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Pioneirismo e ativismo negro em cena

Aguinaldo Camargo e Fernando Araújo em 'Imperador Jones', de 1945 | Foto: Acervo Abdias do Nascimento/Ipeafro

Em 1945, pela primeira vez, atores negros pisaram enquanto protagonistas no palco do Theatro Municipal com a encenação de "O Imperador Jones", um marco histórico possibilitado pelo Teatro Experimental do Negro (TEN). A companhia teatral foi pioneira na luta pela inclusão de artistas negros nos espaços culturais mais prestigiados do Brasil.

O grupo revelou talentos como Ruth de Souza, Léa Garcia, Grande Otelo e Milton Gonçalves, abrindo caminho para gerações de artistas negros no teatro, cinema e televisão.

Para celebrar os 80 anos do TEN, o Ipeafro (Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros), a DSS Produções e Temporal Editora levarão novamente ao Municipal o espírito da cultura e da arte que impulsionaram aqueles pioneiros e pioneiras a criar um dos movimentos cênicos mais importantes do país. Nesta sexta-feira (11), a Sala Mário Tavares receberá o lançamento da primeira reedição de Dramas para Negros e Prólogo para Brancos (Temporal Editora | Ipeafro), uma obra que desde 1961 se mantém como referência ao tratar das questões raciais no Brasil por meio da dramaturgia.

Esta nova edição inclui as nove peças da antologia original, entre elas "O Filho Pródigo", de Lúcio Cardoso; "Sortilégio, Mistério Negro", de Abdias Nascimento - em sua primeira versão - e "Anjo Negro", de Nelson Rodrigues, além de textos inéditos que destacam a relevância histórica e atual do TEN.

No mesmo dia, haverá uma exibição especial do filme "Ecos do Teatro Experimental do Negro", dirigido por Daniel Solá Santiago. O documentário explora as encenações marcantes do TEN e seu impacto transformador na valorização da cultura negra no Brasil, trazendo depoimentos inéditos de grandes artistas como Bibi Ferreira, Lázaro Ramos, Léa Garcia e Aílton Graça.

No domingo (13), a programação se desloca para o Muhcab (Museu da História e da Cultura Afro-Brasileira), com mais uma exibição especial do filme, seguida de uma roda de conversa. Além disso, o público presente também poderá participar do lançamento oficial da nova edição do livro, que será acompanhado por conversas sobre o legado do TEN e a luta contra o racismo nas artes cênicas. Continua na página seguinte

 

Valorizar a cultura afro-brasileira para combater o racismo

Abdias do Nascimento foi poeta, dramaturgo, artista visual, ativista pan-africano, deputado federal, senador e professor emérito da Universidade do Estado de Nova York | Foto: Acervo Abdias do Nascimento/Ipeafro

Fundado em 13 de outubro de 1944 por Abdias do Nascimento, José Herbal, Theodorico dos Santos, Aguinaldo Camargo e Wilson Tibério no Café Vermelhinho, na Cinelândia, o Teatro Experimental do Negro tinha como objetivo principal valorizar a cultura afro-brasileira e combater o racismo através da arte e da educação.

Criado num contexto histórico marcado pela discriminação racial, o TEN buscava dar voz aos negros brasileiros e promover a igualdade racial. Além de apresentar peças teatrais, o grupo também realizava atividades educativas e culturais, como palestras, debates e oficinas.

O repertório do TEN incluía tanto peças clássicas, adaptadas para a realidade brasileira, quanto peças originais de autores negros. Entre as montagens de maiors sucesso estão: O "Imperador Jones", adaptação do texto de Eugene O'Neill; "O Moleque Sonhador", peça original que abordava a temática da discriminação racial no país; e "Othello", adaptação do clássico shakespeareano com um elenco totalmente negro.

O TEN foi fundamental para a conscientização sobre a questão racial no Brasil e inspirou a criação de outros grupos teatrais e movimentos sociais.

Desde seu início, o TEN obteve ampla visibilidade. O jornal O Radical de 14 de outubro de 1944 registrou o fato histórico, informando que ao grupo inicial de fundadores se juntaram Arinda Serafim, Ruth de Souza, Claudiano Filho, Oscar Araújo, José da Silva, Antonieta, Antonio Barbosa e Natalino Dionísio, entre muitos outros.

Poeta, dramaturgo, artista visual e ativista pan-africano, Abdias do Nascimento foi deputado federal, senador e professor emérito da Universidade do Estado de Nova York (EUA). Além de fundar o TEN, organizou em 1950 o 1º Congresso do Negro Brasileiro, que decidiu pela necessidade de se criar um Museu de Arte Negra. Abdias atuou como curador do projeto até 1968.

No exílio, durante a ditadura militar, continuou colecionando obras doadas à coleção por artistas africanos e da diáspora, fazendo contatos com artistas e conceituando o que seria um Museu de Arte Negra.

A partir de 1968, passou a desenvolver seu próprio trabalho na pintura e exibiu em museus, galerias, centros culturais e universidades em todas as regiões dos Estados Unidos. Continuou pintando na volta ao Brasil, onde fundou o Ipeafro, que realizou exposições em museus e instituições culturais em Paris e em várias cidades do Brasil.

O documentário "Ecos do Teatro Experimental do Negro" e a nova edição de "Dramas para Negros e Prólogo para Brancos" são marcos importantes que integram o Biênio Abdias Nascimento, um conjunto de ações celebrando o 110º aniversário de Abdias e os 80 anos do TEN em 2024. Em 2025, serão celebrados os 80 anos da estreia do TEN, os 75 anos do 1° Congresso do Negro Brasileiro e os 70 anos do Concurso do Cristo Negro, parte das ações do Museu de Arte Negra.

SERVIÇO

11/10: Sala Mário Tavares | Theatro Municipal do Rio (Av. Alm. Barroso, 14 - Centro)

15h - Abertura e coquetel de lançamento do livro "Dramas para Negros e Prólogo para Brancos", de Abdias Nascimento | 16h - Exibição especial do filme "Ecos do Teatro Experimental do Negro"* | 18h30 - Debate | 19h30 - Coquetel e confraternização

13/10: Muhcab - Museu da História e da Cultura Afro-Brasileira (Rua Pedro Ernesto, 80 - Gamboa)

13h30 - Abertura com lançamento do livro "Dramas para Negros e Prólogo para Brancos". Coquetel | 14h30 - Exibição especial do filme "Ecos do Teatro Experimental do Negro" | 16h45 - Roda de conversa | 18h - Coquetel