Aposentadoria Compulsória: Quando a Punição Vira Prêmio e o Erro Não Custa Nada

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Por Everardo Gueiros*

A aposentadoria compulsória para membros do Judiciário e do Ministério Público, prevista como sanção disciplinar, tem suscitado um debate acirrado entre juristas e a sociedade. É inegável que o dispositivo, presente no art. 40, §1º, inciso II da Constituição Federal, gera um desconforto quando observamos o impacto dessa medida em casos onde a conduta do magistrado ou promotor foi marcada por irregularidades graves.

A crítica mais frequente é a de que a aposentadoria compulsória, ao invés de uma punição, parece ser uma espécie de "prêmio" para aqueles que se desviam de suas funções. Não é raro encontrarmos casos em que o profissional, mesmo após praticar atos que atentam contra a legalidade e a moralidade, é simplesmente afastado, porém recebendo proventos proporcionais ao tempo de serviço. Essa situação, longe de ser meramente jurídica, toca diretamente em questões de moralidade pública, gerando um contraste com a responsabilidade que incide sobre os demais cidadãos, que são obrigados a ressarcir danos causados em suas atividades profissionais.

Sob a ótica legal, a Constituição e as leis complementares, como a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LC nº 35/1979) e a Lei Orgânica do Ministério Público (LC nº 75/1993), preveem a aposentadoria compulsória como uma das punições possíveis para faltas graves. Contudo, a leitura crítica dessa disposição nos leva a refletir se essa é, de fato, uma sanção proporcional para situações de dolo ou má-fé.

Afinal, o conceito de responsabilidade é universal, e a impunidade percebida em certos segmentos do funcionalismo público, especialmente em cargos que exigem um grau elevado de ética e responsabilidade, mina a confiança nas instituições. Quando um magistrado ou membro do Ministério Público comete infrações dolosas, a sociedade espera mais do que um mero afastamento com proventos. O dano causado por decisões injustas ou por condutas abusivas tem um peso profundo, atingindo tanto as partes envolvidas como a própria credibilidade do sistema de justiça.

A proposta de se agravar as consequências para casos de má-fé é, portanto, bastante coerente. Nos moldes atuais, quem arca com as indenizações decorrentes de erros judiciais ou abusos de poder é o Estado, ou seja, a sociedade como um todo. Pouco se fala sobre a responsabilidade direta do agente que comete tais erros. A ausência de responsabilização individual cria um desequilíbrio, favorecendo uma sensação de impunidade para aqueles que deveriam ser os guardiões da justiça.

Não seria desarrazoado, portanto, que o magistrado ou membro do Ministério Público respondesse diretamente com seu patrimônio por danos causados quando comprovada a má-fé ou a intenção de prejudicar outrem. Isso não apenas garantiria uma maior justiça, como também serviria de forte elemento dissuasório para condutas indevidas. Se o erro judicial ou o abuso de poder tiver consequências patrimoniais para o agente público, é certo que haveria um zelo maior no cumprimento de suas funções.

Concluindo, a aposentadoria compulsória, da forma como está estruturada no ordenamento jurídico brasileiro, merece uma revisão urgente. Não podemos aceitar que ela se perpetue como uma "punição" sem real efeito, incapaz de promover a responsabilização e a reparação de danos. A responsabilização pessoal, com a perda do cargo e o ressarcimento de perdas e danos com o patrimônio pessoal do agente público, deve ser objeto de discussão e eventual implementação legislativa. Somente assim poderemos avançar em um sistema de justiça mais equilibrado e que, de fato, responsabilize aqueles que falham em seu dever maior: proteger os direitos e garantias dos cidadãos.

*Advogado especialista em Direito Eleitoral, Processual Civil e Empresarial