1-DISTÂNCIA ENTRE NEGROS E BRANCOS aumenta em 33% das capitais brasileiras. Índice Folha de Equilíbrio Racial (Ifer) revela piora do indicador em 9 das 27 cidades; Norte e Nordeste avançam, mas São Paulo e Rio de Janeiro têm desafios. Por Douglas Gavras e Tiago Cardoso. "A gente não tem a opção de desistir", resume a empresária baiana Najara Souza, 41, dona da marca de moda NBlack, que ela abriu após ser discriminada em uma entrevista de emprego. "Nem todo mundo vai conseguir chegar, mas a gente pode ajudar instruindo, orientando e, se tiver a oportunidade, levando outras pessoas junto." Apesar de avanços, em dez anos, um terço das capitais brasileiras ficou mais desigual em oportunidades para os negros (pretos e pardos) em relação aos brancos, de acordo com o mais recente Ifer. Das 26 capitais mais o Distrito Federal, 17 melhoraram no indicador de equilíbrio racial, de 2012 a 2022. Rio Branco (AC) ficou praticamente estagnada, enquanto 9 delas viram o dado piorar. Os números vêm de um trabalho dos pesquisadores do Núcleo de Estudos Raciais do Insper Alysson Portella, Daniel Duque, Fillipi Nascimento e Michael França (também colunista da Folha). Macapá e Salvador representam as duas pontas da desigualdade: enquanto a capital do Amapá é o caso de maior progresso, a cidade baiana foi a que teve maior retrocesso na equidade. Já São Paulo tinha o pior indicador em 2012. A cidade até avançou nos dez anos seguintes, mas só até o segundo pior lugar em termos de equilíbrio racial no país. O Rio de Janeiro, que em 2012 era a segunda pior capital, em 2022 aparece como a terceira pior. No dado nacional, o Ifer melhorou de -0,35, em 2012, para -0,31, em 2022, indicando um leve progresso na equidade racial. O índice principal é composto de indicadores de educação, renda e longevidade. Em capitais das regiões Norte e Nordeste, o avanço em educação e renda impulsionou positivamente o resultado principal. Em Macapá, por exemplo, houve melhora de 0,15 ponto no aspecto educacional e de 0,21 ponto no de renda. Um movimento semelhante ocorreu em Palmas (TO), Boa Vista (RR) e Aracaju (SE). "Em lugares mais desenvolvidos, a gente tende a ter um desequilíbrio maior. A cidade cresce e os moradores negros, que pagam um pedágio durante a vida, tendem a ficar para trás. O estudo em nível estadual que fizemos no passado já mostrava que o maior desequilíbrio era no Sudeste e no Sul", pondera França. "Mesmo em cidades ricas, como São Paulo e Rio de Janeiro, falta um olhar não só para a questão racial, mas para a desigualdade como um todo. O Brasil é um país que sempre foi desigual, e políticas universais feitas sem pensar nas particularidades raciais podem não chegar aos mais vulneráveis", diz Portella. O acesso ao crédito ajuda a reduzir desigualdades, e a população negra historicamente tem mais dificuldades de obter financiamentos lembra Hebe Silva, coordenadora de Administração e Finanças do Baobá (fundo para equidade racial). Na formulação do Ifer são usados microdados da PnadC (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Pelos resultados, a longevidade é única área que apresenta uma tendência de piora nos últimos dez anos em nível nacional: o índice passa de ?0,12, em 2012, para ?0,15, em 2022. Segundo os pesquisadores, o retrocesso sugere que as condições de vida e os determinantes sociais da saúde que afetam a longevidade não melhoraram para a população negra. Diferentes fatores, como acesso a médicos, condições de trabalho e questões socioeconômicas mais amplas podem ter contribuído para essa tendência. Também é possível que o índice tenha sido influenciado por algum efeito secundário da pandemia de Covid-19, que exacerbou desigualdades preexistentes. "O SUS é fundamental para a redução das desigualdades", avalia Hilton Silva, da UFPA (Universidade Federal do Pará) e da UnB (Universidade de Brasília). (...) (Folha de S. Paulo)
(*) José Aparecido Miguel, jornalista, diretor da Mais Comunicação-SP,
trabalhou em todos os grandes jornais brasileiro - e em todas as mídias.
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