Polêmica: plataformas de recrutamento frustam jovens que buscam por emprego com longos processos seletivos e falta de resposta

Falta de retorno e múltiplas etapas são as principais críticas dos candidatos às vagas

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Rayara tem rotina de muitos testesna busca por uma vaga de emprego

Adotadas com a promessa de tornar os processos seletivos mais ágeis e transparentes, as plataformas de recrutamento frustram jovens candidatos, que reclamam das múltiplas etapas a cumprir e da falta de retorno após a inscrição.

A produtora audiovisual Rayara Lassance, 26, afirma ter perdido a conta de quantas seleções participou desde que foi atingida por uma demissão coletiva em março deste ano. Em tom de brincadeira, ela diz ter se tornado sommelier de plataformas nos últimos meses.

"A mais frustrante de todas é, com certeza, a Gupy. Ainda é uma incógnita para nós, candidatos, como aquilo funciona."

Lassance soma 120 inscrições em vagas desde que se cadastrou no site, em 2022. Para ela, os principais problemas são a falta de retorno sobre as candidaturas e a falta de clareza nos critérios de seleção e nos limites entre a atuação de robôs e a ação humana durante a seleção.

De março a maio de 2024, com 52 milhões de cadastrados e 4.000 empresas clientes, a Gupy foi a plataforma do segmento com mais visualizações de página na internet do Brasil, segundo a Comscore MMX (empresa de análise de audiência). Indeed, Infojobs, Vagas.com, Glassdoor e Catho vêm na sequência.

Guilherme Dias, um dos fundadores da Gupy, afirma que a plataforma acompanha as críticas e implementa melhorias nos processos. Além de orientar que as seleções tenham menos etapas, o site criou, em 2021, um selo para empresas que dão retorno aos inscritos.

Dias destaca ainda que a elaboração do processo seletivo fica a cargo do contratante.

Segundo a Gupy, sua tecnologia de inteligência artificial não elimina nem aprova candidatos, apenas ordena currículos de acordo com os critérios definidos pelas empresas.

Uma semana depois de criticar a Gupy publicamente nas redes sociais, Laís Neves, 28, conseguiu, pela própria plataforma, uma vaga na área de recrutamento de uma empresa.

De candidata a recrutadora, experimentou os dois lados da ferramenta. "Eu entendo o posicionamento dos candidatos e acho que, sim, eles têm que se manifestar." Na sua avaliação, há uma culpa compartilhada entre o site e as empresas contratantes.

Ana Letícia Magá, mentora de carreiras da geração Z, diz que a intermediação das plataformas torna os processos seletivos impessoais. Produtora de conteúdo no canal FuturAna, no YouTube, Magá acompanha as reclamações dos jovens candidatos.

"Eles odeiam e são bastante críticos a esse modelo. Em geral, são muitas etapas automatizadas, e eles sentem que não são vistos."

Em dois anos, o economista Gustavo Diniz, 26, enviou o currículo 570 vezes pela Gupy e, mesmo assim, não conseguiu emprego. Só foi contratado após entrar em contato direto com uma recrutadora pelo LinkedIn. A tática é recomendada para fugir do filtro da inteligência artificial.

Já na Catho, um candidato de 21 anos que preferiu não ser identificado conseguiu marcar apenas uma entrevista na área de atendimento ao cliente. A vaga, porém, não condizia com o anúncio.

"A empresa colocou 60 pessoas em uma sala pequena, sem ventilação, e ficamos lá por duas horas sentados esperando o CEO chegar. E adivinha? Eles mentiram, a vaga era de corretor, presencial e sem benefício. A Catho até hoje me manda mensagens automáticas referentes a essa vaga."

A plataforma também é criticada por ter planos pagos. É possível se candidatar gratuitamente, mas quem paga tem mais chances. "Não faz sentido. Se eu estou desempregada, como vou ter dinheiro para divulgar meu currículo?", questiona Nattaly Gomes, 26, assistente de recursos humanos.

Em resposta às críticas de propaganda enganosa, Fabio Maeda, um dos diretores da Catho, afirma que todos os anúncios são inspecionados e que o site dispõe de um canal de denúncias de vagas e empresas. Segundo ele, as reclamações feitas são analisadas por uma equipe especializada.

O diretor compara a Catho ao YouTube e ao Spotify. "O nosso modelo é exatamente esse. Você pode entrar e se candidatar para as vagas, só que há algumas funcionalidades que estão no plano pago. O plano pago te dá mais destaque para o recrutador."

Tecnologias como o ATS (Applicant Tracking System, ou sistema de rastreamento de candidatos) facilitam o trabalho dos recrutadores, mas, para Magá, mentora de carreiras, as plataformas também deveriam facilitar a experiência dos profissionais.

"Se os candidatos se sentem prejudicados, é importante que as plataformas encontrem outras soluções."

*Por Adosn Dutra e João Pedro Capobiano (Folhapress)