Por: Reynaldo Rodrigues

Além da invisibilidade: Marcha Trans pelo futuro

A marcha de 2024 foi a primeira realizada no DF para trazer à tona a discussão da realidade trans | Foto: Fotos Divulgação

A Marcha Trans é um movimento global que reúne milhares de pessoas anualmente em diversas cidades para celebrar a diversidade e lutar por direitos humanos. No Brasil, a iniciativa ganhou força com a realização da Marsha Trans Brasil, a primeira marcha trans do país, ocorrida em 28 de janeiro de 2024, em Brasília (DF). O evento, além de destacar as demandas da população trans, reforçou a importância da visibilidade e da construção de uma comunidade inclusiva.

Neste ano, o evento acontece neste domingo (26). Em sua segunda edição, a manifestação reforça a luta por direitos das pessoas transexuais e marca o Dia da Visibilidade Trans, celebrado em 29 de janeiro desde 2004.

A Marsha, grafada assim em homenagem a Marsha P. Johnson, referência trans global, chama para a principal via pública de Brasília pessoas trans e travestis, a comunidade LGBTQIA+ e aliados. A concentração começa às 13h, com participação de representantes da política, ativismo e cultura. Às 17h, será realizado o cortejo pela Esplanada dos Ministérios rumo ao Museu Nacional da República, onde estará o palco-manifesto com apresentações culturais.

Vida, Direitos e Futuro

A Marsha é organizada pela Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) e pelo Ibrat (Instituto Brasileiro de Transmasculinidades), com apoio de diversas instituições LGBTQIA+. O tema escolhido para 2025 é “Vida, Direitos e Futuro para a População Trans”, que lança um chamado urgente à sociedade: garantir que as vidas trans sejam protegidas, que seus direitos sejam assegurados e que suas demandas sejam reconhecidas.

Para Bruna Benevides, presidenta da Antra e coordenadora da Marsha, a luta precisa ser coletiva. “Nossa manifestação no centro político do país é um chamado para que a sociedade enfrente toda forma de discriminação e violência, promovendo respeito e igualdade para todas as pessoas”, afirma.

Entre as presenças confirmadas estão as deputadas federais Erika Hilton (Psol-SP) e Duda Salabert (PDT-MG) — primeiras parlamentares trans eleitas para o Congresso Nacional — e as artistas Linn da Quebrada, Bia Bixarte, Valéria Barcelos e Ayô Tupinambá. A manifestação abre o calendário de mobilizações populares pela população trans.

Reivindicações

O movimento traz como uma de suas principais pautas a defesa das infâncias e juventudes trans, com o lema “por um futuro vivível”. Entre as demandas estão o pleno acesso aos cuidados em saúde para crianças trans e a inclusão de medidas específicas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para proteger essa população. “Buscamos uma transição social segura, comprometidos com a proteção integral de crianças e jovens trans”, destacam as organizações.

A mobilização também visa romper estigmas e garantir um envelhecimento seguro e digno para pessoas trans, combatendo as barreiras impostas pelo racismo e pela transfobia. Além disso, reivindica justiça, memória e reparação para pessoas trans sobreviventes das perseguições e violências praticadas durante a ditadura militar no Brasil.

Em entrevista ao Correio da Manhã, a artista trans do grupo “O Culto das Malditas”, Mia Uriellen, destacou a importância do movimento para a comunidade trans brasileira. “Todos os dias nós botamos a cara na rua em busca de oportunidades, de trabalho, de dignidade, e poder participar da Marsha Trans é o momento de gritar por respeito, pra que nos enxerguem. Sinto que a Marsha traz a mensagem que queremos transmitir, e é importante ter essa atenção pra que lembrem que a nossa luta é diária.Muitas empresas insistem que querem mais diversidade em suas equipes, mas, para isso, precisam aprender a lidar com essa diversidade”, disse.

Segundo ela, ações sociais que geram essa reflexão na sociedade são necessárias para o entendimento dessas causas, principalmente no âmbito trabalhista. “Pessoas transvestigêneres ainda sofrem muito preconceito em seus ambientes de trabalho, então é preciso aprender como nos acolher. A Marsha é sobre luta e união, pra que possamos encontrar mais respeito e igualdade na nossa sociedade”, finaliza a artista.

Luta pela sobrevivência

Apesar da redução no número de assassinatos em 2024, o Brasil continua sendo o país que mais mata pessoas trans no mundo, segundo pesquisa da Rede Trans Brasil. No ano passado, 105 pessoas trans foram mortas, uma queda de 14 casos em relação a 2023. Ainda assim, o país mantém a triste liderança global pelo 17º ano consecutivo. Os dados completos do levantamento serão oficialmente apresentados na próxima quarta-feira (29), data em que se celebra o Dia da Visibilidade Trans. O relatório reforça a urgência de medidas eficazes para proteger a população trans, que segue vulnerável à violência extrema e discriminação estrutural.

Faísca de esperança

O Brasil elegeu 27 vereadores e vereadoras trans nas eleições municipais do último ano, de acordo com levantamento da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). O número representa uma redução em relação a 2020, quando 30 pessoas trans conquistaram assentos nas Câmaras de Vereadores do país.

Apesar dessa queda, as eleições de 2024 marcaram um avanço significativo na representatividade LGBTQIAPN+. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 222 vereadores e três prefeitos que se identificam com alguma das letras da sigla foram eleitos, mais do que o dobro registrado em 2020, quando a ONG Vote LGBT contabilizou 97 políticos eleitos.

Este também foi o primeiro pleito em que os candidatos puderam informar orientação sexual e identidade de gênero à Justiça Eleitoral. No total, foram registradas 967 candidaturas trans, evidenciando um esforço crescente para ampliar a diversidade nos espaços de poder.

Embora os números reflitam avanços, ativistas apontam que os desafios para a população LGBTQIAPN+ na política brasileira ainda são imensos, incluindo enfrentamento à violência política, discriminação e falta de recursos de campanha.