Atirador do Texas sofreu bullying por ser gago e comprou armas dois dias antes do ataque
Por: Rafael Balago
Dias depois de completar 18 anos, Salvador Ramos celebrou postando uma foto com dois fuzis que ele teria comprado no último domingo (22). A aquisição veio após uma escalada de agressividade que marcou sua adolescência e terminou de forma trágica. Ramos usou as armas para matar 21 pessoas –19 crianças e dois adultos– em uma escola no Texas, na terça-feira (24). Depois, foi morto pela polícia.
Mais detalhes sobre o ataque ocorrido na cidade de Uvalde estão sendo revelados. Na manhã desta quarta-feira (25), a polícia contou que todas as vítimas pertenciam a uma mesma sala de aula, do quarto ano. Os nomes de alguns dos mortos foram divulgados. Xavier Lopez, 10, gostava de dançar e contar piadas, segundo sua família. E Jose Flores, também de 10 anos, amava jogar beisebol. A professora Eva Mireles, 44, foi morta ao tentar defender seus alunos.
Pessoas próximas ao atirador disseram à imprensa dos EUA que Ramos teve uma adolescência marcada por bullying e problemas familiares. Na escola, era alvo de provocações por ser gago, o que o deixava revoltado e sem vontade de estudar. Perdeu muitas aulas e não conseguiria se formar neste ano.
Em muitas ocasiões em que foi à escola, envolveu-se em brigas. Há registros de ao menos cinco ocasiões em que ele trocou socos com colegas. Durante o ensino médio, Ramos passou a se vestir todo de preto, usar botas militares e deixou o cabelo crescer. À noite, costumava sair de carro com um amigo e atirava ovos nos outros veículos. Em outras ocasiões, usava uma arma de ar comprimido para atirar aleatoriamente em pessoas nas ruas.
Ele não escondia o desejo de ter acesso a armamentos mais pesados. Há um ano, publicou imagens de fuzis automáticos, capazes de disparar rajadas de tiros, e disse que eles estavam em sua lista de desejos.
Nas redes sociais, também publicava sobre problemas que tinha em casa. Em uma das postagens, apareceu em uma discussão com a mãe, que tentava expulsá-lo de casa. "Ele estava gritando e falando com sua mãe de modo realmente agressivo", disse uma colega de Ramos ao jornal Washington Post.
Vizinhos e familiares disseram que a mãe do atirador tinha problemas com uso de drogas. Alguns meses atrás, ele se mudou e foi morar com a avó, que tinha planos de despejar a mãe de Ramos. Segundo a polícia, antes de atacar a escola, ele também atirou na avó, que foi internada com ferimentos.
O caso gerou revolta nos EUA e mais pedidos pela ampliação do controle de armas. Na noite de terça, o presidente Joe Biden usou o ocorrido para voltar a criticar o lobby pró-armas no país e a defender o controle no acesso a armamentos. "Estou cansado disso", disse, em uma fala de sete minutos. "Por que? Por que estamos dispostos a viver com essa carnificina? Por que continuamos deixando isso acontecer?"
"A ideia de que um garoto de 18 anos possa comprar dois fuzis é errada. Fabricantes estão há décadas oferecendo agressivamente armas que geram enormes lucros. Quando, em nome de Deus, vamos nos levantar e enfrentar o lobby das armas?", prosseguiu o presidente.
O ataque em Uvalde ocorre dez dias depois de outra ação similar. Em 14 de maio, um homem de 18 anos matou dez pessoas negras na cidade de Buffalo, no estado de Nova York. O atirador, Payton Gendron, abriu fogo contra clientes de um supermercado, numa ação transmitida ao vivo pela internet –ambiente no qual também publicou um manifesto para justificar o ataque, baseado em teorias racistas, como a de que os negros estariam tomando o lugar dos brancos na sociedade.
O caso desta terça foi o maior ataque à uma escola primária desde Sandy Hook, em Connecticut. Naquela ocasião, um homem de 20 anos matou 26 pessoas, sendo que 12 eram crianças com idade entre seis e sete anos.
O porte de armas é garantido pela Constituição, mas muitos especialistas, ativistas e políticos defendem maior controle de acesso, como medidas para impedir que pessoas com problemas psicológicos ou histórico de violência tenham acesso a armamentos de alto calibre. No entanto, políticos ligados ao Partido Republicano costumam barrar medidas nesse sentido, pois veem o direito a se armar como um símbolo de liberdade a ser preservado.