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Deixa o defunto falar

Uma das novidades da montagem é ter Machado de Assis como personagem | Foto: Marcus Kury/Divulgação

A Armazém Companhia de Teatro reestreia nesta quinta-feira (29) em sua casa, o Espaço Armazém, na Fundição Progresso, o espetáculo "Brás Cubas", versão cênica de Paulo de Moraes para a obra-prima de Machado de Assis, que traz o Bruxo do Cosme Velho para o centro da cena, como personagem.

Foi a partir da 1881, com "Memórias Póstumas de Brás Cubas", seguido por "Quincas Borba", "Dom Casmurro", "Esaú e Jacó" e "Memorial Aires" que Machado de Assis (1839-1908) começou a desenvolver seu extraordinário que viria a ser rotulado como realismo psicológico, permeando seus romances com impetuoso sarcasmo. "Memórias Póstumas de Brás Cubas" é considerado um romance original desde a sua dedicatória "ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver" e prossegue na ideia de um defunto autor que, para fugir ao tédio do túmulo, escreve suas memórias.

A dramaturgia de "Brás Cubas", assinada por Maurício Arruda Mendonça, é uma adaptação do romance de Machado, mas não em seu sentido clássico porque insere o próprio autor na peça, como personagem. "O espetáculo tem uma certa vinculação com o sonho. A gente constrói essa história como se estivéssemos dentro da casa do Machado, acompanhando a sua criação. E o ponto central da nossa adaptação é o delírio que o personagem do Brás tem momentos antes de sua morte", comenta o dramaturgo.

"Brás Cubas é um dos personagens mais icônicos da literatura brasileira. Tratar de um personagem pretensioso e prepotente, um recordista de fracassos, que têm uma aversão por si mesmo absolutamente merecida - e que nos fala tanto sobre a formação da elite brasileira -, era muito sedutor. Mas traduzir a experimentação formal de Machado para o palco - conversando com o público de hoje - me parecia desafiador. Porque Machado escreve com um nível de sutileza raro. Então, com certeza o nosso grande embate durante a descoberta da peça tem sido como fazer com que essa literatura sutil se transforme numa ação dramática contundente", comenta o diretor Paulo de Moraes.


 

Uma dramaturgia com três planos narrativos

Sérgio Machado (E) interpreta Brás Cubas desde seu nascimento até sua morte (não necessariamente nessa ordem) e Jopa Moraes assume Brás Cubas já como o defunto que narra suas memórias póstumas | Foto: Mauro Kury/Divulgação

Amontagem desmembra o personagem Brás Cubas em dois. Sérgio Machado interpreta Brás Cubas desde seu nascimento até sua morte (não necessariamente nessa ordem) e Jopa Moraes assume Brás Cubas já como o defunto que narra suas memórias póstumas.

"Esse defunto está pouco vinculado ao século 19, quer e precisa se comunicar com as pessoas de agora", avisa Paulo Moraes.

A dramaturgia tem uma estrutura em três planos: o plano da memória - que são as cenas vividas por Brás; o plano da narrativa - onde entram as divagações e reflexões do defunto; e um terceiro plano em que o próprio Machado de Assis (vivido por Bruno Lourenço) invade sua narrativa com comentários que visam conectar contemporaneamente suas críticas à sociedade brasileira.

"Nosso Machado não é um personagem biográfico. Embora todas as questões que o personagem coloque na peça tratem de assuntos sobre os quais Machado escreveu, estão colocadas em contextos diferentes. É uma brincadeira a partir de detalhes biográficos. Um personagem imaginário tentando se comunicar com o nosso tempo", garante Paulo.

A montagem tem elenco formado por Bruno Lourenço, Isabel Pacheco, Jopa Moraes, Felipe Bustamante, Lorena Lima e Sérgio Machado, iluminação de Maneco Quinderé, cenografia de Carla Berri e Paulo de Moraes, figurinos de Carol Lobato, direção musical de Ricco Vianna e direção de movimento de Patrícia Selonk e Paulo Mantuano.

A temporada do espetáculo no Espaço Armazém será de 29 de agosto a 21 de setembro.

Em outubro de 2023, "Brás Cubas" participou do Festival Internacional de Teatro de Wuzhen, na China, ao lado de importantes nomes do teatro mundial, como Robert Wilson e Joël Pommerat, sendo o espetáculo mais bem avaliado pelo público chinês. Nos dias 22 e 23 de julho foi apresentado durante o Festival Internacional de Teatro de Rio Preto. Em outubro, o espetáculo será apresentado na Rússia durante o Pacific International Theatre Festival, em Vladivostok, nos dias 4 e 5, e em turnê na China passando por Xangai (25 a 27/10), Pequim (1 a 3/11) e Foshan (8 e 9/11).

SERVIÇO

BRÁS CUBAS

Espaço Armazém - Fundição Progresso (Rua dos Arcos, 24 - Lapa) | De 29/8 a 21/9, às quintas (19h) e sextas e sábados (19h30) | Ingressos: R$ 80 e R$ 40 (meia)