Por: Thamiris de Azevedo

Brasil já foi julgado 12 vezes por Direitos Humanos

Reunião da Corte Interamericana de Direitos Humanos já julgou Brasil por violações, como casos de violência policial | Foto: Juan Manuel Herrera/OEA

Hoje, 10 de dezembro, é o Dia Internacional de Direitos Humanos. A data remete ao dia em que, há 76 anos, era promulgada a Declaração Universal de Direitos Humanos pela Organização das Nações Unidas (ONU). A carta é um pacto entre os estados membros que se comprometeram a universalizar e promover os direitos humanos embasados na liberdade, justiça e na paz do mundo, elevando a dignidade da pessoa humana para todos.

Além da Declaração, as Nações Unidas promoveram Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) a serem seguidos em todo mundo. São 17 objetivos, como erradicação da pobreza, igualdade de gênero e educação de qualidade com os quais as nações se comprometem.

A promoção dos Direitos Humanos, no entanto, não se restringe ao tratado da Declaração Universal e muito menos à ONU. Além de um dever internacional, é um dever constitucional que respalda todo o sistema do Estado Democrático de Direito. Por isso, a reportagem apurou sobre o Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH) e os casos brasileiros que foram submetidos à Corte Internacional.

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Os 17 Objetivos do Milênio | Foto: Reprodução

Em entrevista ao Correio da Manhã, a professora Carolina de Abreu Batista do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UNB) explica que o SIDH, diferente da ONU que tem caráter global, é um sistema regional que está ligado à Organização dos Estados Americanos (OEA). Este está submetido a Convenção Americana de Direitos Humanos, também conhecido por Pacto San José da Costa Rica, de 1969.

Funcionamento do SIDH

Atualmente, segundo dados da OEA, são 34 países dos continentes americanos submetidos ao sistema. O órgão é divido em Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Enquanto o primeiro exerce função de monitoramento, o outro julga as denúncias. A professora Carol explica que a Comissão também realiza a análise prévia das petições de denúncia antes de chegar até a Corte.

Quando a petição chega na Corte, é julgada pelos setes juízes que a compõem. Quando emitido sentença, o Brasil tem obrigação de cumpri-los em honra ao pacto do qual escolheu ser signatário.

Neste ano, o jurista brasileiro Rodrigo Mudrovitsch tomou posse na função de vice-presidente da Corte. Mudrovitsch já fazia parte da Corte desde 2021, como juiz, quando foi o brasileiro mais votado entre os que disputavam as vagas.

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O vice-presidente brasileiro, Rodrigo Mudrovitch | Foto: OEA

Favela de Acari

Segundo os dados de monitoramento das decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), bem como relatórios disponibilizados ao Correio da manhã e apuração no site da Corte Interamericana de Direitos Humanos, o Brasil foi condenado em 12 casos que alcança reparação para mais de 85 pessoas.

O julgamento mais recente emitiu sentença na semana passada, em 4 de dezembro, ocasião em que o Brasil foi reconhecido responsável pelo desaparecimento forçado de 11 jovens afrodescendentes da favela de Acari, no Rio de Janeiro, em 1990, segundo a Corte por membros da polícia.

Na sentença, a Corte determina que o Brasil dê continuidade às investigações sobre o caso, uma busca rigorosa pelos desaparecidos, além de um ato público de reconhecimento da responsabilidade internacional. Também foi ordenada a criação de um espaço de memória no Bairro de Acari, para lembrar as vítimas, e a elaboração de um estudo que analise a atual atuação de milícias e grupos de extermínio na região. Essas iniciativas visam garantir justiça e promover a reflexão sobre os graves problemas enfrentados pela sociedade carioca.

Outro caso envolvendo extermínios em comunidades mais pobres é o da Favela Nova Brasília, quando 26 homens foram vítimas de homicídio e três mulheres vítimas de violência sexual, durante operações policiais realizadas no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, em 1994 e 1995.

Damião Ximenes

Para a especialista em relações internacionais Carolina Abreu, um dos casos mais emblemáticos é o Damião Ximenes Lopes vs Brasil, em que se reconheceu a responsabilidade do Estado brasileiro pela morte de um rapaz que estava sob tratamento cruel em clínica psiquiátrica. Esta foi a primeira condenação brasileira, em 2006, pelo órgão.

A professora também destacou ao jornal o Caso Gomes Lund vs. Brasil.

“Conhecido como o caso da Guerrilha do Araguaia, ocorrido durante a ditadura militar e que até hoje não foi plenamente solucionado, haja vista o homicídio e desaparecimento dos restos mortais de muitas das vítimas. Nesse caso, a lei de anistia de 1979 foi questionada e considerada ilegal numa perspectiva de direitos humanos”.

O Brasil também foi condenado, com o dever de investigar e punir, a morte do jornalista Vladimir Herzog, preso e torturado até a morte em 25 de outubro de 1975.

Indígenas e Escravidão

Há casos também envolvendo interesses dos povos indígenas e situação análoga à escravidão.

Em 2018 o Brasil foi condenado pela violação do direito à garantia judicial de prazo razoável, a posse de terras do povo indígena Xukuru.

E em 2015, no caso Trabalhadores da Fazenda Brasil Verde vs. Brasil, a Corte condenou o Brasil pela omissão ante trabalho análogo a escravidão em 20 de outubro de 2016. A Corte IDH proferiu a sentença determinando a apuração da denúncia.

“A Corte IDH considerou que o Estado brasileiro cumpriu parcialmente a obrigação de investigar, julgar e, se for o caso, punir os responsáveis pelos fatos. Para avaliar o cumprimento total da medida, o tribunal aguardará receber informações sobre o trânsito em julgado da decisão doméstica”.

Como peticionar

Em entrevista com a Assessora Especial da Assessoria Internacional da Defensoria Pública da União, a defensora Daniela Brauner, explicou ao Correio da Manhã que só é possível levar um caso à Corte, se antes apreciado pela Comissão e se esgotado os recursos internos brasileiros. Neste sentido, completou dizendo que qualquer um pode peticionar e que cabe a DPU representar os cidadãos interessados.

“As normativas são expressas e ao tratar as funções institucionais da Defensoria Pública como a representação nos sistemas internacionais de proteção dos Direitos Humanos. Então, existe uma previsão legal de atuação da Defensoria Pública da União no sistema internacional tanto no sistema internacional das Nações Unidas como no sistema interamericano”

Segundo a defensora, atualmente há dois casos impetrados pelo órgão na Corte aguardando julgamento. Dentre elas, ela destacou a denúncia dos quilombolas da Comunidade de Alcântara, do Maranhã, que foram retirados compulsoriamente de suas casas para instalação de uma base de lançamento de foguete da Força Aérea Brasileira.