Por: Affonso Nunes

A beleza que mora ao lado

Criador e diretor musical do sexteto vocal Ordinarius, Augusto Ordine se aventura em modo solo no ótimo álbum 'A Beleza Precisa de Abrigo' | Foto: Bruno Braz/Divulgação

Cantor, arranjador, compositor e regente, Augusto Ordine é conhecido por ser a mente criativa por trás do Ordinarius - um respeitado sexteto vocal da cena musical carioca. Ao mesmo tempo em que o grupo acaba de lançar um novo álbum, o nono, Ordine decide assumir seu lado autoral em "A Beleza Precisa de Abrigo", disco que chegará às plataformas digitais nesta sexta-feira (27) e que o Correio ouviu antes. É um trabalho eclético, rico em soluções melódicas e com letras criativas assinadas pelo compositor Mauro Aguiar, que podemos chamar de poeta plural.

Rebobinando: a parceria começou a partir de um poema dedicado a João Gilberto. Mauro escreveu "João" após a morte do gênio criador da batida da bossa nova. O poema chegou até as mãos de Ordine que logo criou uma melodia para aquela letra. Mauro ficou encantado com o resultado e mandou, em seguida, diversas letras para Augusto. Assim nasceu "A Beleza Precisa de Abrigo", primeiro álbum autoral solo de Augusto Ordine.

"A Beleza Precisa de Abrigo" reúne 10 faixas, todas compostas por Mauro e Augusto, em letra e melodia, respectivamente. A produção musical e os arranjos são de Ordine e o lançamento também terá show no Centro da Música Carioca Artur da Távola, na Tijuca, nesta sexta-feira (27), às 19h.

Após concluir "João", primeira faixa do projeto, Augusto foi se debruçando sobre a obra de Mauro, afinando a sintonia com o parceiro, em meio à pandemia. "Foi divertido esse processo porque o Mauro mandava as letras com instruções. Elas chegavam com bilhetinhos dizendo: 'essa aqui tem a cara do Gilberto Gil'. Ou ainda: 'essa é bem buarqueana'. Mesmo à distância, a nossa sintonia foi perfeita e, à medida que fui compondo, mostrava o resultado, e íamos nos unindo musicalmente", lembra Ordine.

O disco traz uma sonoridade acústica, com arranjos refinados e complexos para ritmos bem brasileiros como MPB, baião e bossa, criados a partir de instrumentos como violão, violoncelo, piano, entre outros. Já as letras são uma atração à parte, e apresentam versos poéticos, românticos, irônicos, sagazes, e com divertidas e criativas rimas e jogos de palavras. Todas as faixas são escritas por Mauro Aguiar, letrista com canções gravadas por nomes como Ney Matogrosso, Guinga, Paulinho Moska, entre outros. Um destaques é a faixa "Invisível", que narra a saga dos músicos independentes com muita ironia. Letra e melodia são assumidamente inspiradas em "Construção", de Chico Buarque.

Autor de todos os arranjos do Ordinarius, criado por ele, esta é a primeira vez que Augusto se dedica a um repertório autoral de canções. "Sou reconhecido como arranjador, intérprete e nem tanto como compositor. Porém, gosto muito de fazer isso, então quis gravar as minhas canções e me divertir fazendo esse disco", explica o artista, que tem mais de 20 anos de carreira e que já teve canções compostas para trilhas e projetos educativos, especialmente na TV, como "Fantástico", "TV Xuxa".

A cantora e compositora Maíra Martins, companheira de Augusto e cantora do Ordinarius, faz participação nas faixas "Os Acróbatas", "Vou de Voz" e "Soube", já lançadas previamente como singles. Junto com o disco, sai a inédita "Chamego em Cacho", um baião divertido e dançante que tem featuring do Ordinarius.

"Os Acróbatas", uma das mais românticas do álbum, fala de uma aventura a dois, dois imensos oceanos. Já "Pierrei" é uma típica canção carnavalesca, festiva e repleta de termos em francês e rimas divertidas. Inspirada em Aldir Blanc, que gostava de rimar com estas palavras.

"Mauro se inspira muito na tradição da nossa música, ele conversa muito com os grandes nomes, brinca com os ícones e trabalha em cima de pequenos detalhes, jogos de palavras, com muita sensibilidade. Ele se propõe a trazer sempre uma coisa nova, criativa e original, é um trabalho admirável, que se tornou um motor criativo para as melodias", diz Augusto.

Já "Infindo", faixa que tem o verso "A Beleza Precisa de Abrigo", que dá nome ao disco, brinca com a ideia do infinito, em um jogo de palavras, que conta com uma levada viajante e um arranjo vocal de diversas vozes, trazendo uma ideia de amplitude que tem tudo a ver com os versos. A música, já lançada previamente, também tem clipe no ar.

"Por se tratarem de canções bastante complexas em relação às letras, o processo de composição da melodia foi bastante cuidadoso. Essa coisa que o Mauro tem de tratar com carinho a nossa linhagem musical passa um pouco por ouvir esses autores e brincar de misturar, quase numa proposta tropicalista de encarnar o personagem, não no sentido da interpretação, mas da composição", completa Augusto.