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Acima de tudo, uma mulher

Suzana Nascimento em 'Em Nome da Mãe': 'Nunca tinha parado par pensar nessa mulher de carne e osso e tido que ela deve ter passado' | Foto: Elisa Mendes/Divulgação

Ao colocar em segundo plano o aspecto religioso e desconstruir a imagem idealizada de Maria de Nazaré, o monólogo "Em Nome da Mãe" apresenta a trajetória de uma jovem pobre, solteira e grávida, atravessada por preconceitos em uma sociedade patriarcal e conservadora. A história, que há séculos vem sendo contada por homens na tradição bíblica, ganha aqui nova perspectiva: a da própria protagonista, antes de ser reconhecida como mãe do filho de Deus.

Inspirada na obra homônima do autor italiano Erri de Luca, a montagem é assinada e protagonizada por Suzana Nascimento, com direção de Miwa Yanagizawa. O espetáculo volta aos palcos cariocas em temporada no Teatro Adolpho Bloch.

A dramaturgia parte da leitura pessoal de Suzana, que conheceu o livro em 2015. "Quando li o livro do Erri De Luca, eu fiquei arrebatada completamente. E fiquei muito impressionada porque eu nunca tinha parado para pensar nessa mulher de carne e osso, assim como muita gente nunca parou para pensar nessa mulher de carne e osso que é a Maria e tudo o que ela deve ter passado na época que ela passou, na época que essa história provavelmente aconteceu. E como ela tem a ver com as muitas mulheres da atualidade", disse Suzana ao Correio da Manhã quando a peça estreou no Rio, em agosto de 2024.

A atriz conta que, a partir do livro, construiu uma adaptação que amplia o olhar para o feminino e para questões ainda urgentes na sociedade contemporânea. Na peça, três mulheres conduzem a narrativa - a jovem Maria (ou Miriam, em hebraico), a atriz e a anciã - revelando os dilemas, medos e resistências de uma personagem marcada pela coragem e pelo silêncio histórico. O espetáculo também incorpora relatos da própria atriz e reflexões atuais, costurando passado e presente com delicadeza.

"Eu procuro aqueles personagens que de alguma forma me afetam profundamente e que a partir daí eu vou trabalhar essas personagens para que elas afetem profundamente outras pessoas também. E que de alguma forma elas transformem e façam as pessoas refletirem e causem alguma mudança nas pessoas que se encontram com essa personagem", comenta Suzana.

Premiada em quatro categorias no 16º Prêmio APTR de Teatro, incluindo melhor espetáculo, direção, música e atriz, a montagem circulou por oito unidades do Sesc no estado do Rio em 2024, com apoio do edital Sesc Pulsar. A nova versão, concebida especialmente para o palco, traz mudanças significativas de linguagem. A luz, redesenhada por Ana Luzia Molinari de Simoni em parceria com Hugo Mercier, e o cenário, recriado por Desirée Bastos e Jovanna Souza, são alguns dos elementos revistos para esta encenação presencial.

"Não se trata de uma simples transposição. Estamos criando uma nova experiência cênica, com momentos de interação com o público que fazem parte do meu modo de atuar desde 'Calango deu! Os causos da Dona Zaninha'", comenta Suzana, referindo-se ao solo que permaneceu dez anos em cartaz e venceu prêmios em festivais nacionais.

Para a diretora Miwa Yanagizawa, o espetáculo se insere numa trilogia de trabalhos voltados ao protagonismo das mulheres. "A peça rompe com a imagem romantizada de Maria. Ao humanizá-la, ela se torna símbolo de resistência e liberdade - um gesto que amplia o debate feminista e reforça a potência de narrativas que ainda foram pouco ouvidas", diz Miwa, que também dirigiu "Nastácia" e "Eu matei Sherazade, confissões de uma árabe em fúria".

SERVIÇO

EM NOME DA MÃE

Teatro Adolpho Bloch (Rua do Russel 804, Glória)

Até 4/5, de quinta a sábado (20h) e domingos (17h) (20h)

Ingressos: R$ 120 (quintas e sextas), R$ 100 (sábados e domingos) e R$ 50 (lista amiga)