Papelão Chinês IV | Ex-presidente advoga mudança da lei para permitir a grupo chinês ter seu quinhão do território brasileiro
O avanço chinês no mercado brasileiro é uma preocupação dos setores ligados à soberania nacional
Por Cláudio Magnavita*
No Brasil, o conceito de soberania nacional tem sido abandonado. Na aviação, nenhuma das empresas aéreas pertencem à capital brasileiro. A destruição, pela Lava Jato, das grandes empreiteiras, verdadeiras multinacionais verde-amarelas com atuação planetária, entregou de bandeja para as gigantes chinesas um mercado até então dominado por empresas nacionais.
O avanço chinês no mercado brasileiro é uma preocupação dos setores ligados à soberania nacional.
No Governo de Michel Temer, o Projeto de Lei 4059 acabaria com as restrições à compra de terras por Pessoas Jurídicas brasileiras com capital estrangeiro. As Pessoas Físicas estrangeiras ou Pessoas Jurídicas com capital estrangeiro podem comprar no máximo 15 módulos rurais no Brasil. O tamanho de um módulo rural varia em cada município, podendo ir de 5 a 100 hectares. Estrangeiros tampouco podem deter mais de um quarto das terras de cada município, o que, em tese, impossibilita que ocupem mais que 25% do território nacional.
Além do PL 4059, o governo Temer chegou a preparar uma medida provisória e um projeto de lei sobre o assunto, mas o tema não andou. Só que agora, segundo a Veja Negócios, na coluna Radar Econômico, Temer teria dito a pessoas próximas que estaria trabalhando em um livro para defender sua tese a favor da medida. Os defensores da tese de permissão de compra de terras por investidores estrangeiros ganham um apoio de peso: o ex-presidente Michel Temer, que tem articulando, nos bastidores, para tirar da gaveta um projeto de lei capitaneado por ele quando estava no governo.
Na prática, o que temos é um ex-presidente da República fazendo um movimento político para liberar para estrangeiros um quinhão do território nacional.
Uma posição estranha, principalmente depois que o colunista Lauro Jardim, de O Globo, publicou, em 19 de fevereiro de 2023, a seguinte notícia: "Michel Temer renovou o seu contrato de consultoria com a Paper Excellence, empresa asiática de celulose que há anos protagoniza com a J&F a maior guerra societária do Brasil pelo controle da Eldorado. No fim de janeiro, Temer desembarcou em Los Angeles, onde vive o indonésio Jackson Wijaya, presidente mundial da PE, para os acertos finais". A notícia nunca foi desmentida e está no site do jornal à disposição de qualquer leitor.
Um dos entraves do negócio de Jackson Wijaya no Brasil é exatamente a proibição do Incra para que o seu grupo possa ser proprietário das extensões de terra do projeto Eldorado. Precisariam de uma autorização esperada do Congresso.
Este movimento de retomada para a derrubada da proibição para estrangeiros de possuir grande extensão de terras, a notícia da renovação do contrato, ou seja, Temer já atuava para esta família de origem chinesa estabelecida na Indonésia, permite a formação de uma nebulosidade para explicar essas coincidências.O Correio da Manhã já apontou os problemas que Jackson Widjaya enfrenta no Canadá, com os verdadeiros acionistas escondidos no outro lado do mundo. Wijaya tem evitado entrar no país da América do Norte, para fugir de uma convocação do parlamento canadense e revelar quem são os verdadeiros controladores da Paper Excellence, um mistério até hoje sem respostas por lá.
Jackson Wijaya foi diretor da Ever Dragon, grupo de investimentos que é dono de 100% da Sinar Mas na China, conectando a Paper Excellence, a Sinar Mas e o governo da China, que tem envolvimento em todas as grandes empresas que operam em solo chinês. Esta mesma Sinar Mas China é ainda ligada financeiramente à Paper, para a qual fez um empréstimo suspeito em 2010, realizado pelo International Bank Ningbo, o qual a Sinar chinesa é dona, demonstrava um claro favorecimento à Paper Excellence por ter juros muito abaixo do mercado.
A Sinar Mas nega ter relações com a Paper Excellence, apesar de o dono declarado da empresa ser Jackson Wijaya, neto de seu fundador. Ele já foi alvo de uma série de matérias do jornal Le Monde, denunciando que a Paper é subsidiária da APP. Diversas fontes dentro do grupo empresarial declaram publicamente que as empresas funcionam como uma só, e que a família Wijaya opera tudo em conjunto, sendo os mais jovens envolvidos nas empresas subsidiárias, como a Paper Excellence, e os mais velhos na Sinar, mas sempre em contato constante, inclusive em um grupo de WhatsApp. Em um artigo para o jornal Nikkei, Linda Wijaya, diretora da APP, chegou a declarar que: "A Sinar Mas opera mais como um conselho de família, mesmo que um membro da família seja apontado para administrar cada companhia".
A Paper Excellence foi fundada em 2006 por Jackson Wijaya. O objetivo inicial era estabelecer uma presença forte no mercado global de celulose e papel, utilizando as extensas operações da família, através do grupo Sinar Mas e da Asia Pulp and Paper (APP).
A empresa cresceu rapidamente, em parte devido a uma série de aquisições estratégicas. Um exemplo notável foi em 2021, com a Domtar, uma empresa norte-americana, que, significativamente, expandiu suas operações por lá. Esta aquisição seguiu a estratégia da empresa de aumentar sua presença na América do Norte e diversificar seus produtos para incluir uma variedade mais ampla de papéis especializados e de embalagem.
Além disso, em 2019, a Paper Excellence adquiriu a Catalyst Paper Corporation, aumentando ainda mais sua capacidade de produção e expandindo sua gama de produtos.
No Brasil, a Paper Excellence entrou em uma disputa pela Eldorado Brasil Celulose. Desde 2018, a Paper Excellence possui 49,41% das ações da Eldorado e tem estado em processos legais para adquirir o controle total da empresa. Esta tentativa é parte do esforço contínuo da Paper Excellence para fortalecer sua posição no mercado de celulose, crucial para suas operações globais.
Seu foco tem sido principalmente em mercados fora da Ásia, apesar de suas conexões corporativas e familiares. A família Widjaja é de origem chinesa. Eka Tjipta Widjaja, o patriarca e fundador do grupo Sinar Mas, nasceu na China com o nome original de Oei Ek Tjhong antes de emigrar para a Indonésia. Na Indonésia, ele angariou sucesso significativo nos negócios, o que levou à formação do conglomerado Sinar Mas, envolvendo várias indústrias, incluindo a de papel e celulose, através da Asia Pulp and Paper (APP). A família mantém uma forte presença nos negócios tanto na Indonésia quanto internacionalmente, refletindo suas raízes chinesas combinadas com sua base empresarial indonésia.
É neste cenário nebuloso que entra um ex-presidente da República do Brasil, num movimento para permitir o fim das restrições de estrangeiros possuírem terras no país e um forte lobby no judiciário e a contratação de grandes escritórios de advocacia.
A soberania nacional está cada vez mais amarela de vergonha e o nosso verde fica cada vez mais parecido com os tons esverdeados da moeda norte-americana.
*Diretor de Redação do Correio da Manhã