Um terrível segredo no paraíso
'Aqueles Que Deixam Omelas' é a nova incursão de João pedro Zappa nos palcos
É possível criar um mundo verdadeiramente justo? O que fazer quando cada movimento com esse objetivo parece gerar novas e desconhecidas injustiças? Esses questionamentos guiam o espetáculo "Aqueles que deixam Omelas", solo narrativo baseado no conto homônimo da renomada autora americana Ursula K Le Guin (1929-2018), nunca publicado no Brasil.
Com direção de João Maia e atuação de João Pedro Zappa, a montagem se constrói a partir do encontro do espectador com o narrador da história, um viajante solitário. Desde que deixou Omelas, ele percorre o mundo contando a história desse lugar de nome exótico, desconhecido por todos.
Num primeiro momento, Omelas parece ser o lugar da utopia: solar, belo, alegre, livre. Mas, na verdade, esconde um segredo, uma feiura e tragédia quase distópicas. Ao revelar esse segredo, a sombra de Omelas aparece, tornando aquele lugar familiar a todos. O relato feito pelo viajante, em detalhes minuciosos, funciona como uma espécie de espelho, onde cada espectador ao se ver refletido, percebe que é parte integrante da distopia de Omelas. Talvez a narrativa do viajante tenha até um caráter de maldição, uma necessidade permanente de dividir com todos a sua própria perplexidade: "Se eu terei de viver para compreender isso que parece incompreensível, vocês também terão…", diz o personagem para o público.
Com tom de fábula moral filosófica, a narrativa apresenta uma trama repleta de paradoxos: beleza e sofrimento, liberdade e opressão, justiça e injustiça, dor e prazer. O espectador se vê envolvido por um turbilhão de imagens e acontecimentos, que vão sendo narrados pelo viajante, e mediados por esse jogo de opostos incômodos. A história que está sendo contada, em alguma medida, pode ser a história de qualquer um que esteja ali sentado, ouvindo aquele curioso relato.
Estreando na direção teatral, João Maia P constrói uma cena crua e direta apoiada no trabalho minucioso da construção de imagens poéticas feitas pelo ator-narrador, e por uma cenografia e um figurino minimalistas. "A urgência de contar essa história no Brasil de hoje está ligada à necessidade de se pensar sobre como é complexa a estruturação de uma sociedade mais justa. A quebra da ilusão utópica como caminho para lidar com a turbidez da realidade da experiência social humana no mundo", avalia o diretor.
SERVIÇO
AQUELES QUE DEIXAM OMELAS
Espaço Cultural Municipal Sérgio Porto (Rua Visconde de Silva, ao lado do nº 292 - Humaitá)
Até 15/12, às sextas e sábados (19h) e domingos (18h)
Ingressos: R$ 40 e e R$ 20 (meia)