Política brasileira acompanha de perto eleição argentina
Direita enxerga ressurreição. Esquerda e governo preocupam-se com resultado e relações com o país
No meio da confusão, uma adolescente perdeu-se de sua mãe na multidão, assustou-se e começou a passar mal. Um grande contingente de apoiadores acompanhou o voto do candidato de extrema-direita Javier Milei, neste domingo, em Buenos Aires, na Argentina. Gritos, palavras de ordem, discussões, bate-boca. Até um coro de “Parabéns para Você” {Milei completou no dia da eleição 53 anos].
A mistura de militância ardorosa com propensão à confusão traduz bem as chances de Javier Milei no pleito argentino. As eleições no país vizinho foram concluídas às 18h. Até o fechamento desta edição, ainda não se sabia o resultado. Pesquisas recentes, porém, apontam Milei como o favorito, para passar ao segundo turno com um de outros dois candidatos – o ministro da Economia, candidato peronista Sergio Massa, e a candidata de centro-direita Patricia Bulrich, ligada ao ex-presidente argentino Mauricio Macri – ou mesmo para vencer no primeiro turno.
Como aconteceu no momento em que foi votar na Universidade Tecnologica Nacional, no bairro de Almegro, na capital argentina, as emoções com relação a Javier Milei não são neutras. Entre outras promessas de campanha, Milei promete dolarizar a economia argentina, tirar seu país do Mercosul e romper relações comerciais com a China, hoje principal parceiro, e com o Brasil, o maior parceiro do continente. De extrema-direita, Milei não admite relações com países de esquerda, como Brasil e China.
Redenção
Da mesma forma, no Brasil suas possibilidades despertam o mesmo tipo de emoção e de divisão. Para a direita brasileira, depois da derrota do ex-presidente Jair Bolsonaro nas eleições do ano passado, seria a possibilidade de redenção dos grupos mais conservadores. Há quatro anos, quando Bolsonaro tornou-se presidente, a direita governava dez países no continente. Hoje, governo somente três: Paraguai, Uruguai e Equador. A direita brasileira avalia a chance de uma recuperação a partir da Argentina, especialmente se, no Estados Unidos, Donald Trump conseguir retornar nas eleições no ano que vem.
O deputado Eduardo Bolsonaro (PL-RJ) viajou para a Argentina para acompanhar o pleito de perto. Ele foi acompanhar de perto a eleição de um candidato a deputado do mesmo partido de Milei, La Libertad Avanza, Nahuel Sotelo. “Acho que Milei ganha no primeiro turno”, previu Eduardo Bolsonaro.
Preocupação
Da mesma forma, a esquerda brasileira acompanhou de perto as eleições. O PT e o Psol mandaram representantes à Argentina. Na quinta-feira (19), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já reconhecia a preocupação.
“É natural que eu esteja [preocupado]. Uma pessoa que tem como uma bandeira romper com o Brasil, uma relação construída ao longo de séculos, preocupa. Em geral, nas relações internacionais, você não ideologiza a relação”, disse Haddad.
Rompimento
Independentemente das posições ideológicas, a possibilidade rompimento da relação com a Argentina é a grande preocupação brasileira. A Argentina é o terceiro principal destino das exportações brasileiras. Em contrapartida, o Brasil é o maior importador de produtos argentinos. Em 2022, foram US$ 15,3 bilhões em exportações do Brasil para a Argentina, e US$ 13,1 bilhões de importações pelo Brasil de produtos argentinos.
A crise argentina, com uma inflação anual de 140%, já vinha afetando os resultados desse comércio entre os dois países, independentemente da escolha que foi feita nas eleições. Em dez anos, esse fluxo comercial experimentou uma queda de 15%. Uma eventual vitória de Milei, porém, transformaria a tendência de piora nessas relações em um fato consumado.
Um rompimento total impactaria principalmente alguns setores da economia tanto brasileira quanto argentina, como o agronegócio, a indústria têxtil e a indústria automotiva.
(Com Agência Folha)