Liberdade, abra as asas sobre nós...
Na pele de Zaratrusta, Amir Haddad e o Tá Na Rua dialogam com Nietzsche
"Não vos aconselho o trabalho, mas a luta. / Não vos aconselho a paz, mas a vitória! / Seja o vosso trabalho uma luta! / Seja a vossa paz uma vitória!".
Comemorando 67 anos de carreira e 87 anos de vida, o ator e diretor Amir Haddad volta ao Teatro Rival Petrobras com o Grupo Tá Na Rua, encenando o espetáculo "Zaratustra: uma Transvaloração dos Valores" em apresentação única nesta quarta-feira (4). A peça, ambientada em uma praça da Idade Media, encena o prólogo do livro "Assim falava Zaratustra" com outros trechos do livro, mas não deixa de trazer a fala de Amir Haddad para a cena.
"Grande astro! Que seria da tua felicidade se te faltassem aqueles a quem iluminas? Faz dez anos que te abeiras da minha caverna, e, sem mim, sem a minha águia e a minha serpente, haver-te-ias cansado da luz e deste caminho. [...] Pois bem: já estou tão enfastiado da minha sabedoria, como a abelha que acumulasse demasiado mel. Necessito mãos que se estendam para mim." Essa é a abertura de Zaratustra.
"Assim falou Zaratustra: Um Livro Para Todos e Para Ninguém" (em alemão: Also sprach Zarathustra: Ein Buch für Alle und Keinen) foi escrito entre 1883 e 1885 pelo pensador alemão Friedrich Nietzsche. Suas narrativas (pois é construído de episódios) tratam das andanças e ensinamentos de um filósofo, que se autonomeou Zaratustra após a fundação do Zoroastrismo na antiga Pérsia. Para explorar muitas das ideias de Nietzsche, o livro usa uma forma poética e fictícia, frequentemente satirizando o Velho e o Novo Testamento
O espetáculo nasceu da relação de Haddad com o personagem Zaratustra, criado por Nietzsche. A necessidade de uma vida ousada e corajosa, de um humano forte com os pés fincados na terra, capaz de realizar os mais altos voos, capaz de potencializar perdas e dores em ação, em criação, é o que caracteriza tanto as afirmações do Zaratustra de Nietzsche quanto do trabalho e da vida do ator e diretor Amir Haddad com seu Grupo Tá Na Rua.
Amir se aproxima da filósofa Vivianne Mosé para, juntos, criarem uma dramaturgia que confirme a principal crença do diretor: "Nós só acreditamos em um Deus que dança!". Da dança, da encenação, da direção de Máximo Cutrim, o Tá na Rua consegue conciliar , nesse espetáculo, teatro, filosofia e existencialismo para falar dos valores contemporâneos que tratam do instante, do post na redes sociais que devem apresentar esse sujeito com uma vida ousada e corajosa, e de um ser humano forte com os pés fincados na terra, capaz de realizar os mais altos voos.
A afirmação de uma postura diante da vida que assume em seus diversos aspectos - inclusive na dor, na perda - acompanhada da capacidade de potencializar esta perda em ação, em criação, é o que caracteriza tanto as afirmações do Zaratustra de Nietzsche quanto do trabalho e da vida de Amir Haddad com seu Grupo Tá Na Rua.
O Tá Na Rua foi fundado na década de 1980 por Amir Haddad, junto a um coletivo de atrizes e atores inquietos, que buscaram nos espaços abertos uma resposta a todas as repressões. Nasce com essa pesquisa o conceito de Arte Pública, entendendo a arte como o fator social que organiza o mundo.
Amir Haddad é a história viva do teatro brasileiro. Com José Celso Martinez Corrêa, Renato Borghi e outros criou em 1958 o Teatro Oficina — ainda em atividade com o nome de Uzyna Uzona. O diretor vai do experimentalismo ao clássico, já montando textos de Shakespeare e dirigindo shows de Ney Matogrosso e Beto Guedes, além de atuar em novelas e séries. Emfim, um profeta da liberdade em todos os campos da arte.
Ao encenar Zaratustra, Amir contracena com o próprio Nietzsche, interpretado por Viviane Mosé. Nietzsche faz nessa obra uma crítica feroz do Ocidente no final no Século 18. Tal qual o Tá na Rua, o grito contra a hipocrisia, com a negação das instituições é a fala de Zaratustra que permeia as instituições.
Amir e o Tá na Rua procuram fazer com que a plateia tenha algo mais do que a fruição, reflexão. A busca são os laços, as parcerias com os espectadores para que eles vejam a importância da liberdade do sujeito, da alma, para que assumam as suas individualidades e permitam que bom e velho conceito do livre arbítrio nos ilumine.
SERVIÇO
ZARATRUSTA: UMA TRANSVALORAÇÃO DE VALORES
Teatro Rival Petrobras (Rua Álvaro Alvim, 33) | 4/12, às 19h30 | Ingressos entre R$ 35 e R$ 80