Presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) antes da rápida passagem de Edson Fachin, seguido por Alexandre de Moraes, foi quem Luís Roberto Barroso quem estruturou a Justiça Eleitoral para as eleições do ano passado. Quem primeiro criou as condições para reagir aos ataques e às suspeitas do então presidente Jair Bolsonaro e seus seguidores quanto ao sistema eletrônico de votação. Na gestão de Barroso à frente do TSE, foram criadas as campanhas contra fake news e desinformação. Por isso, os juristas ouvidos pelo Correio da Manhã avaliam que esse deverá ser um dos seus principais pontos agora à frente do Supremo Tribunal Federal. “Creio que Barroso complementará o que ainda é necessário fazer na regulamentação do combate às fake news”, avalia o advogado e ex-ministro do TSE Joelson Dias.
Barroso tomará posse como novo presidente do STF na quinta-feira (28). Assume também a presidência do Conselho Nacional de Justiça (CN). A posse está marcada para as 16h, com a ilustre presença da cantora Maria Bethânia, convidada por Barroso para cantar na cerimônia o Hino Nacional. O novo presidente do STF substituirá Rosa Weber, que se aposentará no próximo dia 2 de outubro, quando completará 75 anos. Como vice-presidente, assumirá Edson Fachin.
“A questão da desinformação, das fake news, é uma grande preocupação de Barroso. A legislação quanto a isso já ganhou normas importantes, mas ainda precisa ser aperfeiçoada. E creio que Barroso pautará muito essa necessidade”, considera Joelson Dias.
Nesta segunda-feira (25), Barroso discursou na abertura da 38ª Conferência Hemisférica da Federação Interamericana de Empresas de Seguros (Fides), no Rio de Janeiro. Em seu discurso, Barroso disse que pretende garantir a segurança jurídica, já que ela “é decisiva para que se crie um bom ambiente de negócios”.
Ele também declarou que suas prioridades serão: “Combate à pobreza, desenvolvimento econômico e social sustentável, prioridade máxima para a educação básica, investimento relevante em ciência e tecnologia, investimento relevante em saneamento básico em habitação popular”.
Análise
Em entrevista ao Correio da Manhã, o advogado e analista político Melillo Dinis considera que Barroso deve focar nas pautas econômicas. “Como ele tem dito, haverá uma série de discussões que impactarão nas contas públicas e também nas questões econômicas de um país que já vive em sobressalto por conta do desequilíbrio fiscal”, disse o analista.
Em contrapartida, Melillo considera que o magistrado deve ir congelando aos poucos algumas pautas de costumes, como a pauta indígena ou a questão da descriminalização do aborto, temas que ganharam prioridade nos últimos dias de Rosa Weber à frente do STF.
A ex-vice-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Pernambuco e professora de Direito Constitucional da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), Adriana Rocha, ressaltou que Barroso “já demonstrou há muito tempo quais são as suas bases argumentativas em torno das questões relacionadas à interpretação da Constituição e à aplicação de princípios constitucionais”.
“O que eu observo é que o ministro tem muito conhecimento jurídico em relação aos seus argumentos, mas que não podemos esperar dele só pautas avançadas. Ele em algumas situações parece ser também bastante rigoroso nessa questão das argumentações utilizadas no Supremo Tribunal Federal para superar ausências legislativas ou ausências normativas, e ele pode ser considerado em alguns pontos até conservador e a favor do Estado em pautas onde estejam o Estado versus o indivíduo. A sua preocupação parece estar bem arraigada na sua formação”, ponderou a advogada.
Luiz Roberto Barroso tem mestrado na Universidade de Yale (EUA) e pós-doutorado na Universidade de Harvard (EUA). Segundo Adriana Rocha, a formação acadêmica e os livros de Barroso “já mostravam o afeto do ministro pela democracia e também pelo liberalismo”.
“Ele tem uma visão de respeito muito grande a autonomia individual que vem influenciando alguns dos seus votos mais polêmicos”, completou a também ex-conselheira federal.
Direitos fundamentais
Para Joelson, o perfil de Barroso deverá fazer com que ele busque centrar o STF na defesa dos direitos fundamentais e da democracia. “Ainda vivemos em um país muito dividido, no qual essas questões ainda não foram totalmente pacificadas”, considera o advogado.
Nesse sentido, há mesmo o risco de algumas disputas política e entre poderes. Em julho, em uma cerimônia na União Nacional dos Estudantes (UNE), Barroso deu uma declaração polêmica, provocado pela plateia. Respondeu: “Nós derrotamos o bolsonarismo”, reforçando a ideia de uma condução política do TSE e do STF. “Sem dúvida, foi uma declaração infeliz”, reconhece Joelson. “Mas que foi superada. Não acredito que vá gerar repercussão agora”. Para Melillo Dinis, Barroso terá que “economizar nas palavras”, visto que tem um perfil contrário ao de Rosa Weber, marcado pela discrição.
Da mesma forma, Joelson considera que não mais deverá prevalecer na condução de Barroso um apoio no passado que ele pareceu dar à Operação Lava Jato. Para Joelson, quando ficou claro que havia um projeto político por trás das ações do ex-juiz e hoje senador Sergio Moro (União-PR), esses posicionamentos acabaram revertidos.
Melillo Dinis considera que, dentre os desafios que o magistrado deve enfrentar em sua gestão, está a própria união da Corte. “Barroso tem feito um grande esforço de integrar o Supremo em torno de decisões as mais majoritárias possíveis. Isso significa o desafio, que é muito grande, de transformar as onze ilhas que formam o Supremo em um pequeno arquipélago de interesses, articulações e resultados”, pontua.