Um grande sertão no palco

Segundo espetáculo de uma ambiciosa trilogia baseada no universo roseano, 'O Diabo na Rua, no Meio de Redemunho' encerra temporada no Espaço Abu

Por Cláudia Chaves | Especial para o Correio da Manhã

Responsável por adaptar a prosa de Guimarães Rosa para a linguagem cênica, Gilson de Barros estuda a obra do autor há oito anos initerruptos

Em sua última semana em cartza no Espaço Abu, "O Diabo Na Rua, No Meio do Redemunho" é o segundo espetáculo, de um projeto ambicioso denominado "Trilogia Grande Sertão: Veredas", com direção de Amir Haddad e recorte e atuação de Gilson de Barros.

Pesquisador minucioso do universo de Guimarães Rosa (1908-1967), Gilson fala, com exclusividade ao Correio da Manhã, de seus redemoinhos de sentimentos sobre este projeto que vem guiando sua carreira nos últimos anos.

"Estudar e tentar traduzir a prosa de Guimarães Rosa para a linguagem do teatro tem sido a função da minha vida há oito anos. Eu participo de grupos de estudo da USP, da UFMG, da UNB, da Universidade Nova de Lisboa... Estudo Guimarães Rosa em todas as academias possíveis e fora da academia também. Então, eu não tinha noção da dimensão da obra e também não tinha noção da paixão que eu ia construir com esse escritor. Eu sou literalmente fissurado em Guimarães Rosa hoje, especificamente no livro 'Grande Sertão', mas estudo toda a obra dele. Qualquer estudo, quando você se aprofunda, ele te dá retorno.", relata o ator, já com 50 anos de carreira nas artes cênicas.

"Eu vivo hoje de Guimarães Rosa. Eu estou com duas peças prontas, estou a caminho de uma terceira, a trilogia, e eu nunca imaginei ter uma dimensão tão grande no meu trabalho nacional e agora já internacionalmente. Fui para Bogotá e fui para Lisboa e já é certo que eu volto ano que vem para Portugal, vou fazer Paris também. Então é uma coisa que eu não tinha no início dimensão. O Amir brinca comigo e ele fala, rapaz, se você tivesse noção do trabalho, você não ia encarar. E eu acho que ele está certo, porque eu sou bastante medroso. Quando você está no meio de um processo, não tem como voltar", confessa.

Gilson admite que, no início de todo esse processo investigativo ele não tinha dimensão do tamanho da obra a que estava se dedicando.

"A grandeza da obra e deste nome, do respeito que esse homem goza no nosso país.. Sabe quando você está no meio de um amor que você não tem dimensão? Você não consegue raciocinar, né? Os grandes amores são esses. Eu não consigo, eu só consigo sentir maravilhas. Gosto de fazer as peças, gosto de estar envolvido com os cursos", explica.

Para Gilson, Guimarães Rosa está lhe ensinando uma visão muito maior do mundo. "Para ele, nós somos iguais às plantas, à árvore, à água, ao chão... é uma loucura. Mas essas cabeças abrindo é que eu com 64 anos estou me permitindo", afirma, acrescentando que não é só o ator que está ganhando com esse projeto, mas a pessoa, Gilson. "Fui indicado a prêmio, estou conseguindo viver disso, como eu já falei, isso é uma maravilha para qualquer ator", comemora.

EStar em companhia de Amir Haddad, uma gigante das artes cênicas é outro orgulho do ator. "Ultimamente ele mais supervisiona do que dirige, mas a mim ele dirige. Isso é um privilégio. Ele dirigiu o meu espetáculo, dirigiu o ator Gilson de Barros. O Amir me reconduziu ao palco fazendo o teatro do que tem que ser, não é o possível, é o que tem que ser, não é o que eu posso, é o que Guimarães Rosa pede, é o que a cena pede. Isso muda tudo", destaca, dizendo que o veetrano diretor o reposicionou como ator.

Gilson afirma que, depois de um bom tempo de trabalho com essas peças, consegue sentir algo que Haddad lhe disse no início dos ensaios: "Ele disse que eu ia chegar ao ponto de fazer o espetáculo sentado no banco com ele de um lado meu e Guimarães Rosa do outro. É uma loucura, mas eu sinto isso mesmo. Eu não me sinto num monólogo, eu não me sinto sozinho. Eu sinto que eu tenho a companhia de um Amir e de um Guimarães Rosa do lado. Isso é uma coisa forte pra caramba", alegra-se.

SERVIÇO

O DIABO NA RUA, NO MEIO DO REDEMUNHO

Espaço Abu (Av. Nossa Sra. de Copacabana, 249 - loja E - Copacabana)

Até 30/6, de sexta a domingo (20h)

Ingressos: R$ 60 r R$ 30 (meia)