Por: Adryel Oliveira

Crise climática: o país ainda pode se proteger?

Incêndios no Pantanal, cheias no Sul, seca no Norte. O que acontece com o clima? | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O ano de 2024 tem sido de extrema preocupação no âmbito climático e para os biomas brasileiros. A seca precoce no norte do país, por exemplo, está impactando severamente os deslocamentos de moradores da região Norte, além de impactar diretamente na economia dos estados que dependem das vias fluviais para manterem sua economia e atividades.

A situação é agravada pelo El Niño, que diminuiu as chuvas na região, afetando severamente o nível dos rios. Previsões indicam que mesmo chuvas acima da média não serão suficientes para a recuperação rápida.

Nos últimos quatro meses, o Amazonas enfrentou sua pior seca já registrada, causando danos significativos à população e ao meio ambiente. A estiagem histórica resultou na diminuição severa dos níveis dos rios, levando à morte de animais e afetando cerca de 637 mil pessoas, conforme a Defesa Civil estadual. A seca contribuiu para aumentar os incêndios florestais e teve impactos socioeconômicos profundos com perdas estimadas em R$ 1 bilhão. A crise hídrica também aumentou problemas de saúde e alimentares, afetando comunidades ribeirinhas que dependem dos rios. O que espanta é que, no início do ano, algumas dessas regiões, como no Acre, viviam algumas das mais graves enchentes da sua história.

No primeiro semestre de 2024, o Pantanal enfrentou sua pior crise de incêndios registrada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). O fogo consumiu 700 mil hectares do bioma, a devastação é quase seis vezes maior que a cidade do Rio de Janeiro. Especialistas atribuem a antecipação da temporada de fogo à longa estiagem e mudanças climáticas. Isso tudo aponta para um perigoso descontrole ambiental.

Gravidade

Marcos Woortmann, ambientalista do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), alerta sobre a gravidade desses eventos. “A questão dos incêndios florestais causa prejuízos de imediato a longo prazo. Inicialmente, na perda da biodiversidade, que demora muito tempo para se recuperar, em alguns casos também a degradação artificial causada por incêndios por ação humana, propiciam também invasões biológicas de espécies exóticas”, explica.

O especialista destaca o impacto em larga escala desses fenômenos, que são sentidos em todo o Brasil. “Especialmente no Planalto Central, no Cerrado e no Pantanal, há a diminuição da superfície de água, no caso há uma média de diminuição da superfície de água nos últimos 30 anos entre 50% e 60%, o que é extremamente grave. Estamos falando de áreas do Cerrado que gradualmente começam a se tornar semiáridas e áreas de Pantanal que começam também a perder superfície de água e se reconfigurar em outras vegetações que não a original do Pantanal”, ressalta.

Deserto

Nesta quarta-feira (3), Mato Grosso do Sul enfrentou um clima semelhante ao de deserto, com índices de umidade relativa do ar entre 10% e 20%, segundo dados da Climatempo. Corumbá (MS), cidade afetada pelos incêndios no Pantanal, registrou apenas 16% de umidade, considerado um nível crítico.

Woortmann ainda fala sobre a possibilidade de reverter esse cenário. “É um processo que vai demorar muito tempo. O governo federal tem contratado novas brigadas de incêndio, o que é muito importante, utilizado aviões para lançamento de água em áreas de incêndio, mas sabemos que estamos combatendo os efeitos de um projeto de ocupação que, na verdade, tem um componente, inclusive cultural, muito forte na história do Brasil”. O ambientalista destaca que é necessário um engajamento muito maior dos entes federativos incrementando a área de combate.

Modelo

Para ele, outro ponto importante é o de uma mudança no trabalho sistêmico e econômico do país, que, segundo ele, se beneficia da degradação do meio ambiente para impulsionar a economia sem medir as consequências. “Estamos lidando com as consequências de um modelo econômico que se mantém, se financia e é lucrativo. Então, é necessário tomar, também, atitudes econômicas sistêmicas, não só para esse caso específico dos incêndios florestais, mas, também, de toda a economia da degradação ambiental”, complementa.

O especialista explica que Amazônia, Pantanal e Cerrado são ecossistemas conectados e que, durante milhões de anos, esse sistema evoluiu permitindo a manutenção da Floresta Amazônica que é de extrema importância para toda América do Sul mas que agora se vê ameaçada. “Quando falamos da manutenção dos sistemas biológicos e ecossistêmicos da Amazônia, do Cerrado e do Pantanal, não estamos falando apenas de uma questão do Brasil, mas do equilíbrio climático, da segurança hídrica de centenas de milhões de pessoas de praticamente toda a América do Sul”, coloca Woortmann, ressaltando a importância da preservação dos biomas para o continente.

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Capital gaúcha, Porto Alegre (RS) debaixo d'agua. Na imagem, região do aeroporto tomada pela inundação | Foto: Foto: Ricardo Stuckert / PR

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Após cheia histórica, o estado do Acre enfrenta seca severa | Foto: Alexandre Cruz-Noronha/Sema

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Como é possível sobreviver nesse caos? | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

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Imagens aéreas mostram áreas devastadas pelo fogo no Pantanal | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil