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O exemplo de grandes grupos familiares brasileiros

Por Juliana Buchaim*

A governança corporativa de empresas familiares no Brasil não se limita a episódios de desalinhamentos e controvérsias. Esses casos hoje são a exceção, não a regra.

Em contraste com o fim dos anos 90, período em que a governança corporativa global enfrentava desafios significativos e as empresas familiares brasileiras eram vistas com ceticismo, o modelo de gestão familiar passou por uma evolução notável. Grupos que anteriormente recebiam severas críticas, hoje se tornaram exemplos de excelência corporativa. A profissionalização das empresas familiares e ressignificação do papel do Conselho de Administração foram cruciais para essa mudança.

A função primordial do Conselho sempre foi assegurar a continuidade da empresa. No entanto, essa responsabilidade, que historicamente se limitava a um papel de supervisão e fiscalização, frequentemente se encontrava nas mãos de membros com limitada participação e pouco engajados na criação de um legado duradouro. As estratégias de longo prazo, essenciais para o futuro da companhia, não eram priorizadas nas discussões - em muitos casos, ainda hoje, não são. Esse desafio se devia, em grande parte, a um desbalanço entre a governança familiar e corporativa, à ausência de mecanismos profissionais e meritocráticos dentro da companhia e à falta de clareza do papel do Conselho como um verdadeiro guardião do futuro da organização.

Construir essa relação em um Conselho Administrativo, porém, não é trivial: o sistema está configurado para priorizar relações de curto prazo, com mandatos breves e uma estrutura de risco e retorno não equitativa e desbalanceada. Isso resulta, quase intencionalmente, em um distanciamento prejudicial entre o negócio e os órgãos de governança, dificultando o envolvimento mais profundo entre conselheiro e empresa. Adicione-se a isso a difícil gestão do tempo das interações em ambientes excessivamente formais, que oferecem pouco espaço para trocas abertas e genuínas.

A redefinição dos papéis, a estruturação consciente dos mandatos, e, principalmente, a revitalização da dinâmica dos Conselhos de Administração, incorporando o espírito de dono por meio da governança corporativa, revelam-se como as chaves para desencadear uma evolução que cultive valor de longo prazo para todos os stakeholders. Nesse contexto, muitos grupos familiares no Brasil emergem como exemplos notáveis, demonstrando como uma governança familiar ativa e comprometida pode ser um motor de sucesso e inovação empresarial.

*Foi gestora de fundos no Brasil por 20 anos, é co-chair da WCD Brasil - Women Corporate Directors.