Reconhecimento facial garante a segurança em estádios
Tecnologia, que será obrigatória, tem auxiliado até a encontrar pessoas desaparecidas
Com os avanços tecnológicos, a biometria digital e facial tornou-se uma ferramenta cada vez mais comum para simplificar o acesso a bancos, edifícios e empresas. Desde 2023, entrou em vigor a Lei 14.597/2023, também conhecida como Lei Geral do Esporte, que tornou obrigatório o uso de reconhecimento facial nas catracas para acesso dos torcedores em arenas esportivas.
Segundo a legislação, arenas esportivas com capacidade para mais de 20 mil pessoas devem implementar sistemas de monitoramento e identificação biométrica até 2025. Os estádios que já adotaram essa tecnologia são o Allianz Parque, da Sociedade Esportiva Palmeiras, em São Paulo, e o Hailé Pinheiro, do Goiás Esporte Clube, em Goiânia (GO).
Clubes como Vasco e Atlético Mineiro estão nos estágios iniciais do desenvolvimento dessa tecnologia em seus estádios, assim como outros como a Arena Fonte Nova, em Salvador (BA); Ilha do Retiro, em Recife (PE), e o Maracanã, no Rio de Janeiro.
Vantagens
Desde março de 2023, o Allianz Parque, que é administrado pelo Palmeiras, adotou o uso da biometria facial durante os jogos do time. Segundo a gestão do clube, o uso da tecnologia vai além da agilidade na venda de ingresso, impedindo ainda a venda irregular de ingressos de jogos do Palmeiras.
A administração do clube explicou que após um ano de implementação, a biometria no estádio tem apresentado resultados positivos, reduzindo o tempo de espera para os torcedores e registrando apenas um índice de falha no sistema de 2,5%.
Além disso, o clube fez uma parceria com a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP). O Palmeiras compartilha os dados dos compradores de ingressos com a secretaria e. a partir dessas informações, o órgão analisa e retorna ao clube uma lista com os nomes de indivíduos que possuem pendências judiciais.
O resultado da parceria incluiu a captura de 39 indivíduos procurados pela Justiça com mandados de prisão em aberto. Além disso, o sistema também contribuiu para localizar 275 pessoas reportadas como desaparecidas, identificou 56 indivíduos que violaram medidas judiciais, detectou 12 casos de uso de documentos falsos e impediu a entrada de cinco torcedores de acordo com o estatuto do torcedor. Ao todo, mais de 200 mil torcedores foram submetidos à fiscalização.
Proteção de dados
O advogado e especialista em ciências criminais Berlinque Cantelmo explica que, apesar da tecnologia de reconhecimento facial em locais públicos, como estádios de futebol. facilitar a resolução de crimes nesses locais, existem questões éticas que devem ser consideradas.
"Uma das maiores preocupações éticas é uma possível incongruência nas imagens, sobretudo do ponto de vista de pixelização e nitidez, onde a resolução precisa estar condizente com uma análise própria de fisionomia para que as autoridades não sejam levadas a equívocos graves correlacionados a reconhecimentos faciais ou reconhecimentos legais, de acordo com o que prevê, inclusive, o Código de Processo Penal", afirma.
Cantelmo explica que o grande desafio no uso da tecnologia é, de fato, garantir que as plataformas, os softwares, as ferramentas e os mecanismos de captação de imagem sejam utilizados de fato para a segurança pública. “É preciso que estejam de acordo com parâmetros de resolução adequados para uma identificação precisa, tanto em ambientes com grandes aglomerações de pessoas como em situações legais. O cumprimento das regulamentações, como a Lei Geral de Proteção de Dados, é essencial para garantir a utilização ética e eficaz dessa tecnologia."
Instituída em 2018, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) foi estabelecida para proteger os direitos fundamentais de privacidade e liberdade individual, regulando o tratamento de dados pessoais em meios físicos e digitais. Ela define agentes de tratamento, como controladores, operadores e encarregados, responsáveis por garantir a transparência e segurança no manuseio de informações.
O especialista explicou que apesar do uso de imagem e proteção de dados levantar preocupações relevantes, é necessário ponderar o caso. “É claro que, nessas circunstâncias, o interesse privado será atenuado se o interesse público estiver em um nível superior, especialmente diante de eventos que requerem medidas de segurança pública, como o registro de ocorrências policiais ou investigações criminais. O reconhecimento facial pode ser uma ferramenta eficaz para remover das ruas fugitivos e indivíduos procurados pela justiça”.
Cantelmo sugere que os órgãos de segurança pública e as autoridades responsáveis pelos estádios poderão colaborar para garantir que exista um banco de dados que alimente o sistema de reconhecimento facial. "Os órgãos de segurança pública podem compartilhar seus bancos de dados contendo registros faciais e informações sobre infratores e criminosos habituais. Isso permitirá que as administrações dos estádios comparem instantaneamente as imagens capturadas com aquelas fornecidas pelos órgãos de segurança. É essencial equilibrar a proteção dos direitos individuais com o interesse público na segurança dos eventos esportivos. E é crucial que os direitos individuais dos torcedores sejam ajustados para garantir a primazia do interesse público”, explica.
Estádio Seguro
Em entrevista ao Correio da Manhã, Luciano Paciello, diretor executivo do Goiás, detalhou os efeitos da implementação da biometria facial no estádio Hailé Pinheiro, conhecido como Serrinha, pelos torcedores alviverdes. A arena esportiva se tornou uma precursora na adoção dessa tecnologia, aplicando-a em todas as catracas em novembro de 2022, durante uma partida contra o Corinthians, pelo Brasileirão.
O Serrinha, pioneiro no Brasil, integra o projeto Estádio Seguro, uma colaboração com a Confederação Brasileira de Futebol (CBF). O projeto busca combater o racismo e a violência nos estádios, utilizando tecnologias para identificar torcedores envolvidos em incidentes de violência e coibir a atuação de cambistas.
Paciello conta que a ideia de adotar o reconhecimento facial surgiu em 2019, por iniciativa do então conselheiro do Goiás e presidente do clube na gestão 2021/2023, Paulo Rogério Pinheiro, e de seu filho Lucca Pinheiro, estudante de engenharia de computação. “O ex-presidente já contava com larga experiência no controle de acessos de grandes públicos e, por 15 anos, foi proprietário de uma das maiores empresas de bilheteria do país. Com isso, resolveram colocar a ideia em prática no Goiás Esporte Clube e, em 2021, fundaram a TIK+ Tecnologia em Eventos para realizar todo o processo”, conta.
Segundo o diretor-executivo, a catraca de reconhecimento facial representa um avanço na segurança dos torcedores desde o momento em que deixam suas casas até chegarem ao estádio. “A adesão dos órgãos de segurança pública fortaleceu o ciclo de segurança, eliminando conflitos, roubos, venda de drogas e outras atividades ilícitas dentro e fora do estádio Hailé Pinheiro”, explicou.
Com a integração de 146 câmeras e um banco de dados robusto, os problemas de segurança foram praticamente erradicados, segundo Paciello, resultando na exclusão de aproximadamente 1,2 mil torcedores impedidos de entrar por questões de justiça.
*Sob supervisão de Mia Andrade