Por: Leandra Lima - PETR

Europa dividida por Trump

Defesa de Trump terá mais uma semana para argumentar | Foto: Reuters/Folhapress

Com visões distantes sobre quase tudo o que toca a União Europeia, o premiê da Hungria, Viktor Orbán, e o presidente da França, Emmanuel Macron, tentaram sair na frente na busca por estabelecer canais de diálogo entre a Europa e o novo governo de Donald Trump, cuja posse está marcada para o próximo dia 20.

O europeísta Macron recebeu o americano, em dezembro, na reabertura da catedral de Notre-Dame, a primeira viagem internacional de Trump depois de eleito. Apenas dois dias depois, o nacionalista Orbán visitou o futuro presidente na Flórida. Tirando a cortesia evidente, um movimento tem pouco a ver com o outro.

Ao se apresentarem como mediadores, Orbán e Macron simbolizam como a volta de Trump à Casa Branca suscita diferentes graus de preocupação no continente. O húngaro faz parte de um grupo político que tenta corroer por dentro as instituições da UE, além de ser simpático ao presidente da Rússia, Vladimir Putin. O francês é enfático no apoio à Ucrânia e na defesa de uma Europa mais unida e soberana.

Seja pela experiência do primeiro mandato de Trump, seja pela retórica da campanha eleitoral, os temas delicados da nova fase das relações entre o continente e os EUA giram em torno principalmente da defesa comum, da Guerra da Ucrânia e de relações comerciais.

É esperado que Trump suba o tom para que os europeus contribuam mais com despesas militares, sob a ameaça de esvaziar a Otan, a aliança militar ocidental liderada pelos EUA. Também deverá pedir mais empenho em um processo de negociações que leve a um acordo entre Moscou e Kiev. Na área econômica, forçará a redução do déficit comercial, tentando cooptar a UE em uma ação anti-China.

"Trump vai falar uma linguagem antieuropeia, eurofóbica, porque é isso que agrada o seu eleitorado. Podemos esperar gestos marcantes, como quando não estendeu a mão a Angela Merkel [em 2017]", diz Mario Del Pero, professor de história das relações transatlânticas na Universidade Sciences Po, em Paris.

Do outro lado, encontrará apoiadores e simpatizantes, como Orbán e o eslovaco Robert Fico, com poucas chances de sucesso na mediação com a UE. E a primeira-ministra Giorgia Meloni, que se apresenta como uma interlocutora mais respeitada para fazer a ponte entre Washington e Bruxelas. A italiana está à frente de um país fundador, a terceira economia do bloco, e teceu boas relações tanto com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, quanto com Trump e seu entorno, incluindo o empresário Elon Musk.

"A vitória de Trump legitima e reforça, no curto prazo, atores políticos da direita radical, que são hostis ao projeto europeu", diz Del Pero. "Haverá uma corrida para se credenciar com Trump entre os líderes da direita europeia."

Mais crítico ao estilo e às políticas de Trump, um segundo grupo de líderes têm peso para dialogar com o americano, a depender da astúcia diplomática. Além de Macron, o britânico Keir Starmer e o polonês Donald Tusk podem fazer esse papel, especialmente pela importância que seus países têm na área da defesa. Contraste mais evidente, o espanhol Pedro Sánchez desponta como voz natural anti-Trump no poder.

Para responder às dificuldades que o segundo mandato de Trump deverá trazer, a Europa deveria se apresentar coesa e com seus dois países mais relevantes, Alemanha e França, em boas condições de conduzir o bloco. Ambos, no entanto, enfrentam crises domésticas, com os alemães sem nem saber quem será o primeiro-ministro a partir de 23 de fevereiro, quando irão às urnas.

"Não sei como se pode ser otimista neste momento. A Europa se encontra diante de um grande desafio e se prepara para enfrentá-lo a partir de uma condição de extrema fraqueza", diz o professor.

Na falta de uma ação coordenada, é possível que alguns países tentem construir uma relação privilegiada com os EUA, baseada em afinidades político-ideológicas. Algo que, segundo o historiador, é arriscado e de resultado incerto. A integração é tanta que é difícil um país se blindar de uma ação agressiva dos EUA que seja mirada em outro membro. "Os setores econômicos são ligados entre si, existem milhares de pequenas empresas italianas ligadas ao setor automobilístico alemão, por exemplo", afirma Del Pero.

Partidários

Com Donald Trump, a ultradireitista compartilha laços partidários, ideológicos e a amizade com Elon Musk. Defende que o futuro presidente não seja tratado como inimigo e que a UE seja pragmática. Será uma interlocutora, mas a Itália não gasta como deveria em defesa e tem muito a perder em uma eventual guerra comercial.

Por Michele Oliveira - Folhapress