Por Isabel Dourado
Em 2006, durante o último ano do seu primeiro mandato, o presidente Lula visitou a plataforma P-50 de petróleo na Bacia de Campos, no estado do Rio de Janeiro, onde foi fotografado com as mãos encharcadas de petróleo. A imagem que se tornou bastante famosa capturou o período em que o país se preparava para explorar as novas riquezas, particularmente as do pré-sal e assim se tornar autossuficiente na produção de petróleo e gás natural.
A exploração do pré-sal, iniciada há cerca de 16 anos, se estende por cerca de 800 quilômetros de comprimento e 200 quilômetros de largura, abrangendo a região entre os estados do Espírito Santo e Santa Catarina. Agora, discute-se a sua ampliação para o norte do país, chegando à foz do rio Amazonas.
Ao longo de três etapas de perfuração e extração, a exploração do pré-sal causou mudanças consideráveis no ambiente natural e trouxe impactos que se refletem nas comunidades locais, muitas vezes de maneira invisível, mas com consequências palpáveis para a saúde e para a organização social das populações que dependem dos ecossistemas costeiros.
Impactos
Para medir os impactos da exploração do Pré-Sal, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Fórum de Comunidades Tradicionais (FCT), por meio do Observatório de Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Bocaina (OTSS), produziram o Relatório de Perdas e Danos da Cadeia do Petróleo e Gás do Pré-Sal em Comunidades Tradicionais do Litoral Sul Fluminense e Norte Paulista. Os pesquisadores entrevistaram caiçaras, quilombolas e indígenas que vivem nas regiões de Mangaratiba e São Sebastião. O Correio da Manhã teve acesso ao relatório.
Com os resultados das entrevistas, análise dos dados, reuniões e mapeamento participativo, foram identificados 25 novos impactos que não tinham sido previstos pelo Estudo de Impacto Ambiental (EIA) no momento em que o licenciamento do pré-sal foi estabelecido. Além disso, o levantamento propõe 14 recomendações para melhorar o processo de licenciamento e proteger os territórios tradicionais afetados pela exploração.
O objetivo da pesquisa, que durou cinco anos, foi identificar os impactos segundo a perspectiva do território, comparar com a situação apontada inicialmente e propor ajustes no processo de licenciamento ambiental no Brasil.
Crise climática
Fabiana Miranda, coordenadora de Gestão Territorial do OTSS e coordenadora do Grupo de Trabalho de Perdas e Danos, explica que o levantamento é apresentado como uma ferramenta para influenciar mudanças na estrutura do licenciamento ambiental.
Os entrevistados relataram aumento no tráfego de navios, presença de petróleo nos ecossistemas costeiros, diminuição de peixes para a pesca, aumento de doenças hídricas, perda de autonomia dos povos tradicionais sobre o território e diversos danos psicossociais, entre outros impactos.
Nos estudos técnicos, são identificadas três categorias de impacto ambiental: físicos (como alterações no solo, água, ar), bióticos (que envolvem plantas, animais) e socioeconômicos (que afetam o modo de vida das pessoas), além de considerar os aspectos de cumulatividade (a soma de vários impactos em uma mesma área).
Com base no estudo, são propostas cinco novas categorias de impacto: culturais; econômicas e sobre o bem-estar material; institucionais, legais, políticos e de igualdade; sobre a qualidade do ambiente habitado e o bem-viver; e sobre a saúde e o bem-estar das pessoas afetadas pelo empreendimento.
Fabiana Miranda destaca que as comunidades tradicionais têm o direito de ter suas perdas e danos identificados.