição de 1º a 3 de agosto no Centro Cultural Justiça Federal, com o objetivo de ser um ponto de encontro para quem escreve musicais no Rio de Janeiro e para o público admirador do gênero. Um "laboratório", no qual novos espetáculos podem compartilhar seus primeiros passos com o público, democratizando o acesso aos bastidores do teatro musical.

O festival foi criado no ano passado pelos dramaturgos e amigos Gabriela Alkmin, Luiz Buarque e Marcelo Albuquerque. Diante do desafio do alto custo dos musicais, resolveram investir em "minimusicais", em que os criadores apresentam versões de até 20 minutos dos espetáculos que estão desenvolvendo. Este exercício de concisão também permite que os participantes possam focar suas pesquisas no material escrito. "Reduzir o tamanho das apresentações equilibra o orçamento e ainda assim nos possibilita apresentar uma experiência com "início/meio/fim" aos espectadores", explica Marcelo Albuquerque. "Já o público, tem a rara oportunidade de vivenciar a criação de um musical e colaborar com seus autores através de oficinas e rodas de conversa", acrescenta Gabriela Alkmin.

A anfitriã da festa é a atriz Stella Maria Rodrigues, que já participou de musicais como "Company", "Cole Porter, ele nunca disse que me amava", "Romeu e Julieta, ao som de Marisa Monte", "Cazuza, pro Dia Nascer Feliz", entre outros. E ela quem vai abrir a noite para as apresentações dos "minimusicais" "A Pandêmica Comédia" (01/08 e 03/08), "Casa dos Artistas Fodidos" (01/08 e 02/08), "Sem Sinal" (01/08 e 02/08) e "Antes que tudo acabe" (02/08 e 03/08). No último dia, haverá uma roda de conversa após as apresentações.

"Na época em que comecei a fazer musical, nós não tínhamos esse preparo de hoje, de estudar canto, dança, interpretação. Era meio no susto. Por isso, é muito bom ver essa evolução, e os jovens atores de hoje já com esse preparo. O teatro musical entrou no Brasil e está tendo a nossa cara, né? No festival Minitrama, vemos a qualidade dos nossos autores, diretores, atores, de toda essa engrenagem do teatro", celebra a atriz Stella Maria Rodrigues. "Os musicais da Broadway são incríveis, mas ver o teatro musical autoral ganhando força aqui, sem se guiar por fórmulas americanas, é gratificante. No evento, temos a possibilidade de conhecer e ver quanta criatividade, quanto talento existe aqui", completa a atriz.

Além dos espetáculos, serão oferecidas as oficinas Técnica Vocal para Teatro Musical (2/8), com Chiara Santoro; A culpa é do texto (ou "quem escreveu isso aqui?"), com Luiz Buarque; O Corpo do Personagem - O Corpo em Cena, com Daniel Chagas; e Laboratório da canção, com Marcelo Albuquerque e Gabriela Alkmin.

"Abrir um espaço para criadores é fomentar artistas do Rio de Janeiro na busca investigativa pela linguagem do teatro musical com um cara nossa, focando no aquecimento desse mercado, valorizando a cultura e preparando esses profissionais para o mercado", reforça Luiz Buarque.

SERVIÇO

FESTIVAL MINITRAMA

Centro Cultural Justiça Federal (Av. Rio Branco, 241 - Centro)

1 a 3/8, de quinta a sábado, às 14h30 e 16h30 (oficinas) e 19h (mostras)

Ingressos: Mostra - R$ 60 e R$ 30 (meia) | Oficina - R$ 30 

 

Programação completa

MOSTRA

A Pandêmica Comédia (1 e 3/8): Inspirado na obra clássica "A Divina Comédia", de Dante Alighieri, que conta a história de sua viagem ao submundo com intenção de chegar ao paraíso. Um texto dividido em 9 esquetes-monólogos em que cada uma simboliza um círculo do inferno, usando a pandemia como plano de fundo. Autor e Compositor: Matheus Brito

Casa dos Artistas Fodidos (1 e 2/8): Ser artista de teatro musical é para os corajosos! É preciso aprender a cantar, dançar e atuar ao mesmo tempo. Mas o que ninguém te ensina por trás do glamour do showbiz é: Como ser artista e não ser fodido? Ou melhor, porque trabalhar com teatro em um país onde a preocupação básica do artista é pagar a conta no fim do mês? Escritor, Letrista e Compositor: Ramon Costa | Letrista e Compositora: Malu Cordioli

Sem Sinal (1 e 2/8): Três adolescentes enfrentam o inesperado colapso da internet e são forçados a redescobrir o mundo offline. Sem redes sociais, eles se veem desafiados a explorar novas formas de se conectar e se relacionar. Texto e letras: Daniel de Mello | Músicas: Gabriela Alkmin

Antes que tudo acabe (2 e 3/8): O que fazer quando percebemos que a vida tomou um rumo totalmente diferente do que havíamos imaginado? No réveillon do "bug do milênio", o popstar Edu Reis faz um show histórico nas areias de Copacabana. Vinte anos depois, o cantor tenta voltar aos palcos e acaba "cancelado". Texto: Luiz Buarque e Rogério Fanju | Música e letra: Rebecca Noguchi

Roda de Conversa: encerra a noite de mostras do dia 3/8