Crise climática só deve piorar nos próximos anos, dizem cientistas

Especialistas apontam piora do cenário de riscos para a próxima década

Por

Rio de Janeiro vem sofrendo com os fortes alagamentos desde a última semana

Por Luciana Coelho (Folhapress)

A percepção de riscos globais para os próximos dez anos se deteriorou significativamente ao longo dos últimos meses, e as crises do clima e do ambiente encabeçam a lista de problemas, mostra um relatório sobre o tema.

Segundo a 19ª edição do Global Risks Report, produzida pelo Fórum Econômico Mundial com o grupo Zurich de seguros e a consultoria Marsh McLennan, 63% dos especialistas preveem um cenário "tempestuoso" (com "riscos catastróficos à espreita") ou "turbulento" ("reviravoltas e risco elevado de catástrofes globais"). No ano passado, essas eram as expectativas de 54% dos entrevistados.

Em contrapartida, a percepção de riscos no curto prazo (dois anos) melhorou após três anos de pandemia, mais de dois de guerras e variadas escaramuças comerciais e econômicas. São 30% os que classificam como tempestuoso ou turbulento o cenário de curto prazo, ante 82% os que o faziam no ano passado, no auge da Guerra da Ucrânia e das tensões entre EUA e China.

Foram ouvidos durante setembro 1.400 analistas de risco, líderes políticos e lideranças industriais para o levantamento, lançado às vésperas do encontro anual do fórum, que ocorre na próxima semana em Davos, na Suíça. Para 54% deles, o cenário é de insegurança ("instabilidade e risco moderado") nos próximos dois anos, um contingente que cai para 29% quando a pergunta se refere a dez anos.

Apenas 15% esperam estabilidade ("perturbações isoladas e baixo risco de catástrofe") no biênio, e 8%, na década. Os que vislumbram um horizonte "calmo" ("risco insignificante") são apenas 1% para ambos os períodos. No ano passado, 9% anteviam calmaria em dez anos, e 11%, estabilidade.

Os eventos climáticos extremos (secas, inundações, tempestades, furacões, degelo, nevascas etc) são a principal preocupação imediata e também o risco mais grave no cenário de dez anos, mostra o relatório.

Na terça-feira (9), o Serviço Copernicus de Mudança do Clima, da União Europeia, oficializou 2023 como o ano mais quente da história, e aferiu um aumento de 1,48°C na temperatura global em 250 anos, no limite do que cientistas e diplomatas fixaram como patamar máximo para lidar com a crise - o que ilustra a dificuldade de contê-la.

Estão relacionados ao clima e ao ambiente os quatro riscos mais citados para a década, como a escassez de recursos naturais e a perda de biodiversidade.

Em um indício dos temores que se avolumam com a campanha eleitoral americana deste ano, dado o histórico dos últimos ciclos somado à popularização das ferramentas de inteligência artificial, a desinformação foi o problema mais citado no curto prazo, seguida pelos eventos climáticos extremos.

Esse item aparece apenas em quinto lugar no cenário de dez anos, mas é imediatamente seguido pelos efeitos adversos da IA, que não consta na lista mais iminente.

A "confrontação geoeconômica" - uma forma de descrever os atritos entre EUA e China - nem sequer está nas listas deste ano, talvez um sinal de que tenham sido naturalizadas ou de fato o pragmatismo prevaleça. No relatório anterior, eram o terceiro maior problema no curto prazo e o nono no longo.

O relatório também chama a atenção para as mudanças demográficas, seja nas migrações forçadas ou na alteração da estrutura populacional, com aumento da proporção de idosos. É um problema que o Brasil confrontará nos próximos anos com o fim do chamado "bônus demográfico" (quando a população economicamente ativa é grande o suficiente para absorver os custos da população inativa). Ainda assim, alguns efeitos já podem ser vislumbrados no presente, como as fortes chuvas, as ondas de calor escaldante cada vez mais frequentes e afins. É um problema de urgência que merece ser tratado com a devida atenção.

Por fim, surge a preocupação com mudanças "geoestratégicas", que é como o documento descreve as novas relações políticas, comerciais e financeiras entre os países, além da concentração e distribuição de recursos. A fricção EUA/China, os alinhamentos a partir da Guerra da Ucrânia e as novas alianças derivadas do avanço do nacionalismo alimentam esse risco.

Tais tendências, alerta o relatório, devem ser catalisadas pela tecnologia (notadamente a IA) e, assim, fomentar novos riscos de segurança.