Por: Cláudia Chaves | Especial para o Correio da Manhã

Jô Santana: 'Há uma necessidade de reapresentar o Brasil aos brasileiros'

Jô Santana, premiado produtor teatral, fala de sua carreira e de projetos do passado, presente e futuro em papo com o Correio | Foto: Divulgação

Jô Santana é alto, forte, anda decidido, aperto de mão firme, sorriso largo. Poderia ser mais um artista que saiu de sua terra para tentar o sucesso. Ele é, na verdade, uma força que vai muito além do seu físico. Estudou nas melhores escolas de teatro, no Brasil e no exterior. Foi ator de sucesso e, há mais de 15 anos, criou um novo estilo de musical.

Artistas brasileiros são vistos além de suas biografias deste verdadeiro show-runner. Criativo, com foco na cultura brasileira, apresenta espetáculos de sucesso. Agora, está à frente de "Martinho Coração de Rei - o Musical", uma potência de brasilidade no palco, com atores um time de atores-cantores talentosos, ballet dos melhores, figurinos lindos numa dramaturgia contagiante de Helena Theodoro e uma direção acertadíssima de Miguel Falabella.

Com exclusividade, Jô Santana conversou com o Correio sobre passado, presente e futuro.

Como e quando você encontrou o teatro?

Jô Santana - Eu nasci em Aracaju, Sergipe. Lá, na adolescência, eu estudava no Colégio Estadual 17 de Março e, certa feita, a nossa professora de Educação Artística, Eugenia Barros, uma mulher negra, nos levou para o Festival de Artes de São Cristóvão. Lá tive oportunidade de ver dois fenômenos que marcaram minha vida pra sempre: Marika Gidali, uma artista húngara, dançando no espetáculo "Que Saudades de Elis", do Ballet Stagium; e o Grupo Imbuaça, o mais antigo grupo de teatro de rua do Brasil em atividade ininterrupta. Ali soube que era aquilo que eu queria para a minha vida: a vida para sempre ligada aos palcos e ao mundo dos espetáculos. Pouco tempo depois, estava eu vindo pra São Paulo, ainda novinho, para tentar a vida como ator. E, como os trabalhos nem sempre pintavam, entre uma formação e outra, eu fui começando a produzir para poder atuar. E acabei tomando gosto pela produção, direção e idealização de projetos teatrais e musicais.

Como a sua formação internacional, em um viés diferenciado, resolveu misturar chiclete com banana, e fazer nosso samba ficar assim em musicais?

Sim, eu tenho uma formação bastante abrangente, passei pelo Grupo Tapa, tive contato com o Living Theatre no começo da minha carreira, tenho tido oportunidade de ver e estar em contato com o melhor da produção cultural no mundo, mas eu aproveito de tudo isso para pegar o melhor do nosso Brasil e produzir um teatro musical genuinamente brasileiro. Essa tem sido uma grande luta nossa! Encontrar essa cara do nosso teatro musical, que bebe muito das culturas de cada lugar do nosso país, dos nossos ritmos, nossos saberes e sabores que, obviamente são muito influenciados tanto pelas culturas europeias e estadunidenses quanto pelas culturas africanas também. É a formação do nosso povo e daquilo que a gente quer ver e ouvir. Cada trabalho também tem muito do toque de cada pessoa que está na direção, que acaba por trazer a sua bagagem. É sempre algo muito produto do coletivo!

Seus espetáculos vão além da biografias. Em Alcione temos o boi. Em Martinho temos as religiões de matriz africana. Como você pensa e escolhe esses caminhos.

Com certeza! No musical de Cartola, a gente trouxe o morro e o carnaval para o palco. Para homenagear Dona Ivone Lara, trouxemos o universo da "loucura", ela foi importante para a psiquiatria brasileira ao lado de Nise da Silveira, e também mais uma vez o carnaval, as rodas de samba. Não é só sobre uma pessoa que está sendo homenageada. É sobre o seu legado e o universo do qual aquela pessoa bebeu na fonte. Assim tem sido e assim será com todos os projetos que temos em mente. A gente sempre envolve todo um trabalho de pesquisa. Sempre que possível, a gente vai até onde a pessoa viveu e se construiu enquanto artista. A gente foi a São Luís do Maranhão algumas vezes durante o processo de "Marrom, o Musical". Há uma necessidade de reapresentar o Brasil aos brasileiros, porque é uma nação muito grande e rica demais em culturas pra gente conhecer e reconhecer.

O que está em gestação além de Fafá de Belem?

É isso. Ainda sobre o tópico anterior, pra falar de Fafá, a gente vai mergulhar na Amazônia Paraense, na cultura de Belém e, como o momento pede, vai ter também um quê de grito pela nossa sobrevivência na Terra. É o ano da COP 30. Os olhos do mundo inteiro estarão voltados para o Brasil. Além do musical em homenagem a Fafá, estamos preparando um belíssimo musical em homenagem aos 100 anos da Estação Primeira de Mangueira, a convite da presidente da escola. Vem aí também uma homenagem ao grande Johnny Alf, em parceria com Miguel Falabella; estamos costurando um projeto grandioso junto com o Maestro Adriano Machado e a Orquestra Sinfônica Villa Lobos, sobre o qual a gente ainda não pode dar mais detalhes; além de uma nova temporada de "Marrom, o Musical".

E a volta a ser ator? Tem em mente algum projeto para atuar?

O ator está sempre aqui! Não tem sido o meu foco, mas sim, por ocasião dos meus 30 anos de carreira, eu estarei de volta aos palcos em uma montagem de um clássico: Otelo! Vem aí! Podem esperar! Também estarei na direção de uma nova montagem de O Reizinho Mandão, um grande sucesso nosso do teatro infanto-juvenil, premiado e com um elenco especialíssimo, baseado no livro da minha querida amiga Ruth Rocha. É um xodó esse projeto. Fazer teatro com jovens com síndrome de Down foi algo que me deu um novo olhar para a vida e para a arte. Vai ser muito bom poder fazer isso de novo!