Por:

As enchentes do Sul e os engenheiros

Chuvas causaram uma catástrofe no Rio Grande do Sul | Foto: Carlos Macedo/Folhapress

Por Aldo Dórea Mattos

As assombrosas cheias que assolam o Rio Grande do Sul despertam nas pessoas sentimentos variados, que vão de comiseração a indignação, de vontade de ajudar a revolta. Se pararmos para pensar, todos esses sentimentos guardam alguma relação com a Engenharia, seja indagando sobre como reconstruir a infraestrutura afetada, seja culpando os engenheiros por projetos supostamente inadequados ou defasados.

Em casos de desastres, as estratégias de recuperação englobam três fases: emergência, estabilização e retomada. Não deve ser motivo de surpresa a constatação de que a figura do engenheiro é imprescindível em todas elas. Inicialmente, na fase de emergência as ações envolvem a assistência imediata aos impactados (evacuação, montagem de abrigos, controle do pânico, desobstrução de algumas vias de acesso cruciais para a logística de ajuda), a avaliação da extensão do impacto e a contenção do risco.

Já na fase de estabilização, o que se busca é restabelecer a normalidade e a ordem na medida do possível e preparar o terreno para a recuperação e a reconstrução a longo prazo. As principais medidas de estabilização envolvem a restauração de serviços essenciais como eletricidade, água potável e saneamento, o reparo da infraestrutura crítica, concentrando-se na recuperação de estradas, pontes e transportes públicos essenciais para a mobilidade urbana, a garantia da saúde pública, incluindo distribuição de kits de higiene e vacinação em massa para prevenir doenças pós-inundação, e a avaliação de danos e planejamento da reconstrução.

Na fase de retomada, autoridades e especialistas avaliam os danos e planejam a reconstrução de longo prazo, identificando as áreas que necessitam de reconstrução completa ou apenas reparos, e considerando melhorias para conferir maior resiliência ao que for construído. Este é o conceito de build back better (reconstruir melhor). Nessas horas não é rara a constatação de que muitas obras necessárias sequer foram executadas e que muitas outras o foram sem seguir o devido estudo de viabilidade.

Raciocinando pela ótica dos entes públicos a quem cabe tomar providências em todas essas fases, é de bom tom que recorram à metodologia internacionalmente aceita intitulada Avaliação das Necessidades Pós-Desastre (PDNA, em inglês) para determinar os danos físicos, as perdas econômicas e os custos de satisfação das necessidades de recuperação após o desastre, através de um processo liderado pelo governo.

Em situações de desastres vêm à baila outras indagações: a manutenção de equipamentos como bombas, válvulas e comportas foi devidamente executada ao longo dos anos? Foram ampliadas as estruturas hídricas das cidades de modo a acompanhar o aumento populacional? Houve alguma medida para estancar a crescente impermeabilização do solo das cidades e o desmatamento das matas ciliares? Para responder, sugerimos que essas perguntas não sejam endereçadas somente aos engenheiros convém consultar os governantes também.

*Presidente da Academia de Engenharia da Bahia