Fábula ácida sobre o fazer artístico
Com texto e direção de Kiko Marques, espetáculo 'Sangue' propõe uma discussão sobre o poder e a dominação, a partir da história de dois atores
Até que ponto o poder e a dominação compõem a essência do ser humano e as relações sociais e de trabalho? O espetáculo "Sangue", escrito por Kiko Marques especialmente para os atores Carol Gonzalez, Leopoldo Pacheco, Marat Descartes e Rogério Brito, está em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil Rio de Janeiro (CCBB RJ), como parte das comemorações pelos seus 35 anos. Kiko Marques também assina a direção do espetáculo que já passou pelo CCBB SP, com grande sucesso de público e crítica, e ainda cumprirá temporadas no CCBB Belo Horizonte e CCBB Brasília.
A obra propõe uma discussão sobre o poder e a dominação, a partir da história de dois atores que, durante a montagem de um texto de um grande autor francês, já falecido, recebem a notícia da revogação de seus direitos autorais.
"A ideia foi criar um poema cênico, um mito sobre as inúmeras e insuspeitáveis formas de guerra e dominação do ser humano por outro ser humano; sobre a necessidade de possuir o outro, mas também sobre o verdadeiro pertencimento e a fraternidade que brota nos mais imprevisíveis campos", afirma o autor e diretor Kiko Marques.
"Sangue" surge a partir de um acontecimento similar ocorrido com parte da equipe da peça que, há alguns anos, teve um projeto artístico bloqueado por questões de direitos autorais. Kiko se inspirou no inconveniente da situação para falar sobre aspectos brutais da natureza humana. Como uma miniatura do mundo, os conflitos da peça espelham os conflitos que a própria sociedade atravessa.
"Falar sobre o poder e a dominação é revelar uma parte fundamental da essência das relações sociais humanas. No caso de 'Sangue', é tirar o véu com que se camuflam nas mais justificáveis intenções. É mostrar a verdadeira face da violência e da usurpação do outro", afirma.
Na trama, os franceses - detentores dos direitos da obra - montam uma armadilha para se apoderar do projeto dos artistas brasileiros, fazendo-os perder o domínio daquilo que eles próprios idealizaram. Assim, a peça também traz para o debate questões que envolvem a produção artística e os trabalhadores da cultura, mostrando um pouco dos bastidores, numa situação fictícia, mas que poderia muito bem ser verdade.
"Quis abrir a porta da nossa casa (os bastidores do teatro) ao olhar de quem não vive essa realidade, para que esse espectador pudesse conhecer, em parte, nossa 'aldeia' (como diria Tolstoi); conhecer as pessoas envolvidas com o fazer teatral, seus anseios, suas paixões, e reconhecer-se nelas", completa Kiko.
O texto também discute o olhar eurocêntrico e a violência de gênero, que aparece desde o início do relacionamento amoroso entre o diretor francês e a atriz brasileira.
A equipe criativa conta ainda com André Cortez na criação do cenário, Marichilene Artisevskis nos figurinos, Gabriele Souza no desenho de luz e Marcelo Pellegrini na música original. Kiko Rieser assina a direção de produção.
SERVIÇO
SANGUE
Centro Cultural Banco do Brasil Rio de Janeiro (Rua Primeiro de Março, 66 - Centro)
Até 10/11, de quinta a sábado (19h) e domingos (18h)
Ingressos: R$ 30 e R$ 15 (meia)