Por: Mia Andrade

Projeto na Bahia transforma ciência em ouro

Estudantes do ensino médio criaram e desenvolveram a pulseira de localização de pessoas | Foto: Gabriel Pinheiro/Ascom Secti

Uma pulseira à prova d’água ajuda a localização de pessoas neurodivergentes e neurodegenerativas na Bahia. São um conforto para as famílias. O aparelho não é o resultado do trabalho de uma grande empresa de tecnologia. Ou mesmo de um grande laboratório tecnológico de ponta. A pulseira foi desenvolvida por estudantes do ensino médio. E é um exemplo de algo que chama a atenção na Bahia: o incentivo e a ampla divulgação de projetos científicos nas escolas públicas, promovendo e popularizando a ciência.

No intuito de promover a divulgação científica e estimular o conhecimento na Bahia, a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação (Secti) do Estado lançou o projeto Bahia Faz Ciência. Desde 2019, o projeto visa popularizar a ciência no estado e destacar como pesquisas e inovações podem impactar positivamente a qualidade de vida da população, através de uma série semanal de reportagens produzidas pela própria secretaria.

Lançado em uma data emblemática, 8 de julho de 2019, Dia Nacional da Ciência e do Pesquisador Científico, o projeto promove a divulgação maciça de pesquisas que retornam em produtos com o uso de variadas tecnologias para a sociedade. Por um lado, isso permite que a população conheça tais projetos. Por outro, a divulgação acaba estimulando mais e mais produção científica. Reportagens sobre as pesquisas realizadas e seus resultados são publicadas semanalmente, às segundas-feiras, na mídia local e estão disponíveis nos sites e redes sociais da Secti. A iniciativa integra os esforços do governo baiano para disseminar o conhecimento científico e torná-lo mais acessível à população.

"A principal motivação para o projeto é desenvolver a popularização da ciência e valorizar as pesquisas realizadas na Bahia. A popularização tenta levar o que está sendo produzido em ciência para a população em geral, numa ideia de desestigmatizar a ciência e a pesquisa, mostrando que qualquer pessoa pode participar e trabalhar com método científico", explica a diretora de Políticas e Programas da Secti, Sahada Luedy.

Segundo Sahada, o cenário de cortes de verbas para projetos de pesquisa promovidos pela União entre 2018 e 2022 evidenciou a necessidade de apresentar à população o que é produzido no meio acadêmico. “A educação é destacada como o principal meio para gerar emprego e renda, e as pesquisas científicas retornam para a sociedade em forma de vacinas, programas sociais e modelos de gestão”, afirma.

Primeiros passos

O coordenador da assessoria de comunicação da Secti, Erick Issa, ressaltou a importância da proximidade dos estudos realizados nas universidades com o cotidiano da população e como o Bahia Faz Ciência tem sido importante para isso.

“Em 2019, lançamos a série com pesquisadores de universidade. A ideia era popularizar a ciência em um momento em que o sistema educacional estava sendo atacado, com cortes de verbas de quase 90% para universidades, além das declarações de que nas universidades ‘não se fazia muita coisa’. A ideia é que o cidadão pudesse conhecer, de forma fácil e acessível o que os pesquisadores estavam produzindo e o que poderia retornar para a sociedade”, explica.

Issa conta que um dos exemplos dos benefícios gerados pelo trabalho de divulgação científica do projeto é a divulgação do trabalho realizado pelos pesquisadores do Instituto Gonçalo Moniz (Fiocruz Bahia), que, financiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa (Fapesb), identificaram o vírus zika.

O projeto, que começou divulgando a pesquisa realizada por universitários baianos passou a divulgar, também, projetos realizados por estudantes da rede estadual de ensino. “Nosso objetivo é desmistificar a ideia de que a ciência é inacessível, especialmente em um estado como a Bahia, que possui a maior população negra do Brasil. A ciência não é privilégio de gênios, mas está ao alcance de todos que têm curiosidade, disposição para pesquisa e determinação. Independentemente de origem, gênero ou raça, qualquer pessoa tem o potencial de se engajar na pesquisa com esforço e dedicação. Queremos elevar a autoestima dos estudantes, demonstrando que eles também podem ser cientistas e fazer contribuições significativas para a ciência”, acrescentou Sahada.

Ciência para todos

A segunda etapa do projeto focou mais nos estudantes das escolas públicas, com o objetivo de fazer com que eles se vejam na ciência e passem a produzir projetos de interesse para a população. “A ideia é que eles vejam essas reportagens e percebam que, se o colega de turma está fazendo ciência, eles também podem fazer”, explica a diretora.

Um dos projetos que gerou grande repercussão no estado foi desenvolvido por alunas do Centro Estadual de Educação Profissional em Tecnologia, Informação e Comunicação da cidade de Lauro de Freitas. Ana Clara Cerqueira, Evelyn Rodrigues e Rayka Ravena focaram em resolver desafios enfrentados por neurodivergentes (pessoas com funcionamento mental atípico, como autismo e TDAH) e neurodegenerativas (afetadas por doenças que deterioram o sistema nervoso, como Alzheimer e Parkinson).

Sob a orientação do professor Anderson Reis, as estudantes desenvolveram uma pulseira localizadora acessível, visando melhorar a segurança e a tranquilidade dos familiares dessas pessoas. O dispositivo, projetado com materiais confortáveis e à prova d'água, permite o monitoramento e a localização das pessoas que o utilizam, facilitando a intervenção em casos de emergência.

“Quando nós colocamos meninas do ensino médio em bons projetos de pesquisa, estamos mostrando que a ciência é possível para qualquer pessoa, desde que ela participe, tenha foco, trabalhe com método e tenha dedicação", enfatizou Sahada.

O avanço tecnológico e científico também tem sido aplicado para melhorar o tratamento de condições médicas como a candidíase vaginal. As alunas da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública, Mariana Robatto e Maria Clara Pavie, sob a orientação de Patrícia Lordêlo, desenvolveram um dispositivo que utiliza LED para tratar a candidíase sem necessidade de medicamentos. O método, baseado na emissão de luz azul de 405 nanômetros, foi projetado para impulsionar a morte do fungo Candida albicans, responsável pela infecção, além de potencialmente fortalecer a imunidade vaginal.

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Aparelho trata com luzes candidiáse | Foto: Ascom/Secti

Próximos passos

Segundo Issa, os próximos passos do projeto são ampliar a forma como as divulgações científicas serão feitas. O Bahia Faz Ciência agora conta com a criação de laboratórios de audiovisuais em universidades para a produção de podcasts do projeto semanalmente. "Queremos envolver as universidades estaduais e ter a participação de estudantes e professores na divulgação científica”, afirmou.

Na Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, em outubro, será lançada uma revista com o compilado das principais matérias do ano. “O nosso intuito é manter a continuidade do projeto e reforçar a importância de registrar e divulgar essas pesquisas científicas para a sociedade de forma que possa ser acessada para todos”, explica Sahada.

Issa destacou que serão instalados laboratórios de audiovisual nas escolas do interior do estado para aprimorar a qualidade das imagens e vídeos utilizados na divulgação dos projetos científicos. “Os laboratórios de audiovisual visam resolver esse desafio, elevando a produção e a qualidade das reportagens, tornando esses conteúdos mais acessíveis tanto para a imprensa quanto para a população.”

“Acreditamos que a ciência deve ser acessível e compreensível para todos. Queremos mostrar que a Bahia tem uma força muito grande para a ciência, o que pode trazer grandes evoluções não apenas para o nosso estado, como também para o futuro do nosso país”, concluiu Sahada.