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A restrição dos direitos das mulheres

Por Celeste Leite dos Santos*

O debate nacional em torno de temas de família ganhou holofotes com o Projeto de Lei (PL) 1.904, que também pode ser reconhecido como o "PL dos Estupradores". O texto altera o Código Penal e estabelece de 6 a 20 anos de prisão para mulheres que, vítimas de estupro, fizeram aborto após 22 semanas de gestação — pena, aliás, que é o dobro da estabelecida para o próprio criminoso, para o estuprador — de 6 a 10 anos de reclusão.

As mulheres, hoje, se sobressaem em eficiência, podendo, finalmente, conciliar a vida pessoal e profissional plena com a seara doméstica e familiar. Passam a almejar e a ocupar postos que antes eram impensáveis - incluindo os construídos pelos homens e para os homens. São o que quiserem, onde quiserem, caso queiram.

No combate ao avanço da autonomia da mulher, o público masculino usa as armas que tem e conhece - a força bruta. Os homens valem-se da ideia de que, pelo controle dos nossos corpos, podem, também, ter domínio de nossas mentes e anseios, mantendo-se, assim, o status quo de hierarquia, de "quem manda", de "quem pode" e de "quem dita as regras". Igualdade não é aceitável. Isonomia, parceira, união e respeito passam longe. "Manda quem pode, obedece (e se sujeita) quem tem juízo", já dizia o ditado. E, pelo visto, perante a lei, o bom senso também se faz de rogado.

A punição não deve, jamais, ser descartada em caso comprovado, em questão de exageros e de desvirtuação do objeto. Aborto é assunto sério, afinal, e não menos importante e relevante do que as sequelas deixadas por um estupro - muitos, diga-se de passagem, cometidos dentro do lar da vítima, por pessoa próxima.

Em suma, não podemos permitir que o Brasil seja palco da revitimização de milhares de meninas e de mulheres, vilipendiadas na alma, cujo único pecado, pelo visto, é a própria existência.

*Presidente do Instituto Brasileiro de Atenção Integral à Vítima; promotora de Justiça em Último Grau do Colégio Recursal do Ministério Público de São Paulo; doutora em Direito Civil; mestre em Direito Penal.