A Beija-Flor é a grande campeã do carnaval do Rio de Janeiro e Rosas de Ouro venceu em São Paulo. As duas com enredos bem distintos. Enquanto a carioca enalteceu seu ex-diretor de carnaval Laíla, morto em 2021, a paulistana falou sobre a influência dos jogos na humanidade. Propostas ousadas e que foram muito bem apresentadas na Sapucaí e no Anhembi. Porém, o grande marco não ficou pelos títulos, e sim por uma entrevista.
As críticas de Paulo Barros sobre os enredos das escolas de samba do Rio de Janeiro, cuja maioria se inspirou nas ideologias afrodescendentes e no sincretismo religioso de umbanda e candomblé, pode ser considerado o desabafo de um carnavalesco que se inspira na ousadia e na inovação de suas alegorias e adereços, com histórias fantasiosas e folclóricas para fazer seus desfiles. Porém, não se pode negar que a maioria das escolas vêm de comunidades e que suas quadras têm o "batuque" como força.
A frase de Milton Cunha, grande entusiasta do carnaval e uma pessoa que conhece bem a história da festa, sobre a questão de Exu e Ogum estarem presentes nos sambas-enredos, e não outros temas, não é para menos. E sim para pensarmos e refletirmos exatamente como é a realidade de grande parte dos diretores das escolas e das próprias escolas.
O carnaval, por sua origem e mitologia, é uma festa pagã, já que depois de sua celebração vem a Quaresma, a preparação da Igreja. Com isso, ela é caracterizada como uma festa para os cristãos exaltarem suas impurezas na carne, antes de fazer o jejum e a limpeza espiritual para celebrar a morte de Cristo.
Com o passar do tempo, a festa ganhou ares comerciais e turísticos, com blocos de rua servindo de atração para os visitantes em diversos estados do país. Além, claro, das escolas de samba, com destaque para Rio de Janeiro e São Paulo. A festa pode, para alguns, ainda ser considerada pagã, mas também pode ser a exaltação das diversas culturais nacionais e da história do povo brasileiro.
Por isso, criticar os enredos afroreligiosos das escolas pode ser até uma demagogia, já que, no Rio, a grande vencedora foi uma escola que exaltou seu grande mestre, um grande religioso das culturas africanas e que fora muito respeitado em seu meio, mesmo com sua religiosidade à mostra.