Esse negócio de voar não me dá medo, embora eu sempre ache que vai acontecer alguma coisa com o avião e lembro de uma aeromoça (elas, as profissionais empregadas, graças ao politicamente correto, já não são tão moças assim) e também não são mais aeromoças e sim comissárias de bordo - que tinha pavor de avião, imagine, e foi convidada a atuar na área e não desperdiçou a oportunidade. Quando entrava a trabalhar esquecia o medo que só voltava quando saia de casa para pegar os caixotes voadores da Cruzeiro.
Sempre que vou viajar de avião, uma semana antes, pode acreditar, começam a surgir notícias de todo mundo mostrando que alguma coisa aconteceu em algum ponto do planeta: uma queda ali, uma turbulência aqui. Neste momento em que relato estou num avião pedindo a São Mercúrio, São Ícaro e São Francisco, protetores dos bichos alados e dos que viajam em asas metálicas para que seja verdade que, segundo as estatísticas, avião é o meio de viagem mais seguro. Daí lembrei que segundo as estatísticas o Botafogo do Rio (para onde estou indo) seria o campeão de futebol do Brasil no ano de 2023 e contra as estatísticas nem entre os quatro primeiros colocados ficou.
Dona Tete Maria, professora que foi da Uneb foi quem me contou que certa feita pegando um avião sentou junto de um garoto que ia se apresentar ao Cotinguiba Esporte Clube, lá de Sergipe, sendo a primeira vez que via um avião de perto e ele nervoso puxou conversa, mas o interessante veio de pois quando o avião começou a taxiar e ele falou para ela que não sabia que o avião pegava primeiro viagem pelo asfalto.
- Ele vai pelo asfalto e pula quando? - perguntou.
Ela sem querer dar risada para não encabular o jogador explicou que o avião ia acelerar e então subir em direção às nuvens. Ele ficou quieto até o avião ganhar velocidade e disse:
- Dá tempo parar?
- Por que? - Ela procurou saber.
- Tá correndo muito.
Segundo ela o resto da viagem foi tranquila até quando chegou no aeroporto de Sergipe viu que o garoto não queria mais sair do avião. Ela perguntou se gostou da viagem e ele disse que muito. Difícil foi a equipe de bordo o convencer a sair da poltrona. Morto de vergonha precisou de ajuda para trocar a calça jeans.
Eu tenho um problema com a viagem que é não saber onde sentar. Gosto de ir na janela, mas penso - principalmente se a viagem for longa - que se der um piriri vou ter de pular por cima dos passageiros ao meu lado. Se eu for no corredor, com certeza alguém vai ter uma vontade qualquer e vai me acordar tanto para ir como para voltar ao lavabo. Agora, imagine uma situação: o senhor na janela, o comissário de bordo já tinha perdido a paciência com ele que que não aceitou ir no corredor - embora fosse o determinado por seu bilhete - e foi para a janela, que era o meu lugar correto. Foram nove horas de voo para Luanda com ele de meia em meia hora passando por cima de mim, me apertando, me acordando para ir ao lavabo, andar no corredor, se alongar. Decidi fazer parte da viagem em pé. Pior que ir de buzu BRT.
*Escritor e jornalista. Autor do romance "A Peleja dos Zuavos Baianos Contra Dom Pedro os Gaúchos e o Satanás" e de "Histórias da Bahia - Jeito Baiano".