Por Pedro Sobreiro
Um dos capítulos mais importantes da história do futebol brasileiro completou um século no último domingo (7). Conhecido como a 'Resposta Histórica', o Ofício n.º 261 do Club de Regatas Vasco da Gama trouxe o texto do então presidente vascaíno José Augusto Prestes se negando a excluir 12 atletas, em sua grande maioria negros ou vindos de camadas populares da sociedade, do clube, conforme solicitava o regulamento racista da AMEA (Associação Metropolitana de Esportes Athleticos), presidida por Arnaldo Guinle.
A recusa do Vasco em se desfazer dos negros e operários, enquanto fazia sucesso jogando o Campeonato Carioca da Liga Metropolitana de Desportos Terrestres, arrastando grandes públicos para seus jogos em uma época na qual o futebol era um esporte restrito à elite, é considerado um marco histórico na luta antirracista no Brasil, pois foi com a reação do Vasco que o futebol se popularizou e começou a adentrar nas camadas populares da sociedade, se tornando uma das principais manifestações desportivas e culturais do Brasil no mundo.
Em comemoração ao centenário desse capítulo espetacular, o Club de Regatas Vasco da Gama preparou uma série de ações especiais. No domingo (7), o associativo e a SAF publicaram vídeos e textos reafirmando o compromisso do Vasco com a luta antirracista e trazendo a reflexão para os torcedores de que apenas se apegar ao passado não é o bastante. É necessário seguir lutando pela igualdade no esporte e na vida em si.
Em São Januário, o clube inaugurou a exposição "Centenário da Resposta Histórica: Coragem para Lutar", que contou com a presença do presidente Pedrinho e do CEO Lúcio Barbosa. Na inauguração, influenciadores e descendentes de jogadores do lendário elenco dos 'Camisas Negras' marcaram presença, assim como a própria Resposta Histórica, que foi exibida.
A exposição está aberta ao público de terça-feira a domingo. Quem for, poderá conhecer a fundo a história do documento e sua influência no esporte, além de poder ver a réplica física da Resposta Histórica.
"A Resposta Histórica nasceu nos campos de futebol, no Vasco, mas ela ultrapassou os limites da comunidade vascaína. Mais do que um manifesto, a Resposta Histórica enfrentou o debate sobre a importância de lutar e se posicionar contra o racismo. O centenário da Resposta Histórica propõe uma reflexão: apesar dos avanços da sociedade brasileira desde 1924, ainda estamos longe de extinguir, definitivamente, todas formas de preconceito, sejam elas raciais, socioeconômicas e culturais. Espero que nos
próximos 100 anos, a Resposta Histórica seja a lembrança de um tempo que não existe mais", disse Pedrinho, Presidente do Club de Regatas Vasco da Gama.
Outras ações incluíram o lançamento da digitalização do acervo do Centro de Memória do Vasco, o maior do mundo, que pode ser acessado no site https://crvascodagama.com/centrodememoriacrvg. Também houve o lançamento da parceria entre Vasco e Chico Rei para a venda das camisas comemorativas ao centenário.
Mas o maior feito ficou guardado para o final. Em um domingo no qual o Flamengo conquistou o Campeonato Carioca, o Cristo Redentor decidiu abraçar o Vasco da Gama.
Pela primeira vez na história do Santuário mais famoso do planeta, a Maravilha do Mundo Moderno vestiu o lendário uniforme dos 'Camisas Negras', o elenco do Vasco que foi defendido pela Resposta Histórica.
A ação era um sonho da torcida há muito tempo, e ter acontecido como forma de homenagear a Resposta Histórica foi um acerto magnífico do Vasco associativo.
Em nota divulgada pelo CRVG, o clube afirmou que a ação era uma forma de incentivar a luta contra o racismo em toda a sociedade brasileira, não ficando restrita apenas aos torcedores do Vasco.
"A projeção no Cristo Redentor não apenas celebra esse momento histórico, mas também reafirma a posição do Club de Regatas Vasco da Gama em relação aos valores de inclusão, diversidade e respeito. A iniciativa busca inspirar não apenas os torcedores do clube, mas toda a sociedade brasileira, a lutar contra todas as formas de discriminação e exclusão além das esferas esportivas", disse a nota.
A projeção da camisa Cruzmaltina no Cristo Redentor aconteceu às 19h30 e logo viralizou nas redes sociais. Sem ter jogos do time de futebol desde a eliminação na semifinal do Carioca, os torcedores viram a paixão pelo clube se fortalecer nesta ação histórica.
"Nasci e joguei no Vasco. Ganhei títulos, e agora, tenho a honra e responsabilidade de ser presidente. Vivi e vivo intensamente a história do clube. Porém, a maior conquista aconteceu fora de campo, em 1924, a Resposta Histórica. E somente o Cristo Redentor pela imponência de ser um patrimônio da humanidade [pela Unesco] poderia mostrar a real importância do centenário desse marco, por tudo que ele representa para a cidade, para o Brasil e para o mundo. Não posso de deixar de agradecer a todos que viabilizaram a ideia que tivemos e que compreenderam a importância da mensagem", explicou Pedrinho.
Em uma época que a luta pela igualdade está cada vez mais conseguindo espaçi na sociedade, o Vasco da Gama usou sua história para mostrar que não basta condenar o racismo, mas é preciso ser antirracista. A luta contra o preconceito vem avançando, e muita coisa já mudou nesses 100 anos da Resposta Histórica, mas é necessário ficar sempre alerta, porque o preconceito segue presente e precisa ser combatido diariamente.
