Por: * Ricardo Voltolini

ESG é assunto para os pequenos negócios?

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Esta é, senão a pergunta mais comum, uma das mais recorrentes nos meus seminários de sustentabilidade empresarial pelo Brasil. A resposta é sim, com as devidas adaptações. Sendo ESG uma demanda originalmente do mercado de investidores, sua implantação é mandatória para empresas de capital aberto, urgente para grandes empresas com reconhecidos impactos socioambientais e importante para toda e qualquer organização que atue sob uma lógica empresarial.

Isso vale, obviamente, para as pequenas empresas, embora muitas tendam a achar que é conversa exclusiva
para as grandes, motivadas pela percepção equivocada de que sustentabilidade custa muito, exige gestão complexa e represente um desvio de foco.

Na maioria das vezes, implantar práticas socioambientais e de governança requer, mais do que investimento, mudança de mentalidade. Implica uma tomada de decisão simples. Eventuais investimentos em sistemas para economizar água, energia e materiais observam retornos rápidos na forma de economia de custos.

O tamanho da responsabilidade ESG de uma empresa – vale destacar – deve ser proporcional à extensão dos seus impactos. Nenhuma empresa está livre de responsabilidades, ainda que limitadas.

Pesquisa realizada em 2023 pelo Centro Sebrae de Sustentabilidade, intitulada O Engajamento dos pequenos negócios brasileiros às práticas de ESG, indica que há muito por fazer na disseminação do tema. Para começar, apenas 14% dos líderes de pequenas empresas no Brasil conhecem a sigla composta pelas iniciais em inglês de
Ambiental, Social e Governança.

Sustentabilidade empresarial, espécie de conceito antecessor do ESG, parece um termo mais familiar: 72% já ouviram falar, o que não significa (o estudo não se aprofunda em níveis de compreensão) que saibam exatamente o que fazer com ele ou o quanto ele impacta os negócios.

Respectivamente 58% e 51% admitem conhecer o Pacto Global da ONU (organização que reúne empresas em torno dos desafios globais de sustentabilidade) e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (a Agenda 2030 inclui 17 grandes objetivos a serem alcançados em sete anos para uma vida melhor no planeta.) Um letramento ainda se faz necessário.

Como era de se esperar, 94% dos entrevistados conhecem o Sebrae. No entanto, apenas 23% sabem que a organização criou em 2011, e mantém ainda hoje, um centro especializado em sustentabilidade, com banco de práticas, guias e manuais, fóruns, treinamentos e orientação especializada. 

Inevitável concluir, por esses números, que três em cada quatro empreendedores não tiveram interesse, tempo ou motivação para acessar um serviço de apoio gratuito, o que demonstra, por tabela, baixa disposição também em saber como práticas ambientais, sociais e de governança podem melhorar seus negócios.

Baixa disposição pode significar desinformação. É razoável supor. Mas pode também – e é isso o que sugere nossa experiência – significar baixa prioridade, motivada pelo falso juízo de que o tema é fonte de custos, exige
especialização e representa desvio de foco numa realidade cotidiana que suscita mobilizar esforços de sobrevivência e controlar o incerto movimento de receitas e despesas.

Não são poucos os empreendedores que, sem maior reflexão, associam sustentabilidade à despesa, alegando, como motivo para procrastinar decisões da esfera do ESG, a falta de recursos financeiros para investimento. Também não são raros os líderes que têm dificuldades de enquadrar o que já fazem no conceito de ESG.

Um dos pontos fortes desse estudo do Centro de Sustentabilidade do Sebrae é que, em vez de propor uma abordagem apenas conceitual, detalha práticas ambientais, sociais e governança muito elementares. Isso
contribui para uma melhor compreensão dos entrevistados. E, na ponta, resulta em dados promissores que certamente surpreenderão os mais céticos.

Os números mostram que as pequenas empresas valorizam ESG, não só no discurso, mas na prática. Entre as pesquisadas, 91% consideram “muito importante” ou “importante” inserir elementos de “E” na gestão do negócio. 81% e 87% acham o mesmo sobre os aspectos sociais e de governança. Os dados confirmam também que as pequenas adotam mais práticas de ESG do que imaginam: 87% realizam as ações de governança exemplificadas na pesquisa e 75% cumprem um checklist completo das práticas ambientais. Apenas 56% seguem o roteiro de práticas de “S.

Um outro dado interessante merece maior atenção e análise. E está relacionado à razão pela qual as pequenas têm aderido às práticas de ESG. Parece ser por convicção mais do que por pressão. Apenas um terço das empresas estudadas admitem ter se sentido cobradas a incorporar as práticas por clientes, colaboradores e comunidades (E:30%, S:29% e G:36%).

As demais parecem adotá-las graças a algum tipo de convicção sobre ganhos e benefícios para os negócios,
ainda que não totalmente compreendidos. Não seria impróprio constatar, portanto, que, dada a crescente valorização do tema pela sociedade, os empreendedores têm enxergado no tema um campo de oportunidades (reputação, senso de pertencimento, melhoria do ambiente de negócios, relacionamento com comunidades) mais do que de riscos (reputacionais, operacionais e financeiros).

Também arriscaria afirmar que uma parte dos empreendedores – a que superou o estigma da sustentabilidade como despesa – já consegue enxergar benefícios concretos, principalmente os relativos à ecoeficiência, como a redução nas contas de energia e água, a geração de receitas via reciclagem, a eliminação de desperdícios e retrabalhos. É uma consciência emergente.

Fazer por convicção parece o melhor dos mundos. Sempre uso como exemplo a escala dos 3 C’s proposta por Fábio Barbosa, CEO da Natura & Co e um dos pioneiros do assunto no Brasil: empresas aderem à sustentabilidade por convicção, por conveniência ou por constrangimento. 

A “baixa percepção de cobrança” pode revelar, no entanto, que as micro e pequenas não se sentem ainda tão
compromissadas a evoluir numa agenda empresarial cada vez mais relevante, o que, segundo os autores do estudo – e concordo com a análise – aumenta o risco de serem surpreendidas por “futuras demandas.” Entre essas demandas, vale ressaltar o movimento crescente de grandes empresas, orientadas por protocolos de compras sustentáveis, pressionando as pequenas que compõem a sua cadeia de suprimentos a terem políticas e estratégias de sustentabilidade.

Numa análise por setores, observa-se que o percentual das empresas que admitiram pressão por aspectos ambientais da indústria (49%) e Construção Civil (40%) supera a média nacional de 30%. Estou entre os que creem que pressão ajuda a empresa a parar, refletir e valorizar o tema.

O estudo do Sebrae confirma essa tese: seja qual for o tipo de pressão (ambiental, social ou por governança), o nível de importância conferido a ESG é maior entre os que já se sentiram cobrados. As que não são pressionadas, segundo a pesquisa, tendem a não adotar práticas, especialmente as ambientais.

* Ricardo Voltolini é CEO da Ideia Sustentável, fundador da Plataforma Liderança com Valores, mentor ESG
e autor, entre outros, do livro “Vamos Falar de ESG? (Voo, 2022)

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