Assisti há dias o comovente monólogo em que Othon Bastos destila fragmentos de sua vida com direção de Flavio Marinho. E só agora pude ir ao Teatro Vanucci porque em algumas tentativas anteriores havia a comunicação consagradora: ingressos esgotados.
Aliás, nada mais justo, porque o espetáculo é de fato arrebatador. Tanto pela simplicidade e elegância costurada quadro a quadro pela vigorosa sensibilidade de Flavio Marinho, quanto pelo vigor de Othon em cena aos 91 anos de idade. Além do essencial, o monólogo trazendo a carreira de um dos mais aclamados atores deste país, que começa por evocar a febricitude da cidade de Salvador ao começo dos anos 1960, com a Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia, criada pelo Reitor-Furacão que se chamou Edgar Santos, o possível melhor reitor que o Brasil já teve naquele e todos os tempos subsequentes.
Othon evoca nomes queridos e momentos igualmente incrustrados na minha melhor memória de afetos, como o diretor da escola Martim Gonçalves, ou Glauber Rocha, que convidou Othon para estrelar seu filme mais aclamado: "Deus e o Diabo na Terra do Sol", bem como a trilogia que se seguiu, lançando Glauber para o mundo.
Quero realçar aqui que o mais caro momento que guardo de Othon Bastos em minha memória foi conhecê-lo melhor quando chefiei, nos anos 1970, a Delegação Brasileira ao Festival de Berlim. Othon, o ator do filme brasileiro em competição, estava ali comigo. E combinamos que num domingo, escaparíamos do hotel no qual estava a delegação e entraríamos sorrateiramente em Berlim Oriental, já que o nosso então embaixador não havia fornecido vistos para adentrar à então proibida Berlim comunista.
Saímos cedo, atravessamos uma barreira inicial apenas com o passaporte, e adentramos no possível risco de, no mínimo, prisão.
Berlim Oriental pareceu vazia. Pouquíssimas pessoas andavam pelas ruas. Não sentimos qualquer temor , até porque parecia a mim (ao menos) que estava numa cidade deserta e silente. Aliás, muitíssimo silenciosa.
Tanto quanto lembro, entramos em um raro bar aberto, tomamos cerveja (ótima) e devoramos dois salsichões. Batemos pernas por mais duas ou três horas. Chegamos à Berlim Ocidental quase à noitinha, lépidos e fagueiros. Embora muitos companheiros assustados estivessem já nos procurando pelos seis ou sete cinemas onde os filmes do Festival se exibiam. Quando dissemos que acabávamos de visitar por mais de oito horas a outra Berlim, os queixos de muitos caíram enquanto exclamavam: "ainda bem que não foram presos". E eu retrucava: "nem pensar, estávamos protegidos pelo Corisco, matador de cangaceiros. Ninguém sequer ousou se aproximar..."
Outro assunto: As tratativas do Golpe de fato existiram com fartura
Nessas segunda e terça-feiras, dias 25 e 26 de novembro, o roteiro do Golpe contra a eleição de Lula ficou muito bem definido em amplo relatório elaborado com minuciosa precisão pela Polícia Federal. A PF chegou às seguintes conclusões:
1 - O Golpe só não foi adiante pelas recusas do chefe da Força Exército, General Freire Gomes, e da Aeronáutica, Brigadeiro Baptista Junior, já que a Marinha do almirante Almir Garnier foi a única das três forças a aderir.
2 - Os golpistas se organizaram minuciosamente em seis grupamentos abrigando os indiciados sob liderança pessoal de Bolsonaro, isso de acordo com a PF.
3 - A PF menciona Bolsonaro 643 vezes, insistindo em sua liderança no Golpe.
4 - Bolsonaro teria viajado aos EUA não passando a faixa a Lula pelo temor de ser preso.
5 - Valdemar Costa Neto, presidente do Partido Liberal(PL), sabia que os dados sobre urnas falsificadas seriam uma ficção golpista.
O país e sua consciência crítico - histórica estão a aguardar tanto a apuração mais minuciosa quanto, sobretudo, as punições devidas aos que tiveram a ousadia de esboçar Golpe tão sangrento.