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Abordagem racial contribui com autoestima na infância

Especialistas em educação infantil ressaltam importância da representatividade | Foto: Freepik

Foi na creche, durante o momento de contar histórias, que Anna Júlia, então com 4 anos de idade, fez uma descoberta que a deixou maravilhada: as princesas podiam ter a pele negra igualzinha à dela.

Na ocasião, a professora da turma havia convidado Penélope Cândido de Souza, gestora do Centro de Educação Infantil Euridice Ferreira de Melo, no bairro de Heliópolis, na zona sul de São Paulo, para contar uma história às crianças vestida como realeza.

A "Princesa Penélope" marcou os primeiros anos de formação da aluna, hoje com 6 anos, que até então fora sempre muito tímida. "Ela foi impactada diretamente. No final, as crianças manusearam os acessórios, minha filha escolheu o espelho e, ao se ver, ficou encantada, se reconhecendo como uma princesa negra. Antes, no pensamento dela, só existiam princesas brancas", lembra a mãe, Leandra Maria da Silva, auxiliar de cozinha na creche.

Silva conta ainda que percebeu mudança de postura da filha diante do mundo. "A maneira de se comportar [mudou]. Até hoje ela lembra da história e se coloca como princesa. Como mãe de uma menina negra, fico muito feliz pelo sentimento e pela transformação na vida dela", destaca..

O caso de Anna Júlia é só uma amostra do poder de transformação que a educação antirracista pode trazer para o desenvolvimento infantil nos primeiros anos de uma criança. Segundo Daniela Mendes, coordenadora de políticas educacionais da ONG Todos pela Educação, a primeira infância é uma fase de estruturação do indivíduo e vai impactar em toda sua trajetória de vida.

Afinal, são nos primeiros quatro anos que as conexões cerebrais se formam e toda a base para o desenvolvimento é construída, seja cognitiva, física, motora ou socioemocional, diz Mendes. "É de fato um alicerce. E, se uma construção não tem um alicerce firme, dificilmente vai conseguir se manter de pé."

Os cuidados essenciais nos três primeiros anos vão desde os mais práticos, como alimentar e estimular a fala, até a oferta de carinho e proteção. "As pessoas ainda não têm uma apropriação de como o sentimento de segurança é importante nessa fase da vida", afirma.

Neste contexto, as questões raciais vão impactar a primeira infância em pelo menos duas dimensões: a indireta, ligada aos efeitos do que ela chama de racismo estrutural, e a direta, dada por atos de preconceito.

Por: Danielle Castro (Folhapress)