Por:

Líderes do Mercosul se reúnem em cúpula fragmentada no Paraguai

| Foto: Reprodução

Por: Sylvia Colombo 

A primeira reunião presencial de chefes de Estado do Mercosul desde a pandemia ocorre nesta quinta-feira (21), em Assunção, no Paraguai, num ambiente anticlimático.

O presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou no domingo que deve fazer um "bate e volta". O da Argentina, Alberto Fernández, viaja com a cabeça pesada por conta da crise política e econômica em seu país, com inflação anual em 64% e manifestações intensas nas ruas. O do Paraguai, Mario Abdo Benítez, também vive situação interna complicada, com a divisão do partido Colorado em abril do ano que vem.

Quem promete bagunçar o coreto é o uruguaio Luis Lacalle Pou, que deve apresentar aos pares um balanço das negociações com a China para um tratado de comércio entre os dois países.

A decisão de negociar por fora do bloco confronta a resolução número 32 do estatuto do Mercosul, que proíbe que membros do bloco façam acordos econômicos com outros países sem a aprovação dos demais.

Lacalle Pou afirma que há uma brecha no estatuto que permite isso e que não deseja sair do Mercosul. Quem tem mais resistência com relação ao movimento uruguaio é a Argentina. Em uma ocasião anterior, ao tratar do mesmo acordo, Fernández afirmou que, se Lacalle Pou queria fazer as coisas sozinho, que era melhor que "abandonasse o barco", sugerindo que saísse do bloco.

O presidente uruguaio confirmou na semana passada, em uma coletiva, que havia terminado a chamada fase de estudos, que antecede a negociação do tratado de livre comércio, e que agora faltava começar a negociação dos termos.

"Estamos convencidos de que o direito internacional e os tratados assinados por nosso país nos permitem estabelecer todo tipo de acordos com distintas nações", disse Lacalle

Pou na ocasião. Acrescentou, ainda, que o Uruguai tem uma "vocação de abertura que não se contradiz com sua participação no bloco".

Já o chanceler argentino, Santiago Cafiero, afirmou que "qualquer tipo de tratado dessas características, segundo a construção histórica do Mercosul, que é o Tratado de Assunção, tem de ter o consenso de todas as partes".

"Com a união aduaneira temos todo o mercado bem articulado entre produtores de alimentos e manufaturas. O que precisamos é que deve haver consenso para qualquer acordo que ocorra fora do Mercosul", disse.

Lacalle Pou sofre, ainda, com resistência interna em seu país com relação ao acordo com a China. A oposição e câmaras de comércio locais têm se posicionado contra.

O ex-ministro da economia e ex-presidente da coalizão de centro-esquerda Frente Ampla, Danilo Astori, afirmou que "com a situação que vivemos, não seria possível fazer um acordo de comércio com a China sem romper com o Mercosul, o que se mostra uma atitude muito voluntarista por parte do presidente, mas que pode ter um custo alto", disse. "Uma ruptura com o Mercosul é o pior que o Uruguai pode fazer agora em termos de inserção comercial."

Para o Paraguai, o tema é incômodo porque o país não tem relações com a China continental e é o único país da região que reconhece Taiwan como Estado. "Nós sempre vamos defender os interesses do Paraguai, e Taiwan é um país aliado", afirmou o chanceler paraguaio, Jose Arriola.

Em uma entrevista a jornalistas no início da semana, Arriola afirmou que a reunião terá dois comunicados, um dos membros do bloco mais a Bolívia, e outro com os países associados.

O boliviano Luis Arce confirmou presença, mas o chileno Gabriel Boric será representado por sua chanceler, Antonia Urrejola. A Colômbia estará presente por meio de sua vice-presidente e chanceler, Marta Lucía Ramírez.

Abdo Benítez havia proposto aos países-membros que recebessem uma chamada, ao vivo, do presidente ucraniano, Volodímir Zelenski. A participação de Zelenski, porém, ainda não foi confirmada porque, segundo a chancelaria paraguaia, "ainda não há consenso entre os países-membros sobre a conveniência do encontro", afirma a chancelaria paraguaia.

Nesta quarta, o Mercosul anunciou, ao menos, um avanço: a conclusão das negociações do acordo de livre comércio entre o bloco e Singapura.

O acordo envolve temas tarifários e regulatórios, como serviços, investimentos, compras governamentais, propriedade intelectual e defesa comercial, além de prever compromissos em serviços financeiros e movimento de pessoas.

De acordo com a nota do governo brasileiro, a assinatura pode gerar incremento de R$ 28,1 bilhões no PIB (Produto Interno Bruto) do país entre 2022 e 2041. Para o mesmo período, a pasta estima aumento de R$ 11,1 bilhões em investimentos, R$ 21,2 bilhões em exportações brasileiras para a nação asiática e R$ 27,9 bilhões nas importações.