Biden promete revide por suposta interferência russa e chama Putin de assassino
Em entrevista ao canal ABC, o presidente dos EUA, Joe Biden, afirmou que Vladimir Putin sofrerá consequências devido aos supostos esforços da Rússia para interferir nas eleições de 2020 e, ao ser questionado se o líder russo é um assassino, assentiu e
Rafael Balago (Folhapress)
Em entrevista ao canal ABC, o presidente dos EUA, Joe Biden, afirmou que Vladimir Putin sofrerá consequências devido aos supostos esforços da Rússia para interferir nas eleições de 2020 e, ao ser questionado se o líder russo é um assassino, assentiu e disse que sim. "Ele pagará um preço", disse Biden, em referência às ações que teriam sido realizadas por Moscou para influenciar o pleito em favor de Donald Trump, sem detalhar que consequências seriam essas -o democrata respondeu apenas "você saberá em breve". A entrevista foi exibida nesta quarta-feira (17).
As declarações do líder americano, dadas após agências de inteligência dos EUA divulgarem, na terça (16), relatório segundo o qual a Rússia teria tentado ajudar Trump a se reeleger, logo provocaram reações. Pouco depois da divulgação da entrevista, Viatcheslav Volodin, presidente da Câmara baixa do Parlamento russo, disse que "um ataque contra Putin é um ataque contra o nosso país".
"Biden insultou os cidadãos do nosso país com essa declaração", afirmou o parlamentar, número 2 do Kremlin entre 2011 e 2016, em um canal no Telegram. Para além das palavras, a chancelaria russa convocou seu embaixador em Washington, Anatoli Antonov, para consultas, embora a pasta tenha afirmado que o objetivo é evitar a degradação irreversível das relações com os americanos.
Moscou já havia sido acusada de influenciar a eleição americana de 2016, outra vez para favorecer Trump, cujo mandato foi marcado por investigações sobre a questão. Uma apuração de três anos, feita pelo Departamento de Justiça dos EUA, no entanto, isentou a campanha do republicano de ter se aliado à Rússia para vencer o pleito, embora indícios apontassem para envolvimento russo em vazamentos de dados e de conversas sigilosas que ajudaram a minar a campanha da rival de Trump, Hillary Clinton.
Em episódios mais recentes, a inteligência americana passou a investigar a Rússia devido a um ataque cibernético de grande escala a sistemas do governo dos EUA no final de 2020 e ao pagamento de recompensas a membros do grupo extremista Taleban para matar soldados americanos no Afeganistão. Ainda que tenha atacado o par russo, o atual presidente dos EUA disse haver temas de interesse mútuo nos quais os países podem trabalhar juntos, como ocorreu na renovação do acordo nuclear Novo Start.
"Eu o conheço relativamente bem", disse Biden, "e a parte mais importante ao lidar com líderes estrangeiros é saber quem é o outro cara". De fato, a relação entre os chefes de Estado é antiga. Como vice de Barack Obama, Biden atuou nas tentativas de pacificar a Ucrânia durante crise com a Rússia.
Em 2013, o então presidente Viktor Yanukovich desistiu de um acordo para entrar na União Europeia (UE), o que gerou grandes protestos e, posteriormente, a deposição do próprio líder ucraniano. Ainda assim, a Rússia, contrária à aproximação do vizinho com o bloco europeu, anexou a Crimeia, parte da Ucrânia, e fomentou movimentos separatistas em outras regiões, gerando uma guerra civil. Biden ofereceu ajuda, sem sucesso, para que os ucranianos suportassem a pressão russa.
Em outro episódio, segundo relato de Biden no livro "Promessa de Pai", ele disse a Putin, em reunião no início de 2015, na Finlândia, acreditar que o líder russo não tem alma, afirmação que voltou a fazer na entrevista exibida nesta quarta-feira. À época da primeira menção, o democrata se reuniu com Putin, então premiê, para tratar de um reposicionamento do sistema de defesa de mísseis na Europa, sobre o qual Putin se mostrou descontente. "Sr. primeiro-ministro, estou olhando nos seus olhos e não creio que tenha uma alma", teria dito Biden. Putin respondeu: "Nós entendemos um ao outro".
Biden recordou parte deste diálogo na entrevista à ABC e foi questionado se vê o presidente russo como um assassino, ao que o líder americano concordou. Ele não especificou se estava se referindo ao envenenamento do opositor russo Alexei Navalni, em agosto, um ato que, segundo os EUA, teria sido cometido pelo Kremlin e que gerou sanções de Washington a sete funcionários do governo russo.
Nos últimos meses, Putin vem apertando o cerco contra a oposição em seu país. Navalni, por exemplo, foi condenado e enviado à uma colônia penal depois de passar cinco meses em tratamento na Alemanha devido ao envenenamento. Em um espectro mais amplo, no último fim de semana a polícia russa prendeu mais de 150 pessoas que participavam de um encontro de partidos de oposição.
Como Biden, Trump também foi perguntado, no início do mandato, sobre o que achava de Putin. Em entrevista à Fox News em fevereiro de 2017, o republicano disse que o respeitava. "Se eu vou me dar bem com ele? Não tenho ideia. É bem possível que não". Em seguida, o entrevistador Bill O'Reilly disse: "Ele [Putin] é um assassino". Trump retrucou: "Há um monte de assassinos. Nós temos um monte de assassinos. Você acha que nosso país é tão inocente?".
Na entrevista desta quarta à ABC, Biden também abordou assuntos domésticos. Frente a uma alta no número de imigrantes que tentam entrar nos EUA sem autorização, o presidente disse aos estrangeiros que "não venham". O democrata afirmou ainda que ampliará a estrutura para receber crianças imigrantes que viajam desacompanhadas e que a prioridade será enviá-las de volta às suas famílias.
O democrata também apontou que a recusa de Trump em ajudar na transição de governo atrapalhou o início de seu mandato, e, por isso, a decisão sobre retirar as tropas americanas do Afeganistão, prevista para ocorrer em 1º de maio, ainda está em análise.
Por fim, defendeu que o governador de Nova York, o democrata Andrew Cuomo, renuncie ao cargo se ficar provado que ele assediou mulheres. Nas últimas semanas, ao menos sete auxiliares de seu governo revelaram queixas sobre o comportamento de Cuomo.
ATRITOS ENTRE EUA E RÚSSIA NOS ÚLTIMOS ANOS
Interferência nas eleições de 2016
Agências de inteligência dos EUA concluíram que a Rússia interferiu na campanha presidencial de 2016, com o objetivo de eleger o republicano Donald Trump. Moscou teria envolvimento no ataque contra o email da então candidata democrata, Hillary Clinton, e no vazamento das informações confidenciais. O Kremlin nega todas as acusações.
Já no pleito de 2020, as agências de inteligência americanas produziram um relatório no qual afirmam que o presidente russo, Vladimir Putin, autorizou esforços para interferir na campanha presidencial americana em benefício de Trump, operação que contou com ações de inteligência para influenciar pessoas próximas ao agora ex-presidente e para prejudicar a imagem de Joe Biden.
Ataques hackers
12 agentes de inteligência russos foram acusados de promoverem um ataque hacker aos computadores do partido Democrata e da campanha de Hillary em 2016. Segundo denúncia do Departamento de Justiça americano, que isentou a campanha isentou a campanha do republicano de ter se aliado à Rússia, eles trabalhavam para o GRU, o departamento central de inteligência do governo de Putin.
Os agentes chegaram, sem sucesso, a tentar invadir os sistemas dos órgãos eleitorais que comandam a votação nos estados americanos. Em um deles, os russos conseguiram roubar nomes, endereços, data de nascimento e número de documento de 500 mil eleitores.
No fim de 2020, o governo Trump reconheceu que hackers agindo sob comando de um governo estrangeiro -provavelmente uma agência de inteligência russa, de acordo com especialistas federais e privados- invadiram uma série de redes governamentais, incluindo as dos departamentos de Tesouro e do Comércio, e tiveram livre acesso aos seus sistemas de email.
Sanções no caso Alexei Navalni
Governo Biden anunciou, no início deste mês, sanções contra autoridades acusadas de tramar a prisão de Alexei Navalni, opositor russo detido assim que voltou à Rússia após tratar-se por 150 dias na Alemanha. As medidas incluem o banimento de viagem aos EUA e o congelamento de bens no exterior.
O grupo inclui o diretor Serviço Federal de Segurança, apontado pela Casa Branca como responsável pelo envenenamento de Navalni, dois ministros-adjuntos da Defesa, dois responsáveis por política doméstica do Kremlin, o procurador-geral e o administrador do Serviço Penitenciário Federal, Alexander Kalachnikov.