Responsável por apenas 0,6% do movimento portuário de Salvador, Estatal Federal cria cortina de fumaça para esconder irregularidades e fugir da Receita Federal
A imprensa baiana tem dado destaque a um episódio envolvendo a COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA- CODEBA que revela a ineficiência das estatais na área portuária no Brasil e expõe o descaso das seguidas gestões da empresa pública, hoje ocupada por um afilhado político do senador Jacques Wagner.
O Porto de Salvador é operado por empresas privadas por meio de concessão, porém uma pequena parte dele está na mão da estatal ligada ao Ministério de Portos e Aeroportos, comandado pelo deputado Silvio Costa Filho. Pertencem a estrutura da pasta a Infraero (Aeroportos) e as Companhias de Docas da Bahia -CODEBA, Docas do Ceará, Docas do Pará, Docas do Rio Grande do Norte, Docas do Rio de Janeiro e a Autoridade Portuária de Santos. Todas elas, remanescentes do processo de privatização que promoveu uma profunda alteração no sertões aeroportuário e portuário do país.
O caso mais crítico é a CODEBA, ironicamente, o porto mais antigo do Brasil já que Salvador, como a primeira capital do país, teve no setor portuário a sua primeira grande atividade econômica. Foi na Bahia, que Dom João VI abriu os portos brasileiros para as nações amigas e revolucionou o comércio internacional com a mudança da corte portuguesa para o Brasil.
Nos últimos anos, foi visível o encolhimento da importância da CODEBA para a economia baiana. Em 2024, só foram emitidas 70 DIs - Declarações de Importação. Uma média de seis operações por mês, ou seja, um pouco mais de uma por semana. A própria estatal tem emitido sinais do seu encolhimento se comparada com seus próprios números. Os dados atuais representam metade da operação de 2023 e 1/4 do movimento de 2022.
Em nota enviada a redação do jornal A TARDE, com o pedido formal de direito de resposta , a Receita Federal afirma "Nos últimos 5 anos, somente 0,6% das declarações de importação foram registradas nos recintos alfandegados da Codeba, em comparação com os demais recintos alfandegados. No que se refere às declarações de exportação, somente 1,5% foram registradas para mercadorias armazenadas nos recintos da Codeba".
Quando o movimento do porto estatal baiano é comparado com a iniciativa privada, a diferença é abismal. A concessionária TECON, e a Intermarítima somadas, as duas concessionárias privadas realizaram 2020 a 2024 e recintos alfandegados: 146.646 e a CODEBA apenas 904.
Segunda a nota da própria RFB o total de declarações de exportação no período de 2020 a 2024 foram 707 em recintos da CODEBA e nos demais recintos alfandegados: 53.236
Na prática, a estatal responde apenas por 0,6% do movimento portuário baiano. É exatamente a omissão deste número que induziu a imprensa e a própria Justiça Federal baiana ao erro. A direção da CODEBA resolveu abrir um conflito público com a Receita Federal do Brasil, já que estava ameaçada de perder o direito de alfandegamento na sua zona portuária pelas inúmeras irregularidades e omissões das suas gestões na questão da segurança e no atendimento das exigências legais. Apesar de ter reconhecido em nota oficial a existência acumulada dos problemas, a estatal baiana tentou criar um clima de comoção pública contra a RFB, alegando que a perda do direito, mesmo que de forma provisória, até que as irregularidades fossem sanadas, geraria com colapso na economia baiana. Este foi o teor do argumento que levou o juiz federal Cristiano Miranda de Santana a conceder a liminar suspendendo os efeitos do Ato Declaratório da Receita, de 22 de agosto de 2024, que determinava que em 22 de novembro haveria a suspensão do direito de alfandegamento.
Afirma o juiz na sentença: "Além disso, a suspensão das atividades aduaneiras no Porto de Salvador impacta diretamente a economia regional, prejudicando a logística de importação e exportação e gerando graves prejuízos a empresas e trabalhadores que dependem das operações do Porto. A manutenção da sanção administrativa antes do termo final do prazo, além de causar danos imediatos, compromete a efetividade e o resultado útil do processo, caso a parte autora viesse a obter decisão favorável ao final, pois não teria como restabelecer, em sua integralidade, os prejuízos decorrentes da suspensão determinada". Em nenhum momento, a CODEBA informou ao juiz federal que a sua atividade representa apenas 0,6 % do movimento de carga nos portos baianos e que a medida da Receita não atinge os concessionários privados que cumprem todas as exigências de segurança e controle cobrados pela Receita Federal.
Com a imprensa local aceitando como verdade a eminência de colapso dos portos baianos, sem que nenhum repórter fizesse as contas ou ouvisse a Receita Federal, a decisão judicial ganhou manchete na edição dominical do Jornal A TARDE, um dos mais tradicionais da imprensa baiana, que em seis colunas afirmava em letras garrafais: "Suspensão de alfandegamento nos portos federais é revogado".
A própria estatal firmou no apagar das luzes do prazo para assinar, um TERMO DE COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA TÉCNICA E OPERACIONAL DE ALFANDEGAMENTO (TCAC), anexado aos autos do processo judicial pela CODEBA e no qual é possível verificar que o atual presidente da estatal, Antônio Gobbo, firmou junto com o seu diretor Luiz Humberto Lisboa às 21h02 e 22h25 respectivamente. O prazo para assinar o TCAC, que permitia reduzir a multa, encerrava a meia noite.
Segurança Negligenciada
O endurecimento da Receita Federal, além de ser um dever de ofício dos atuais gestores, reflete a preocupação com a inclusão de Salvador na rota internacional de tráfico de drogas. Em menos de 30 dias, a Alfândega baiana foi aplaudida pela imprensa local e pela sociedade civil por duas grandes apreensões de drogas no porto. A última, somou quase uma tonelada de cocaína que estava sendo embarcada em um contêiner de minério para o porto de Antuérpia na Bélgica. Só foi possível a identificação da anormalidade na carga pelas normas de segurança exigidas por lei e seguidas pelo operadores privados. Na anterior, houve o ingresso de bandidos no terminal e a prisão em flagrante deles na própria área portuária. Tudo apurado pelos registros automático de placas, câmaras de vigilância, raio X de carga, enfim, de normas que até hoje a CODEBA não adotou e que transforma o terminal federal em um queijo suíço, cheio de lacunas as quais favorecem a atuação do crime organizado.
Irregularidade contínuas
Apesar de reconhecer as irregularidades da Companhia, tanto no TAC, como na nota oficial que assinou, o atual presidente Antônio Gabo, indicado pelo Senador Jacques Wagner, e que assumiu o cargo há menos de um ano, preferiu construir uma cortina de fumaça e politizar as irregularidades que herdou dos gestores anteriores a quem ameaça processar na nota oficial que distribuiu para a imprensa, onde afirma : "Ressaltamos que gestores anteriores, cujas ações ou omissões contribuíram para a situação atual, serão responsabilizados conforme prevê a legislação vigente." Só a atual gestão parece querer colocar acima das exigências legais e de segurança, tentando levar a ideia de que a ação da Receita causará um colapso na economia baiana, omitindo que a operação federal responde por meio por cento do movimento portuário soteropolitano. Nos bastidores, Gabo tem revelado que este estardalhaço na mídia irá ajudá-lo a conseguir liberação de verbas com o ministro Silvio Costa para sanar as graves irregularidades da estatal.
A AGU - Advocacia Geral da União irá apresentar a posição oficial da Receita Federal e apresentar as fundamentações contra os argumentos da Estatal, que há anos vem sendo multada diariamente em R$ 10 mil pelas irregularidades cometidas.
Posição da CODEBA
"Autoridade Portuária da Bahia esclarece sobre possível suspensão de alfandegamento
A Autoridade Portuária da Bahia - CODEBA informa que, desde a notificação da possibilidade de suspensão do alfandegamento dos Portos Federais da Bahia em agosto deste ano, por problemas pendentes de solução há mais uma década, não resolvidos por sucessivas gestões passadas, iniciou imediatamente um diálogo com a Receita Federal para buscar soluções. Uma força-tarefa foi criada para cumprir os acordos necessários e garantir a manutenção das operações.
Desde que assumiu a gestão em dezembro de 2023, a atual Diretoria vem implementando melhorias substanciais nos controles de acesso, vigilância, monitoramento e segurança dos portos. Antes mesmo da notificação da Receita Federal, a CODEBA já havia iniciado reparações de problemas históricos, com décadas de existência. Além disso, a atual gestão mantém reuniões frequentes com a CESPORTOS (Comissão Estadual de Segurança Pública nos Portos), Receita Federal e Polícia Federal, com o objetivo de alinhar ações e elevar o nível de segurança e eficiência operacional.
Estão previstas no cronograma orçamentário de 2025, inclusive, contratações de sistemas complementares de vigilância, monitoramento e integração fiscal, terrestres e aquáticos dentre os mais avançados disponíveis.
Essas medidas buscam tornar os portos da Bahia mais competitivos e alcançar selos internacionais de certificação. O impacto positivo já pode ser percebido, com um aumento no volume de cargas e novos negócios, como a recente inauguração da rota transoceânica Brasil - China, conectando diretamente a Baía de Todos-os-Santos ao mercado asiático.
No entanto, a suspensão do alfandegamento, caso ocorra, representará um grande prejuízo para a economia do Estado e do país. A redireção de cargas para outros portos pode causar um revés significativo para a economia baiana.
Importante frisar que o problema remonta a 2011, quando gestões anteriores foram alertadas sobre a necessidade de melhorias, mas não tomaram as medidas necessárias. A atual Diretoria da CODEBA está empenhada em solucionar as questões pendentes, mas as restrições administrativas da gestão pública limitam a velocidade das implementações.
Por fim, a CODEBA considera que a decisão de suspensão é intempestiva, visto que a CODEBA está adimplente com as medidas acordadas com a SEF, que correm dentro do prazo, e adotará todas as medidas judiciais, legais e administrativas para buscar sua reversão, solicitando um prazo adequado para concluir as melhorias necessárias. Ressaltamos que gestores anteriores, cujas ações ou omissões contribuíram para a situação atual, serão responsabilizados conforme prevê a legislação vigente".
Posição da Receita
"O cumprimento das normas de alfandegamento pelos recintos aduaneiros autorizados a operar no comércio exterior visa garantir a segurança do controle das importações e exportações brasileiras, inclusive como forma de coibir o tráfico internacional de armas e drogas.
No caso da Companhia das Docas do Estado da Bahia (Codeba), a suspensão dos recintos alfandegados tem impacto restrito, se resumindo exclusivamente às operações realizadas em suas dependências.
A medida não interfere nas operações de importação e exportação de mercadorias nos portos de Salvador e Aratu, cujas cargas são, majoritariamente, armazenadas nos demais recintos alfandegados administrados por terceiros e instalados dentro ou fora da área portuária.
Nos últimos 5 anos, somente 0,6% das declarações de importação foram registradas nos recintos alfandegados da Codeba, em comparação com os demais recintos alfandegados. No que se refere às declarações de exportação, somente 1,5% foram registradas para mercadorias armazenadas nos recintos da Codeba (ver dados abaixo).
A adequação às normas de segurança exigidas como requisitos de alfandegamento vem sendo cobrada pela Receita Federal junto à Codeba ao longo dos últimos anos, por meio de processos administrativos, que incluem intimações, diligências, aplicações de penalidades de advertência, apreciação de recursos da Codeba, entre outros.
Como a questão relativa ao saneamento de irregularidades não foi resolvida por sucessivas gestões do órgão portuário, a Receita Federal, informou, em atos declaratórios publicados no Diário Oficial da União, de 23 de agosto de 2024, que, caso fossem mantidas as condições de descumprimento das normas exigidas, ocorreria a suspensão dos recintos aduaneiros da Codeba, nos portos de Salvador e Aratu, a partir de 22 de novembro de 2024.
A Receita Federal esclarece que as exigências feitas são estabelecidas em legislação e se referem especificamente a requisitos essenciais de segurança (Lei 12.350/2010 e Portaria RFB n° 143/2022).
Tais normas são devidamente observadas pelos demais recintos alfandegados que operam nos portos de Salvador e Aratu e que seguirão, normalmente, com suas atividades relacionadas às cargas de mercadorias provenientes ou destinadas ao exterior.
OPERAÇÕES DE IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO NA BAHIA
Total de declarações de importação no período de 2020 a 2024:
Recintos da Codeba: 904
Demais recintos alfandegados: 146.646
Total de declarações de exportação no período de 2020 a 2024:
Recintos da Codeba: 707
Demais recintos alfandegados: 53.236".