O AVC muitas vezes não dá avisos prévios. Tome cuidado com ele

Conheça a história de Daniella Pina, sobrevivente de três AVCS, doença que mais mata no mundo

Por Gabriela Gallo

"Estou seguindo minha vida, com meus filhinhos do lado, apesar das dificuldades dos AVCs", diz Daniella

No dia 4 de março de 2022, a filha da funcionária pública Daniela Pina nasceu. Mas o que deveria ser um dos dias mais felizes da sua vida foi o começo de uma sofrida jornada médica. Uma semana após o nascimento da filha caçula, Daniela sofreu três Acidentes Vaculares Cerebrais (AVCs). De acordo com o Ministério da Saúde, um AVC acontece “quando vasos que levam sangue ao cérebro entopem ou se rompem, provocando a paralisia da área cerebral que ficou sem circulação sanguínea”. Neste domingo, 29 de outubro, foi o Dia Mundial do AVC, data voltada para a conscientização e prevenção do acidente.

Daniela foi uma sobrevivente, já que um AVC pode gerar graves sequelas e levar à morte. E a tendência e o número de pessoas que tiveram algum episódio aumenta. Um estudo recente publicado na revista The Lancet Neurology, renomada revista científica britânica, aponta que os casos da doença devem aumentar em 47% em todo o mundo. Em 2020, 6,6 milhões de pessoas morreram de AVC no planeta. Para 2050, as projeções indicam que esse número deve saltar para 9,7 milhões.

Sintomas

Os primeiros sintomas de Daniela foram dores de cabeça muito intensas. Mas como, na época, ela estava em um período de pós-parto, resolveu não ir logo ao hospital. Quem a convenceu do contrário foi sua mãe. “Eu nem sabia o que era um AVC. Se a minha mãe não estivesse comigo no meu pós-parto, eu ia ser daquelas pessoas que perde movimento, que perde fala, que fica surda, porque eu não iria identificar. Na minha cabeça, eu só estava muito cansada, exausta”, relatou ao Correio da Manhã.

A funcionário pública contou que, em um momento no pós-parto, a mãe a questionou se ela estava conseguindo descansar. E ela não conseguiu responder. “Na minha cabeça, eu falei normal. Só que minha mãe falou que eu não falei nada, que eu soltei uns barulhos irreconhecíveis”, disse.

A alteração da fala é um dos principais sintomas de alguém que está tendo um AVC. O neurocirurgião Victor Hugo Espíndola detalhou à reportagem que outros sintomas são “perda de movimento de um lado do corpo, alteração do equilíbrio e confusão mental”.

“[Esses sintomas] são súbitos. A gente tem casos mais raros em que o paciente pode ter alguns desses sintomas mais leves e depois ir se intensificando. Mas normalmente não é assim. Normalmente, os sintomas são abruptos e começam de uma hora para outra”, ele completou.

Daniela deu entrada na emergência e após uma série de exames e chegou o resultado: síndrome de vasoconstrição cerebral reversível (SVCR). A doença é uma condição rara caracterizada por um início abrupto de dor de cabeça severa e o estreitamento segmentar das artérias cerebrais. “Não tenho mais risco de ter outro AVC por essa síndrome”, comemorou Daniela.

Daniela também contou que ficou com o lado esquerdo do corpo paralisado. Após um ano e sete meses em uma rotina intensa de reabilitação e fisioterapia, ela conseguiu voltar a movimentar o lado esquerdo do corpo, mas não totalmente. “A força do meu braço esquerdo não é a mesma. Tanto que eu não consigo segurar minha filha com o braço esquerdo e nem pegar nada muito pesado porque eu não consigo segurar”.

Quem me olha pensa: ‘Nossa, ela está ótima, ela não teve nada’. Só que eu fiquei bem mais lenta. Meu potencial de entender as coisas não é o mesmo. Para eu ler um livro, eu consigo ler uma página em uma média de seis minutos. Com o AVC, eu adquiri déficit de atenção. Eu faço várias coisas no mesmo dia, mas picadinho. Chega na hora em que eu vou deitar, eu começo a lembrar o que deixei de fazer pela metade e isso é frustrante demais”, detalhou à reportagem.

Tratamento

Daniela afirmou que as vezes considera “o pós-AVC mais doloroso do que viver o momento do AVC”. Atualmente, ela está afastada do trabalho para conseguir recuperar suas funções cognitivas e suas funções executivas. “Eu estou tentando recuperar isso para ver se as minhas funções executivas melhoram, como a memória, a atenção, reter informação. As palavras me fogem, não consigo conversar ainda temas muito profundos, mas eu estou cada dia melhor”, contou.

A Lei nº 8.112/1990 determina que todo funcionário público tem o direito de se ausentar dois anos para se recuperar da doença. E ela corre contra o tempo para retornar o trabalho e conseguir voltar ao serviço e não pegar a aposentadoria proporcional. “Eu estou usando o máximo [de tempo] que eu posso para me reabilitar, porque eu não posso me aposentar, porque a minha aposentadoria seria proporcional. O meu trabalho é muito intelectual. Por isso que eu estou bem disciplinada com essa minha reabilitação cognitiva”.

Dentre os tratamentos, ela faz reabilitação no hospital, terapia ocupacional, natação de reabilitação e musculação todos os dias. Durante seu tratamento, Daniela desenvolveu bipolaridade, então ela também realiza acompanhamento de psicoterapia e com psiquiatra, já que ela faz uso de medicamento. Além disso, ela também faz acompanhamento com uma neuropsicóloga, para trabalhar a cognição.

E, mesmo com todas essas dificuldades, Daniela é muito por seguir viva. “Graças a Deus, eu estou seguindo com a minha vida, meus filhinhos aqui do lado”, vibra a sobrevivente.

Prevenção

A principal recomendação para se prevenir contra um possível AVC é ter um estilo de vida saudável. “As pessoas têm que ter consciência de que até 80% dos AVCs podem ser evitados. E a gente consegue isso com bons hábitos de vida. Então, controlando pressão, diabetes, obesidade, evitando o sedentarismo, interrompendo tabagismo. Bons atos de vida conseguem evitar a grande maioria dos casos de AVC”, destacou o neurocirurgião Espíndola.

E ele enfatiza para as pessoas ficarem atentas aos sinais, já que atualmente o AVC é a principal causa de mortalidade no Brasil e no mundo. “Muitas vezes, a gente não consegue tratar esse AVC em tempo hábil. Ou seja, por falta de tratamento disponível, esse recurso ainda não está disponível em larga escala, sobretudo na medicina pública. Estamos falando de saúde pública, a gente tem que se concentrar mais com isso”, disse o médico.